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Religião

No Egito, papa busca aproximação entre cristãos e muçulmanos

Martin Gehlen ip
28 de abril de 2017

Em visita ao Cairo, Francisco espera renovar diálogo entre as religiões e quer expressar solidariedade com a comunidade copta, alvo frequente de atentados de radicais islâmicos.

Ahmed al-Tayyeb, grão-imã da Al-Azhar, com Francisco no Vaticano
Ahmed al-Tayyeb, grão-imã da Al-Azhar, reuniu-se com Francisco no Vaticano em 2016Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Rossi

Os 14 jovens teólogos muçulmanos passaram por uma experiência inédita no domingo passado (23/04). Há quatro anos que eles estudam teologia islâmica e alemão na Universidade Al-Azhar, no Cairo. A maioria quer trabalhar como imã na Alemanha e na Áustria depois de concluídos os estudos.

No domingo, pela primeira vez eles se sentaram nos bancos da pequena igreja protestante da movimentada rua Galaa, no centro da capital. Cada um deles tinha um hinário alemão nas mãos e lançava olhares curiosos em torno da nave de cor ocre-amarela, enquanto o padre alemão Stefan El Karsheh explicava o significado da fonte batismal e do altar para seus convidados.

Na Alemanha, é comum que mesquitas ofereçam os chamados "dias de portas abertas" ou que cristãos e muçulmanos organizem encontros em prol do diálogo interreligioso. No Egito, porém, isso é raro. Apenas 10% dos 93 milhões de habitantes são cristãos, e 90% são muçulmanos.

Abdelwakeed Abou Rehab pertence à maioria muçulmana. Mas o jovem de 23 anos cresceu entre cristãos. A casa de seus pais, na cidade de Sohag (situada às margens do rio Nilo e a cerca de 400 quilômetros ao sul da capital), é o único lar muçulmano numa rua repleta de casas de coptas, como são denominados os cristãos egípcios. Na universidade, ele leu pela primeira vez a Bíblia, bem como um livro grosso sobre Jesus escrito por um teólogo alemão. Até agora, no entanto, nunca tinha posto os pés numa igreja.

Al-Azhar é a universidade de maior prestígio do islã sunitaFoto: picture alliance/ZB/M. Tödt

O mesmo vale para Mahmoud Salem. Na mesa redonda organizada após a visita à igreja, ele disse aos párocos alemães o quanto se sentiu comovido com os hinos, a música de órgão e as orações. "Antes, eu só tinha algumas frases aleatórias da Bíblia na cabeça. Eu não sabia que era possível viver a fé cristã de forma tão intensa", disse Salem, que cresceu na parte norte do Cairo.

São experiências como essas que o papa Francisco tem em mente durante a sua visita de dois dias ao Cairo. Em busca de melhores relações entre muçulmanos e cristãos, o pontífice começa sua visita esta sexta-feira (28/04) com uma reunião com o reitor da Universidade de Al-Azhar, a instituição acadêmica mais antiga e prestigiada do islã sunita. Para o grão-imã Ahmed al-Tayyeb, o visitante de Roma é "uma pessoa que tem um profundo respeito por outras religiões em seu coração."

Oração pelas vítimas cristãs

A visita do papa, porém, acontece num momento turbulento, no qual radicais islâmicos mancham a reputação de sua religião de forma sistemática. Nunca a existência e a sobrevivência da minoria cristã na região estiveram tão ameaçadas como hoje.

No Cairo, em Tanta e em Alexandria, homens-bomba mataram dezenas de pessoas numa série de ataques a igrejas coptas. O papa Francisco planeja visitar a Igreja de São Pedro e São Paulo ao lado do papa copta Tawadros 2º, a fim de orar pelos 29 cristãos que foram mortos num atentado em dezembro de 2016, pouco antes do Natal.

No entanto, muitos cristãos que vivem no Egito nutrem poucas esperanças de que um contato mais próximo entre a Al-Azhar e o Vaticano possa melhorar as suas próprias relações com os muçulmanos. "Esta é apenas uma reunião formal – nada além disso", comenta o escritor e analista político copta Kamal Zakher. Ele diz não esperar quaisquer resultados concretos da reunião. Na sua opinião, a Al-Azhar deveria primeiro fazer uma revisão completa do seu discurso religioso antes de iniciar o diálogo com outras religiões.

Dezenas de coptas foram mortos em atentados suicidas em igrejas em Tanta e Alexandria no Domingo de RamosFoto: Getty Images/AFP/Stringer

Mas membros da ordem dos jesuítas – a mesma de Francisco – baseados no Cairo veem as coisas de forma mais positiva. O jesuíta Bimal Kerketta, por exemplo, diz que visita do papa é um bom sinal porque ela renova o contato com a fé islâmica. "Mas, quando se trata da questão de como nós nos entendemos no dia a dia, ainda temos uma estrada longa e difícil pela frente."

Em busca de uma coexistência pacífica

O temor de um atentado terrorista mantém as autoridades de segurança do Cairo em alerta máximo durante a visita papal. Apesar disso, Francisco prefere deixar de lado o papa-móvel à prova de balas ao percorrer a capital egípcia. "Ele me dá a sensação de estar dentro de uma lata de sardinhas", disse certa vez o pontífice de 80 anos, acrescentando que o veículo o impede de ter contato com as pessoas comuns.

O ponto alto da visita será uma missa ao ar livre, no sábado, a ser celebrada no estádio de uma base militar na periferia da cidade. "O papa da paz no Egito da paz" é o lema oficial da viagem. O logotipo mostra o Papa acenando com uma pomba da paz em frente ao Nilo, as pirâmides e a Esfinge. Uma cruz e uma lua crescente adornam o centro, para simbolizar a esperança de uma coexistência pacífica entre o cristianismo e o islamismo.

Essa mesma esperança levou os 14 alunos da Al-Azhar a assistir ao culto cristão no domingo passado. Eles dizem que a situação no Egito contribui para a radicalização de jovens muçulmanos. Segundo eles, é fácil doutrinar as pessoas porque não há liberdade de opinião e tampouco espaço para uma discussão aberta com essas pessoas.

O anfitrião dos alunos, o pastor Stefan El Karsheh, volta a encarar a dura realidade do lado de fora da sua igreja. Após os atentados suicidas em Tanta e Alexandria no Domingo de Ramos, a polícia egípcia quer agora instalar câmeras de segurança acima da porta entrada da igreja alemã.

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