MPF aponta risco em metade das barragens brasileiras
5 de novembro de 2016
De 397 unidades de mineração analisadas pelo Ministério Público Federal, cerca de 50% têm potencial de causar dano similar ou superior ao do desastre em Mariana. Órgão denuncia falta de estrutura e legislação defasada.
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Um levantamento feito pelo Ministério Público Federal (MPF) aponta que cerca de metade das barragens de mineração brasileiras apresentam riscos semelhantes ou superiores à de Mariana, cujo rompimento completa um ano neste sábado (05/11).
"O problema é sério: Mariana não foi o primeiro e provavelmente não será o último caso de rompimento de barragens de mineração", alertou a entidade nesta sexta-feira. O estudo realizado em 397 barragens em 16 estados brasileiros mostrou que elas não são fiscalizadas adequadamente, segundo uma nota do MPF.
Cerca de 50 procuradores em 44 unidades do MPF estão investigando a situação dessas barragens e, de acordo com a nota, a análise das primeiras informações recebidas apontaram falhas de fiscalização "por falta de estrutura e legislação defasada, que não traz garantias financeiras, regularidade ambiental e redução de resíduos".
O MPF recomendou que se pense em alternativas para reforçar a estrutura do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM9), como a "contratação das auditorias externas certificadas".
Histórico de rompimentos
O rompimento da barragem de Mariana, operada pela empresa Samarco, foi considerado o maior desastre ambiental da história do país. A lama com resíduos da exploração de minério de ferro invadiu a localidade de Bento Rodrigues, derrubou casas e deixou 19 mortos, além de destruir vegetação e poluir a bacia do Rio Doce.
Na nota, o MPF lembrou que "outros rompimentos de barragem causaram grandes impactos socioambientais no país nos últimos 15 anos". Em 2001, por exemplo, o rompimento da barragem de Macacos, em Minas Gerais, deixou cinco mortos, e em 2007, a ruptura da barragem de Miraí, no mesmo estado, atingiu 1.200 casas e cerca de 4 mil pessoas ficaram desalojadas.
Para o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, o histórico preocupa. "Tivemos episódios menores, mas com danos grandes ao meio ambiente antes de Mariana e, estruturalmente, nada foi feito para evitar novas tragédias. Tiramos lições desse episódio e algumas delas são que precisamos reforçar nossos órgãos fiscalizadores e aperfeiçoar a nossa legislação. São ações extremamente necessárias, o Ministério do Meio Ambiente está se estruturando e fazendo uma ampla ação para fiscalizar as barragens", cita a nota do MPF.
LPF/lusa/ots
A tragédia de Mariana, um ano depois
O retrato dos vilarejos inundados pela lama da mineração. Num cenário de devastação, moradores ainda resistem à tragédia e esperam compensação da empresa responsável pelo maior desastre ambiental ocorrido no Brasil.
Foto: DW/N. Pontes
Fundão esvaziada
Vista da antiga barragem de Fundão, em uso desde 2009 pela mineradora Samarco,
controlada pela Vale e BHP Billiton. O local foi escolhido pela empresa em 2005 para armazenar resíduos, já que a barragem de Germano estava perto de atingir a
capacidade total. Segundo o Ministério Público, mais de 40 milhões de
metros cúbicos de rejeitos vazaram após o colapso, em 5 de novembro de
2015.
Foto: DW/N. Pontes
Ponto do rompimento
Ponto exato onde a estrutura que barrava os rejeitos armazenados em Fundão se rompeu. Segundo relatório que avalia as causas do desastre, às 14h funcionários no escritório sentiram um forte tremor. Às 15h45, gritos de trabalhadores foram ouvidos no rádio, alertando que a barragem havia entrado em colapso. Dezenove pessoas morreram. Problemas na estrutura já haviam sido registrados.
Foto: DW/N. Pontes
Nova Santarém
Construção de estrutura para reforçar a barragem de Santarém, já existente. Com capacidade para 7,1 milhões de metros cúbicos, a barragem armazenava apenas água que era reutilizada no processo de mineração. Desde o rompimento de Fundão, Santarém está lotada de rejeitos, que transbordaram e destruíram vegetação, rios e casas até chegarem ao oceano Atlântico, no Espírito Santo.
Foto: DW/N. Pontes
Vale de lama
Planície onde ficava Bento Rodrigues, distrito de Mariana mais próximo
à barragem de Fundão. Área só pode ser acessada com autorização da
Samarco ou da Defesa Civil. As 206 famílias que residiam no local hoje
moram em casas alugadas pela empresa no centro da cidade. Para
antigos moradores, a maioria só sobreviveu porque a comunidade era
unida e todos se ajudaram na fuga.
Foto: DW/N. Pontes
Dique S4
Obras de construção do dique S4, em Bento Rodrigues. Estrutura terá capacidade para armazenar 1,05 milhão de metros cúbicos e deve ser finalizada em janeiro de 2017. Dique integra sistema de retenção de sedimentos, composto pelos diques S1, S2 e S3, já implantados. Depois de pronto, o S4 vai alagar parte de Bento Rodrigues, mas ruínas importantes do vilarejo serão poupadas, afirma a mineradora.
Foto: DW/N. Pontes
Ruínas da capela
Desde que o acesso foi restabelecido, arqueólogos trabalham no local para recuperar peças históricas. Duas mil foram encontradas até agora e encaminhadas para restauração. A única parte da igreja São Bento que resistiu à avalanche de lama foi a estrutura baixa. Para restaurá-la, profissionais adotaram os mesmos procedimentos feitos em escavações arqueológicas.
Foto: DW/N. Pontes
À espera do Novo Bento
A foto mostra parte da estrutura de uma casa em Bento Rodrigues, um ano após a tragédia. Comunidade será construída em novo local, conhecido como Lavoura. O terreno, de 350 hectares, está localizado a nove quilômetros do antigo distrito. Entrega está programada apenas para março de 2019. Moradores estão em fase de contratação de uma consultoria independente, que deve acompanhar todo o processo.
Foto: DW/N. Pontes
Protesto de sobreviventes
Nas paredes que ainda estão de pé, sobreviventes deixaram mensagens de protesto contra mineradora Samarco. Acesso ao local continua impedido, devido às obras de construção do dique S4 e por causa de furtos de objetos pessoais e de materiais que não foram levados pela onda de rejeitos, como portas e janelas. O distrito foi fundado há mais de 200 anos e ficava a 35 quilômetros do centro de Mariana.
Foto: DW/N. Pontes
Ritmo de recuperação
Ribeirão do Carmo, próximo à comunidade de Paracatu de Baixo, uma das áreas atingidas pelos rejeitos que vazaram de Fundão. A última vistoria técnica do Ibama concluiu que a semeadura, que é o plantio de gramínea e leguminosas às margens dos rios para ajudar a conter os rejeitos, tem muitos problemas e precisa ser refeita em 90% dos locais.
Foto: DW/N. Pontes
Horta sobre a lama
Antônio Geraldo de Oliveira, 63 anos, nasceu na comunidade de Paracatu de Baixo e se recusa a deixar o local. Ele perdeu o contato com a esposa e filhos, que se mudaram para o centro de Mariana após o desastre. O produtor rural removeu sozinho a lama que encobriu seu terreno e plantou uma horta. Ao fundo, é possível ver os rejeitos, que tomaram a área de um antigo canavial.
Foto: DW/N. Pontes
Deserto
Nas ruas do antigo vilarejo de Paracatu de Baixo, onde viviam 103 famílias, ainda circulam alguns animais abandonados. Dentre os moradores que decidiram ficar estão apenas homens. A maioria perdeu o contato com a família depois da tragédia. O novo vilarejo será construído no distrito de Monsenhor Horta. A expectativa é que o projeto urbanístico seja concluído até o fim do ano.