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Netanyahu começa a ser julgado por corrupção

Tania Krämer ca
24 de maio de 2020

Pela primeira vez na história de Israel, um chefe de governo vai a julgamento durante o mandato. Premiê reafirmou que o processo não passa de uma tentativa de derrubar seu governo.

Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel
Antes de se sentar no banco dos réus, Netanyahu disse que processo não passa de uma tentativa de derrubá-loFoto: Reuters/R. Zvulun

Há apenas pouco mais de uma semana, Benjamin Netanyahu foi empossado novamente como primeiro-ministro de Israel ‒ pela quinta vez em sua longa carreira política. E a partir deste domingo (24/05), ele vai a julgamento: é o início de um processo bastante discutido no qual Netanyahu deverá responder por suspeita de suborno, fraude e abuso de poder ‒ acusações que ele rejeita categoricamente, classificando-as como uma perseguição politicamente motivada contra ele e sua família.

Minutos antes de se sentar no banco dos réus neste domingo, o premiê reafirmou que o processo não passa de uma tentativa de derrubar seu governo. "O que estão julgando hoje é um esforço para frustrar a vontade do povo, para derrotar a mim e ao campo da direita", disse Netanyahu, que acusou a esquerda de intenções golpistas.

Segundo ele, promotores, policiais e imprensa se uniram para "fabricar acusações falsas", que acabaram levando ao julgamento que se inicia agora. "Não há limites", disparou o primeiro-ministro.

Netanyahu chegou ao tribunal acompanhado de ministros do governo e deputados do Likud, partido que integra. O premiê cobrou que o julgamento seja transmitido ao vivo, para que a população se informe diretamente sobre a situação. "Querem me gravar na corte como parte da propaganda deles, mas eu quero que as pessoas vejam as imagens integrais, não através dos jornalistas, para que saibam de tudo."

O repórter especializado em assuntos jurídicos Aviad Glickman acompanhará o julgamento. "Lembro-me muito bem de quando a polícia apareceu pela primeira vez na residência de Netanyahu há três anos", disse Glickman, que cobre o caso para a TV israelense. "É a primeira vez na história de Israel que um primeiro-ministro será julgado durante seu mandato."

O processo deveria ter começado em meados de março, mas foi adiado devido à crise do coronavírus. O então ministro da Justiça Amir Ohana (membro do partido Likud, como Netanyahu) declarou rapidamente um "estado de emergência", de forma que os tribunais só podiam atuar em casos de emergência.

Seguiu-se então uma avalanche de indignação. A data acabou sendo remarcada, apesar da epidemia de covid-19. O tribunal rejeitou uma solicitação dos advogados de Netanyahu para que ele não comparecesse pessoalmente à primeira audiência.

Isso não significa que Netanyahu deva estar presente em todas as demais audiências, dizem juristas. Ele pode, mas não precisa ‒ mesmo assim, o processo será um moroso fardo para o chefe de governo.

"Para que seus advogados possam realizar seu trabalho de forma satisfatória, eles têm de estar em constante contato com Netanyahu, que precisa ser informado de tudo em detalhes. Isso é especialmente importante na fase em que as testemunhas são intimadas", diz Amir Fuchs, especialista jurídico no Instituto da Democracia de Israel.

Três casos contra Netanyahu

A investigação por parte da polícia israelense levou mais de três anos. O procurador-geral Avichai Mandelblit indiciará Netanyahu em três diferentes casos.

No chamado caso 1000, Netanyahu é acusado de ter aceitado durante anos presentes caros, entre outros, do produtor hollywoodiano Arnon Milchan e do bilionário australiano James Packer. Consta que também sua esposa, Sara, e o filho Jair tenham se beneficiado: charutos, champanhe rosé, joias e passagens aéreas avaliadas em 1 milhão de shekels (cerca de 1,6 milhão de reais). Nesse caso, ele foi indiciado por suspeita de abuso de poder e fraude.

O caso 2000 trata de um suposto conchave entre Netanyahu e Arnon Moses, editor do jornal israelense Jediot Achronot, para que o diário publicasse reportagens favoráveis ao premiê. Sua defesa nega que essa fosse a intenção. Por outro lado, o Ministério Público israelense diz ver suspeitas de abuso de poder e fraude.

O caso 4000 investiga a suspeita de um "toma lá, dá cá" ‒ uma troca de favores ‒ entre Netanyahu e o magnata da mídia Shaul Elovitch, ex-acionista controlador na maior empresa de telecomunicações de Israel, Bezeq. Netanyahu, que também era ministro israelense das Comunicações na época, é acusado de fornecer concessões regulatórias a Elovitch.

A acusação afirma que, em contrapartida, Netanyahu e sua família puderam, repetidamente, intervir no portal online Walla, administrado por Elovitch, a fim de uma cobertura favorável no site. Nesse caso, Netanyahu é acusado de suborno, abuso de poder e fraude.

Manifestações contra e a favor de Netanyahu

A figura política de Netanyahu polariza como nenhuma outra em Israel. Rami Matan, coronel da reserva do Exército, vai regularmente às manifestações contra Netanyahu. "É moralmente errado um primeiro-ministro tratar dos assuntos governamentais pela manhã e à tarde se defender perante o tribunal", diz Matan após um protesto com outros veteranos do Exército, em frente à residência do primeiro-ministro. "Ele deveria provar sua inocência, renunciar ao cargo e deixar em paz a nós e ao país."

Os apoiadores de Netanyahu e especialmente ele próprio veem, por outro lado, uma conspiração contra o primeiro-ministro por parte da esquerda, pela mídia e pelo Judiciário. "O campo da direita vê as acusações como fake news; o campo da esquerda quer que ele vá embora", aponta Uri Dromi, chefe do clube de imprensa de Jerusalém e ex-porta-voz do governo de Yitzhak Rabin e Shimon Peres. "E então tem essa massa de gente no meio que diz, ok, existe um sistema judicial no qual acreditamos e vamos ver o que acontece."

Também não é a primeira vez que os israelenses veem seus políticos nos tribunais ou mesmo na prisão ‒ até agora, no entanto, eles haviam renunciado antes da denúncia criminal, como o ex-primeiro-ministro Ehud Olmert, que foi condenado por suborno. Embora os ministros acusados tenham que renunciar, a lei permite que um primeiro-ministro permaneça no cargo até que a sua culpa ou inocência seja comprovada e um possível procedimento de recurso seja concluído.

Netanyahu sempre se recusou a renunciar. Após três eleições gerais no período de um ano e uma paralisação política igualmente longa, o político do Likud chegou a fortalecer ainda mais sua posição: suas ações durante a crise de covid-19 aumentaram seus índices de aprovação, e ele continua como primeiro-ministro ‒ a princípio por 18 meses, como parte de um "governo nacional de emergência" junto ao seu ex-rival Benny Gantz.

O centrista Gantz, que atualmente lidera a pasta da Defesa, assumirá a chefia de governo pelos 18 meses seguintes. Com esse acordo, o chefe do Partido Azul e Branco quebrou sua promessa de campanha de não formar um governo com um primeiro-ministro acusado.

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