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ArteHolanda

Museus buscam arte para além dos "homens brancos"

Paula Onusseit
29 de maio de 2023

Novo diretor constatou: mulheres, negros e outras etnias eram quase ausentes no acervo de museu de arte contemporânea holandês. Com quotas, diálogo ou novas concepções, instituições perseguem meta da diversidade.

Cena do documentário White balls on walls
Cena do documentário "White balls on walls", de Sarah VosFoto: White Balls on Walls/Zeppers Film/NTR

Assim que assumiu a diretoria do Stedelijk Museum Amsterdam, em dezembro de 2019, Rein Wolfs logo pôs mãos à obra a fim de tornar mais diversos e inclusivos o acervo e o pessoal da conceituada instituição cultural holandesa. E durante três anos a cineasta Sarah Vos acompanhou o processo.

Sua câmera observou Wolfs, ex-diretor do museu Bundeskunsthalle, em Bonn, trabalhando com seus funcionários para avaliar o escopo da coleção e dos projetos de exposição do Stedelijk.

A decepcionante conclusão foi que 90% eram "coisa de homens brancos": menos de 10% das peças eram de mulheres. Obras de artistas negra/os, indígenas ou de outros grupos étnicos não brancos (BIPoC, na sigla em inglês) eram mais raros ainda.

O documentário resultante, White balls on walls (Bolas brancas em paredes), não só questiona o nível de diversidade do museu de arte moderna e contemporânea da capital da Holanda, mas se aprofunda para entender a função da arte na sociedade.

Museu Stedelijk de Amsterdã se especializa em arte moderna e contemporâneaFoto: Ramon van Flymen/ANP/picture alliance

Navegando a busca da diversidade

Wolfs comenta que, no passado, as instituições culturais "não pensavam fora da caixa o suficiente". Em contraposição, ele quer que o Stedelijk pense de modo mais global, alinhando sua concepção de diversidade à estrutura populacional de Amsterdã: "Afinal, queremos que todo mundo tenha a oportunidade de encontrar sua própria história e seus próprios momentos de identificação."

A discussão sobre uma nova concepção de mostras levanta questionamentos: diversidade pode e deve ser quantificada através de palavras e quotas? A origem e gênero da/os artistas deve influenciar a avaliação das obras?

A equipe do Stedelijk acordou quanto a uma quota: de 2021 a 2024, pelo menos 50% do orçamento para aquisições deve ser dedicado a obras de negros indígenas e não brancos.

Não há quotas fixas para mulheres, prossegue Wolfs, porém gênero é um dos fatores no processo de seleção. Além disso, deve haver pelo menos uma mostra anual com artistas de etnias não ocidentais-brancas ou uma coletiva abordando diversidade.

Antes do Stedelijk, Rein Wolfs dirigia o Bundeskunsthalle de BomFoto: Sander Koning/ANP/picture alliance

Museus etnológicos: lar natural da diversidade

A diversidade desempenha um papel inerente nas institiuições etnológicas que apresentam artefatos e objetos de arte de todo o mundo, como o Museu das Culturas do Mundo de Frankfurt. Ele se centra em povos indígenas que são minorias em seus países de origem, explica a diretora Eva Raabe. Outro foco do acervo e das exposições são obras de mulheres, crianças e indivíduos queer.

Segundo Raabe, não se trata de quotas específicas, mas da mensagem que a/os artistas querem passar com suas obras. "Através de sua arte, que é uma expressão de suas opiniões, suas necessidades, ela/es nos contam sobre a realidade de suas vidas": ao incluir uma ampla variedade de perspectivas, a seleção é inerentemente diversa.

Por sua vez, o Kindl – Centro de Arte Contemporânea, de Berlim, se empenha por um programa de exposições altamente diversificado", explica a diretora Kathrin Becker.

"Eu também tenho uma missão pessoal aqui, a qual partilho com muitos colegas de Berlim e de outras partes, que é alcançar uma multitude de vozes na apresentação da arte contemporânea." Nesse aspecto, tanto a identidade de gênero quanto o histórico étnico e socioeconômico são importantes.

Em exposições "multiperspectiva", Museu das Culturas do Mundo de Frankfurt apresenta alternativas ao eurocentrismoFoto: Boris Roessler/dpa/picture alliance

Incentivo ou ofensa aos artistas?

Mas nem todos os artistas se mostram entusiasmados com essa abordagem: "Eu acharia quase uma ofensa se o Stedelijk fizesse um mostra da minha obra por estar em busca de artistas BIPoC", comenta o escultor surinamense-holandês Remy Jungerman em White balls on walls.

O diretor Wolfs diz não saber de artistas que se recusem a expor em seu museu por causa das quotas. Por outro lado, não se surpreende com as críticas a essa estratégia por mais inclusividade, tendo escutado acusações de que o Stedelijk de Amsterdã estaria colocando sua agenda política à frente da arte.

"Somos considerados 'woke' [gíria americana para 'alerta a preconceitos e discriminação'], e hoje em dia isso é palavrão. Recebemos muitos elogios, mas também um monte de críticas. Mas isso é meio parte desta instituição: somos um museu que está sempre bastante na linha de frente."

Wolfs vê uma tendência à diversidade praticamente por toda parte; não só nos museus como na política cultural e nos movimentos sociais. Também segundo Kathrin Becker, do Kindl, os diretores de museus estão cada vez mais procurando contrapor novas ideias aos acervos "muito ocidentais e eurocêntricos", inclusive convidando artistas que "não representam a arte ocidental".

Quer a diversidade seja assegurada por quotas, alcançada pelo diálogo ou criada em exposições com perspectivas múltiplas, a consciência sobre a questão parece estar provocando mundanças. Como resume Eva Raabe, do Museu de Culturas do Mundo de Frankfurt: "Na verdade, sempre se pode fazer mais para dar uma voz aos grupos menores."