Forças Armadas podem ficar na Amazônia até 2022, diz Mourão
16 de julho de 2020
Em meio à pressão de investidores, vice afirma que governo vai procurar diminuir desmatamento e queimadas ao "mínimo aceitável" e mostrar que proteção ambiental e desenvolvimento econômico não são incompatíveis.
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O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, afirmou nesta quarta-feira (15/07) que, se necessário, o governo pode manter as Forças Armadas em operação contra o desmatamento e as queimadas na Amazônia até o fim de 2022, quando termina o atual mandato presidencial.
"A operação é uma medida urgente, mas não é um esforço isolado. As ações estão sendo ampliadas para evitar as queimadas durante o verão amazônico, que já começou e se estende até setembro", afirmou Mourão.
O vice-presidente falava após uma reunião do Conselho Nacional da Amazônia Legal, órgão que coordena diversas ações direcionadas à preservação da floresta e do qual é presidente.
O governo brasileiro prometeu adotar as "medidas possíveis" para conter a desmatamento na região, após pressões de investidores, que ameaçam retirar os seus apoios ao país se a destruição da Amazônia não for interrompida. "Seremos avaliados pela eficácia de nossas ações e não pela nobreza de nossas intenções", admitiu Mourão.
O aumento do desmatamento e dos focos de incêndio durante o governo do presidente Jair Bolsonaro suscitou preocupações e questionamentos entre fundos globais de investimento e também empresas privadas brasileiras.
O vice-presidente afirmou que o Executivo não nega nem esconde informações sobre a gravidade da situação, mas que não aceita o que chamou de narrativas simplistas e enviesadas sobre o assunto.
"Como se não bastasse o prejuízo natural brasileiro, os crimes ambientais deixam o nosso país vulnerável a campanhas difamatórias, abrindo caminho para que interesses protecionistas levantem barreiras comerciais injustificáveis às exportações do agronegócio", declarou Mourão.
"Vamos procurar diminuir aos mínimos aceitáveis o desmatamento e as queimadas e mostrar que a proteção ambiental e o desenvolvimento econômico não são incompatíveis", concluiu o general.
O governo brasileiro tenta melhorar sua imagem no exterior em relação à proteção da Amazônia e dos povos indígenas, diante de críticas e alertas que tem recebido de investidores.
A destruição da floresta aumentou 10,6% em relação a junho de 2019, atingindo 1.034 km². Em relação a junho de 2018, a alta foi de 112%, e a junho de 2017, de 70%.
Quando considerados os seis primeiros meses de 2020, o desmatamento aumentou 25% em relação ao mesmo período do ano passado, para 3.069 km².
Somente na região da Amazônia brasileira, cerca de 437 mil km² de floresta tropical foram derrubados nos últimos 30 anos, segundo dados do Inpe. Em parte dessa terra pastam os rebanhos de gado; em outra, cultiva-se soja.
Foto: DW/N. Pontes
Mato Grosso diverso
Terceiro maior estado do país, atrás de Amazonas e Pará, Mato Grosso é o único a abrigar três biomas: Amazônia, Cerrado e Pantanal. Dados oficiais apontam que 65% da Floresta Amazônica nativa estão conservados no estado, a maior parte na região noroeste, onde se concentram terras indígenas e unidades de conservação.
Foto: DW/Nádia Pontes
O desafio do convívio
Mato Grosso também é campeão em área plantada de soja no país: são 106 mil km², área maior que a de Portugal. Um levantamento feito pela Universidade Estadual de Mato Grosso mostra que o aumento da área cultivada na safra 2018/19 ocorreu principalmente no bioma Amazônia, com 144.074 hectares, 64% das novas áreas. No Cerrado, a expansão foi de 80.737 hectares, e no Pantanal, de 592 hectares.
Foto: DW/Nádia Pontes
Da China para o Brasil
Foi às margens do rio Yangtsee, na China, há mais de 4 mil anos, que surgiram os primeiros registros de cultivo de soja, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Atualmente, o país asiático é o principal destino desse grão produzido no Brasil. A soja chegou à Europa e aos Estados Unidos antes de virar importante commodity brasileira.
Foto: DW/Nádia Pontes
Soja no Mato Grosso
No Brasil, o cultivo da soja só foi possível com a intervenção de cientistas da Embrapa para adaptar a cultura às condições tropicais. O grão começou a ganhar terreno no Brasil no fim da década de 1960, no Rio Grande do Sul. Atualmente, o país é o segundo maior produtor, com 114,8 milhões de toneladas, atrás dos Estados Unidos (123,6 milhões de toneladas) na safra 2018/2019.
Foto: DW/N. Pontes
Moratória da soja
Em julho de 2006, um pacto pioneiro entrava em vigor para conter o avanço das lavouras sobre a Amazônia: a Moratória da Soja. O acordo envolve ONGs, agroindústria e governos, que firmaram o compromisso de não comprar commodity de áreas desmatadas. Mas a moratória está na berlinda, já que algumas associações de produtores se movimentam para colocar fim ao pacto.
Foto: DW/Nádia Pontes
Uso de agrotóxico
Não é raro ver aplicação de agrotóxico em plantações ao longo das rodovias no norte de Mato Grosso, conhecido como portal da Amazônia. De 2000 a 2016, o aumento do consumo de agrotóxicos no Brasil foi de 240%, mostram dados oficiais. As vendas são, em 52% dos casos, destinadas à cultura da soja. Cana e milho vêm em seguida, com 10% cada, revelou o trabalho da pesquisadora Larissa Bombardi.
Foto: DW/Nádia Pontes
Agroecologia
Cercado por vastas áreas de plantação de soja, moradores do assentamento 12 de Outubro, no município de Cláudia, tentam aplicar os princípios da agroecologia, cultivo livre de agrotóxico. Além da venda dos alimentos produzidos no local em feiras nas cidades vizinhas, as frutas e hortaliças também são oferecidas pela internet num sistema criado pelos produtores e estudantes, o Cantasol.
Foto: DW/Nádia Pontes
Floresta fragmentada
Pesquisadores como os biólogos Ana Lúcia Tourinho e Domingos de Jesus Rodrigues, da Universidade Federal de Mato Grosso, destacam que a degradação ambiental e fragmentação da floresta são uma ameaça à Amazônia. O aumento do desmatamento, do fogo e de grandes obras, como hidrelétricas, prejudica serviços ecossistêmicos como a produção de chuva, fundamental para o agronegócio.