1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW
HistóriaAlemanha

Museu alemão resgata história da migração

7 de julho de 2021

Centro de Emigração em Bremerhaven conta histórias de migrantes alemães rumo ao Novo Mundo, incluindo o Brasil, e também de estrangeiros que deixaram seus países para viver na Alemanha.

Figuras de imigrantes aguardando sua passagem para o Novo Mundo
Figuras de imigrantes aguardando sua passagem para o Novo MundoFoto: Stefan Volk/Deutsches Auswandererhaus

"Eles chegam em massa, recusam-se a aprender nossa língua. Vêm de sociedades autoritárias, não têm educação, se isolam. [...] Em breve vão nos superar em número... Nosso governo também será abalado por isso."

A citação acima pode soar como um discurso inflamado sobre refugiados e requerentes de refúgio proferido por um partido político xenófobo de ultradireita, como a Alternativa para a Alemanha (AfD).

Mas as pessoas que supostamente se recusam a se integrar nesse caso são imigrantes alemães nos Estados Unidos. E quem fez tal julgamento impiedoso sobre eles, em meados do século 18, foi ninguém menos que Benjamin Franklin, um dos pais fundadores da nação americana.

Benjamin Franklin se ressentia com os imigrantes alemães por eles não comprarem o jornal que publicavaFoto: Public Domain

Franklin corredigiu a Declaração da Independência em 1776, afirmando que "todos os homens nascem iguais" e são dotados de "certos direitos inalienáveis".

Mas ele não gostava dos imigrantes alemães e também se ressentia por eles não comprarem o jornal em inglês publicado por ele.

Só que já era tarde demais. No século seguinte, 6 milhões de alemães migrariam para o Novo Mundo em busca de igualdade e uma vida melhor. Muitos europeus do Leste seguiram o mesmo caminho. Eles estão entre as inúmeras histórias de imigração e emigração da Alemanha contadas de perto no Centro Alemão de Emigração em Bremerhaven, no estado de Bremen.

Emigrando para um futuro incerto

Quando a casa abriu suas portas na cidade portuária de Bremerhaven, em 2005, seus criadores estavam preocupados principalmente com os emigrantes, já que neste local histórico embarcaram em navios cerca de 7,2 milhões de pessoas entre 1830 e 1974. Cada um carregando consigo a esperança de uma vida melhor no exterior, especialmente nos EUA.

Reconstrução dos ancoradouros de um dos primeiros navios de imigrantes no Centro Alemão de EmigraçãoFoto: Deutsches Auswandererhaus

A travessia de Bremerhaven para Nova York durava cerca de seis semanas, explica a diretora do museu, Simone Blaschka.

"A população da Alemanha quase dobrou no século 19, então dá para imaginar o que estava acontecendo no mercado de trabalho", aponta Blaschka. "No campo, o solo era bom, mas a terra era muito pequena para alimentar as famílias. As pessoas não viam futuro para si mesmas ou para seus filhos e [por isso] decidiram emigrar."

A passagem em um veleiro custava aproximadamente o salário anual de um artesão. Para pagar tal preço, as famílias tinham que vender todos os seus pertences. Um grande passo para um futuro incerto em um país estrangeiro – e ainda assim as pessoas corriam o risco.

Na trilha dos migrantes

No Centro Alemão de Emigração, visitantes podem seguir os passos desses primeiros migrantes econômicos graças a reconstruções fiéis.

É possível, por exemplo, colocar-se entre os viajantes que aguardam com seus pertences no cais e ouvir o rugido das ondas e os gritos dos estivadores; ou escalar as pranchas de madeira na entrecoberta rangente de um navio de emigrantes e eventualmente terminar na estação de imigração na Ellis Island, em Nova York – onde os recém-chegados da Europa eram submetidos a rigorosos interrogatórios antes de serem autorizados a pisar em solo americano.

Era em Ellis Island que as autoridades examinavam quem tinha permissão para entrar nos Estados Unidos – e quem deveria ser mandado de volta.

Reprodução da estação de imigração na Ellis Island, nos Estados UnidosFoto: Deutsches Auswandererhaus

Por meio de memórias privadas, filmes, estações de áudio, fotos e cartas de imigrantes, as histórias de família ganham vida no museu.

Os relatos não se restringem, contudo, a imigrações para os EUA. Lá o visitante também pode se informar mais sobre como diversas plantações de café no Brasil e em outros países da América Central e do Sul foram muitas vezes cultivadas ou mesmo fundadas por imigrantes alemães.

Um dos relatos, por exemplo, conta a história do político alemão de origem judia Erich Koch-Weser. Depois que os nazistas tomaram o poder em 1933, ele deixou sua terra natal Bremerhaven em direção a Rolândia, no Paraná.

Em Rolândia – cujo próprio nome é uma homenagem a Roland, um herói medieval alemão –, os colonos alemães fundaram plantações, muitos delas de café – assim como a família Koch-Weser em sua Fazenda Janeta.

Bem-vindos à Alemanha?

Mas o museu não é apenas sobre imigrantes da Alemanha e do Leste Europeu que deixaram o Velho Continente, mas também sobre mais de 300 anos de história da imigração para a própria Alemanha.

Intitulada "Bem-vindo à Alemanha", a segunda parte da exposição começa com a chegada dos huguenotes franceses no século 17, após serem perseguidos em sua terra natal por causa de sua fé protestante.

A história continua com os chamados trabalhadores convidados da Turquia, Grécia, Espanha e Itália, que foram recrutados pela primeira vez para ajudar a reconstruir a Alemanha do pós-guerra na década de 1960. Aqui se encontram histórias de repatriados russos e refugiados da guerra civil iugoslava, de chilenos que fugiram da ditadura, de vietnamitas na República Democrática da Alemanha (RDA, antiga Alemanha Oriental).

O destino de incontáveis refugiados que chegaram da Síria, do Afeganistão e de muitos países africanos nos últimos anos tem sido uma questão política delicada desde que a chanceler federal Angela Merkel prometeu, em 2015, que a Alemanha ofereceria residência temporária aos refugiados.

Refugiados na Alemanha: histórias de sonhos e desilusões

04:04

This browser does not support the video element.

A chamada crise de imigração expôs velhas divisões sociais e políticas em torno da questão da migração e levou ao surgimento do partido de ultradireita AfD e a uma escalada da retórica anti-imigração.

"Por muito, muito tempo, a Alemanha não se via como um país de imigração", observou Simone Blaschka. "Mas a imigração faz parte da nossa história nacional."

Tal história é contada pelo Centro de Emigração através de um "tesouro" de lembranças e objetos pessoais que contam histórias de pessoas deslocadas.

Isso inclui o contrato de trabalho de uma mulher da ex-Iugoslávia que queria ser chamada pelo nome e não como um número, pois isto despertava nela dolorosas memórias da era nazista, quando as pessoas eram tatuadas com números.

Há também um crachá de uma creche com os dados e a foto de um menino sírio – um dos poucos objetos remanescentes de uma pátria devastada pela guerra.

Carteira de identidade do jardim de infância de Ayaz, um refugiado da Síria: pouco resta de seu passadoFoto: Sammlung Deutsches Auswandererhaus

Novas perspectivas sobre migração

Recentemente, o Centro de Emigração acrescentou mais um andar ao seu espaço de exposição, que foi então aberto no final de junho de 2021 com novos destaques. A fachada é estampada com retratos de 33 imigrantes.

Por dentro, foram criados os chamados espaços de pensamento digital. "Claramente, temos uma missão educacional", disse Simone Blaschka. O objetivo é que os visitantes repensem o tema migração.

"Como queremos conviver e como queremos moldar juntos este país?", questiona Blaschka. "Quantas pessoas em meu círculo de conhecidos ou amigos têm histórico de migração?"

"Queremos mostrar o quão diverso e elástico é o termo migração", acrescenta.

Um banco de dados do centro facilita ainda a busca de raízes familiares, permitindo que "os visitantes descubram que provavelmente também havia imigrantes, refugiados ou deslocados entre seus próprios ancestrais", destaca Blaschka.

O Centro Alemão de Emigração é uma das grandes atrações de Bremerhaven Foto: Deutsches Auswandererhaus

Assim, alguém pode descobrir, por exemplo, que é descendente de imigrantes alemães – outrora apelidados de "yokels" (caipiras) por Benjamin Franklin – que rumaram para o Novo Mundo em busca de uma vida melhor. Assim como os migrantes que hoje enfrentam perseguição na Alemanha, muitos lutaram, mas acabaram encontrando uma maneira de se integrar.

Pular a seção Mais sobre este assunto

Mais sobre este assunto

Mostrar mais conteúdo