Programa da ONU Brasil capacita membros da comunidade LGBTI para atuar como lideranças pelos direitos da população trans e promover o diálogo com a sociedade.
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Apesar da popularidade de artistas LGBTI como Pabllo Vittar e o sucesso de um grande número de paradas gay nos grandes centros urbanos, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de países que mais matam travestis e transexuais. Enquanto a expectativa de vida do brasileiro médio é de 75 anos, a de uma pessoa trans não passa dos 35, segundo dados de organizações da sociedade civil mencionados pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Os dados alarmantes levaram as Nações Unidas no Brasil a criar o projeto Trans-Formação, que busca capacitar transexuais para atuar como lideranças pelos direitos da população trans. A iniciativa entra em sua segunda edição com o objetivo de ampliar o diálogo com a sociedade.
"O Trans-Formação propõe fortalecer a capacidade de pessoas trans, para que elas possam conhecer e demandar seus direitos. Ao mesmo tempo, a ideia é engajar várias instituições para que elas também contribuam para a igualdade de pessoas trans", detalha Angela Pires Terto, assessora de Direitos Humanos da ONU no Brasil.
Para os idealizadores do projeto, o primeiro passo para alterar as estatísticas que colocam o Brasil no topo da violência é integrar os transexuais na sociedade. De acordo com a advogada Maria Eduarda Aguiar da Silva, coordenadora da Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (Abrafh) no Rio de Janeiro, 90% da população trans acaba recorrendo à prostituição e vive sujeita a violência e crimes de ódio por não encontrar espaço na sociedade.
"A população trans, historicamente, foi alijada do sistema básico de educação, do mercado formal de trabalho e da cidadania", pontua Silva, cuja associação reúne hoje cerca de 400 membros LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, travestis e intersexuais) atuando em diferentes estados brasileiros e no DF.
O combate à intolerância também passa pela conciliação no discurso político, diz Silva. "Temos políticos que inflamam pessoas dizendo que a população LGBTI quer destruir a família brasileira. Dessa forma, ainda há muita resistência em se falar sobre o tema gênero e sexualidade nas escolas".
De vítimas a formadores de opinião
O programa da ONU Brasil pretende romper os tabus ao qualificar os próprios membros da comunidade LGBTI para atuar como mediadores entre a população transexual e outros setores da sociedade.
Melissa Massayury foi uma das 24 participantes da primeira edição do Trans-formação. Mulher trans e estudante de Direito em Brasília, ela conta que hoje se sente apta a atuar politicamente em prol de pautas da diversidade.
"O Trans-Formação me deixou mais preparada para falar com propriedade sobre o que é ser trans. Hoje eu me sinto mais capacitada a trabalhar no combate ao preconceito e na extinção do estigma de ser trans", explica.
Para a segunda edição do programa Trans-Formação, que está com inscrições abertas no site da ONU Brasil até 7 de março, serão selecionadas 20 pessoas do Distrito Federal e entorno. Fazer parte da iniciativa, porém, é apenas o começo, explica Massayury.
"Não é porque eu participei do projeto que hoje eu sou mais aceita ou sofro menos discriminação. Quem me discrimina nem sabe que sou uma universitária. Quem me discrimina não sabe nada sobre mim", conta.
Por isso, o papel dos participantes é justamente combater a falta de informação e promover o entendimento.
"Consegui me engajar mais na sociedade, seja em grupos de discussão, seja no trabalho com outros setores da sociedade. Precisamos nos fortalecer em resposta ao cenário político desfavorável ", completa Massayury.
Países do mundo que legalizaram o casamento gay
A Austrália é o país mais recente do mundo a permitir legalmente o casamento de pessoas do mesmo sexo. Conheça alguns países onde a união homoafetiva é garantida por lei.
Foto: picture-alliance/ZUMA Wire/O. Messinger
2001, Holanda
A Holanda foi o primeiro país do mundo a permitir o casamento de pessoas do mesmo sexo depois que o Parlamento votou a favor da legalização, em 2000. O prefeito de Amsterdã, Job Cohen, casou os primeiros quatro casais do mesmo sexo à meia-noite do dia 1º de abril de 2001 quando a lei entrou em vigor. A nova norma também introduziu a permissão para que casais homoafetivos adotassem crianças.
Foto: picture-alliance/dpa/ANP/M. Antonisse
2003, Bélgica
A Bélgica seguiu a liderança do país vizinho e, dois anos depois da Holanda, legalizou o casamento de pessoas do mesmo sexo. A lei deu a casais homoafetivos muitos direitos iguais aos dos casais heterossexuais. Mas, ao contrário dos holandeses, os belgas não deixaram que casais gays adotassem. Esse direito foi garantido apenas três anos depois pela aprovação de uma lei no Parlamento.
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2010, Argentina
A Argentina foi o primeiro país da América Latina a legalizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo, quando 33 senadores votaram a favor da lei, e 27 contra, em julho de 2010. Assim, a Argentina se tornou o décimo país do mundo a permitir legalmente a união homoafetiva. Em 2010, Portugal e Islândia também aprovaram leis garantindo o direito ao casamento gay.
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2012, Dinamarca
O Parlamento dinamarquês votou a favor da legalização do casamento gay em junho de 2012. O pequeno país escandinavo já havia aparecido nas manchetes da imprensa internacional quando se tornou o primeiro país do mundo a reconhecer uniões civis para casais gays, em 1989. Casais formados por pessoas do mesmo sexo também já podiam adotar crianças desde 2009.
Foto: picture-alliance/CITYPRESS 24/H. Lundquist
2013, Uruguai
O Uruguai aprovou uma lei eliminando a exclusividade de direitos de casamento, adoção e outras prerrogativas legais para casais heterossexuais em abril de 2013, um mês antes de o Brasil regulamentar (mas não legalizar) o casamento gay. Foi o segundo país sul-americano a dar esse passo, depois da Argentina. Na Colômbia e no Brasil, o casamento gay é permitido, mas não foi legalizado pelo Congresso.
Foto: picture-alliance/AP
2013, Nova Zelândia
A Nova Zelândia se tornou o 15º país do mundo e o primeiro da região Ásia-Pacífico a permitir casamentos homoafetivos em 2013. Os primeiros casamentos aconteceram em agosto daquele ano. Lynley Bendall (e.) e Ally Wanik (d.) estavam entre esses casais, com a união civil a bordo de um voo entre Queenstown e Auckland. No mesmo ano, a França também legalizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/Air New Zealand
2015, Irlanda
A Irlanda chamou atenção internacional em maio de 2015, quando se tornou o primeiro país do mundo a legalizar o casamento gay com um referendo. Milhares de pessoas comemoraram nas ruas de Dublin quando os resultados foram divulgados, mostrando quase dois terços dos eleitores optando a favor da medida.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/A. Crawley
2015, Estados Unidos
A Casa Branca foi iluminada com as cores da bandeira do arco-íris em 26 de junho de 2015. A votação no Supremo Tribunal dos EUA decidiu por 5 a 4 que a Constituição americana garante igualdade de casamento, um veredito que abriu caminho para casamentos homoafetivos em todo o país. A decisão chegou 12 anos depois que o tribunal decidiu pela inconstitucionalidade de leis criminalizando o sexo gay.
A Alemanha foi o 15º país europeu a legalizar o casamento gay no dia 30 de junho de 2017. A lei foi aprovada por 393 votos a favor e 226 contra no Bundestag (Parlamento alemão). Houve quatro abstenções. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, votou contra, mas abriu caminho para a aprovação quando, alguns dias antes da decisão, disse que seu partido poderia votar livremente a medida.
Foto: picture-alliance/ZUMA Wire/O. Messinger
2017-2018, Austrália
Após uma pesquisa mostrando que a maioria dos australianos era a favor do casamento de pessoas do mesmo sexo, o Parlamento do país legalizou a união homoafetiva em dezembro de 2017. Os casais australianos precisam avisar as autoridades um mês antes do casamento. Assim, muitas pessoas se casaram logo depois da meia-noite de 9 de janeiro (2018), como Craig Burns e Luke Sullivan (na foto).
Foto: Getty Images/AFP/P. Hamilton
E no Brasil?
Na foto, as brasileira Roberta Felitte e Karina Soares posam após casarem em dezembro de 2013, no Rio. Em maio daquele ano, o Brasil regulamentou o casamento gay por meio de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Mas, apesar de cartórios não poderem se recusar a casar pessoas do mesmo sexo, a norma não tem força de lei e pode ser contestada por juízes.