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História

Na Grécia, um capítulo esquecido da barbárie nazista

Alexandra Kosma md
6 de outubro de 2016

Em 1944, tropas de Hitler massacraram quase toda a população do vilarejo de Distomo. Livro resgata história de menino de quatro anos que sobreviveu e chama a atenção para questão das reparações de guerra pela Alemanha.

Argyris Sfountouris em 2014 durante evento em Berlim sobre massacre de Distomo
Argyris Sfountouris em 2014 durante evento em Berlim sobre massacre de DistomoFoto: DW/Panagiotis Kouparanis

O menino tem apenas quatro anos, mas deixa uma marca quando aparece na televisão. O tema do programa Die Anstalt, da rede estatal alemã ZDF, é Grécia, a crise do euro e as reparações de guerra. Ele mostra de forma curta a história de Distomo, uma pequena cidade no centro da Grécia, onde os nazistas foram tão cruéis como em nenhum outro lugar do país. Quase ninguém sabe disso.

Durante a exibição, o tempo todo pode ser visto no fundo da imagem esse menino. Seu nome: Argyris Sfountouris. Quando, em 1944, as tropas da SS colocaram fogo em Distomo, estupraram mulheres e mataram seus filhos, a criança estava lá. Os pais dele foram brutalmente assassinados, assim como 32 outros parentes seus. Sua irmã o salvou no último segundo da casa em chamas.

Argyris Sfountouris quando menino na capa do livro de Patric Seibel

O programa foi assistido também pelo jornalista alemão Patric Seibel. Aos 76 anos, Argyris conta ao vivo o que aconteceu em sua aldeia na época e que ele até agora não recebeu indenização ou pedido de desculpas oficial do governo alemão. Seibel se emocionou ao ouvir a história. E, após o programa, decidiu conhecer Argyris Sfountouris melhor.

O massacre

Patric Seibel investigou o passado de Argyris – e o terror nazista na Grécia, pouco lembrado hoje em dia. A história de Distomo é particularmente trágica e cruel. Em 10 de junho de 1944, tropas alemãs da SS receberam a ordem de matar todos os habitantes da aldeia e acabar com o povoado. Aquilo era um ato de vingança por um ataque de combatentes da resistência grega que matara sete soldados alemães. O massacre de Distomo terminou com 218 civis mortos, quase nenhum dos moradores do vilarejo escapou.

Seibel descreve esses eventos históricos em seu livro. O foco, entretanto, é Argyris Sfountouris, cuja história de vida impressionou profundamente o jornalista, como ele mesmo enfatiza em seu livro, intitulado Ich bleibe immer der vierjährige Junge von damals ("continuo o menino de quatro anos de então", em tradução livre). A frase é do próprio Argyris.

"Quando olho para trás e lembro o que aconteceu, não penso com o intelecto que tenho hoje", diz Argyris em entrevista à DW. "Mas como eu, na época, tentei entender essas experiências."

Com oito anos, ele deixou sua Grécia natal e foi para um orfanato em Trogen, na Suíça. Nele, cresceu junto com outros órfãos de guerra, foi para a escola, para a universidade e depois trabalhou como professor de física. Ele também trabalhou como voluntário em vários projetos de ajuda ao desenvolvimento na África e na Ásia.

Flagrante do massacre de Distomo, fotografado por soldado alemão desconhecidoFoto: picture-alliance/dpa

Um santo moderno

No livro, publicado mês passado na Alemanha, a história pessoal de Argyris se confunde com a grega. Mesmo quando morava em Zurique, acompanhava os acontecimentos políticos na terra natal. Na década de 1970, prevalecia a ditadura militar no país. Argyris Sfountouris contribuía com a sua parte para a luta contra a ditadura grega traduzindo para o alemão textos proibidos na Grécia.

Mas não só sua história de vida é notável. Patric Seibel também foi surpreendido pela personalidade forte de Argyris Sfountouris. "Apesar de ter, como criança, experimentado algo terrível, ele é um homem que impressiona incrivelmente, por sua bondade e sua tranquilidade", diz o autor.

"Ele não tem nada de amargo. Embora também tão tenha esquecido nada. Ele permaneceu persistente, é um homem com princípios muito claros", continua. "Talvez o termo seja um pouco forte demais, mas, para mim, ele se parece com um santo moderno."

Luta por justiça

Quando Seibel fala sobre a perseverança de Argyris Sfountouris, ele também se refere à luta dele pelo pagamento das reparações da Alemanha para a Grécia. A história do menino de Distomo fez com que o autor passasse a pesquisar intensamente os crimes de guerra dos nazistas na Grécia.

Argyris Sfountouris foi um dos poucos sobreviventes do massacre que dizimou uma aldeia grega em 1944Foto: picture-alliance/Bernd Kammerer

E também o que aconteceu – ou não aconteceu – após a Segunda Guerra Mundial. Um dos capítulos do livro é dedicado à questão dos pagamentos de indenizações do lado alemão e à posição intransigente da Alemanha em considerar este assunto delicado como encerrado.

"A culpa alemã é clara, legal e moral, penso eu. Mas também não acredito que o atual governo vá mudar sua atitude", pondera.

Mas Argyris Sfountouris não desiste da luta. Há 20 anos ele tenta se fazer ouvir pelos políticos alemães. Ele aprova o passo do governo grego, ao levantar a questão publicamente, mesmo que para muitos tenha sido no pior momento possível. E ressalta que a Grécia tenta se recuperar financeiramente e lutar pela confiança de seus parceiros da UE.

"É difícil encontrar o momento certo. Para os alemães, não há momento certo. Então, tem que haver alguma pressão. Eu disse a Alexis Tsipras, quando o visitei no ano passado, que acredito que esta reivindicação deve se dar a nível internacional", conclui.

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