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HistóriaAlemanha

Anos 80: a força do slogan "nós somos o povo"

Sarah Judith Hoffmann

Tanto na Alemanha Ocidental como na Oriental, década de 80 foi marcada por grandes manifestações juvenis. Enquanto uns defendiam a paz e o ambientalismo, outros queriam liberdade e democracia.

Foto: picture-alliance/dpa

Eram 19h quando Günter Schabowski perdeu o controle da situação. Ele comandava uma das primeiras entrevistas coletivas para a imprensa internacional da República Democrática Alemã (RDA), ou Alemanha Oriental. O tema era a nova lei para viagens.

Um repórter torna a perguntar sobre quando entraria em vigor a lei que permitiria aos cidadãos orientais viajar através de "pontos de passagem de fronteira". Schabowski pega suas anotações de maneira nervosa. "Pelo meu conhecimento, ela passa a valer... agora, imediatamente."

Essa é uma das frases de maiores consequências da história alemã. Logo após a coletiva de imprensa, transmitida ao vivo pela televisão da Alemanha Oriental, milhares de pessoas invadiram os postos de fronteira. Quatro horas depois, os guardas de fronteira da Alemanha Oriental tiveram que se render à multidão e abrir as barreiras. Era o fim do Muro de Berlim.

Schabowski cometeu um equívoco: a lei só deveria ser anunciada no dia seguinte. Os guardas de fronteira estavam, portanto, despreparados. Mas aquela noite tinha uma história preliminar. Meses antes, cerca de 200 mil alemães-orientais fugiram através da fronteira austro-húngara e através das embaixadas da Alemanha Ocidental em Budapeste, Praga e Varsóvia. Eram principalmente os jovens que buscavam a fuga.

Clima de mudança

E milhares de pessoas – principalmente jovens – protestavam há semanas nas chamadas "manifestações de segunda-feira" por uma abertura democrática da Alemanha Oriental. Muitos foram presos por causa disso. Todos esses jovens fizeram a revolução pacífica de 9 de novembro de 1989, na qual nenhum tiro foi disparado.

Para toda uma geração foram abertas novas possibilidades. Eles podiam viajar e estudar no exterior. Mas também foram jogados na incerteza. Na Alemanha Oriental, o desemprego era baixo, as carreiras profissionais corriam sobre trilhos estáveis, e era o regime que decidia quem podia e quem não podia estudar.

Após a Reunificação, em 1990, todos passaram a ser os responsáveis únicos pelo próprio futuro. Se isso era uma ruptura intransponível para muitos cidadãos mais velhos da Alemanha Oriental, os jovens "ossis" – como eram conhecidos popularmente – administraram bem a transição. O clima dominante entre eles era de otimismo. No início dos anos 90, um estudo atestou 71% de confiança entre eles.

Eram principalmente os jovens que queriam deixar o regime comunista da Alemanha OrientalFoto: picture-alliance/AP

Pacifismo

Também no lado ocidental o clima entre os jovens era de protesto, desde o início dos anos 1980, em manifestações pacifistas. Eles expressavam seu descontentamento com a corrida armamentista das superpotências e a construção de novas usinas nucleares por meio de acampamentos, correntes humanas e piquetes. Muitos traziam colados a suas roupas um adesivo amarelo com um sol sorrindo, ao lado do slogan "Energia nuclear? Não, obrigado".

No começo dos anos 1980, um em cada cinco eleitores com menos de 24 anos votava, nas eleições regionais, no recém-fundado Partido Verde ou em legendas alternativas. Durante os protestos de 1989, setores do movimento pacifista da Alemanha Oriental se uniram ao Partido Verde da Alemanha Ocidental, formando a Aliança 90/Os Verdes, até hoje o nome oficial do Partido Verde da Alemanha.

Também ocorreram mudanças na atitude da sociedade em relação à homossexualidade. Embora o sexo entre homens adultos não fosse mais passível de punição desde o final dos anos 60, tanto no leste como no oeste, a situação era diferente no caso dos jovens. Na Alemanha Ocidental, relações sexuais entre homens com menos de 18 anos eram proibidas, enquanto casais heterossexuais podiam, pela lei, manter relações a partir dos 14 anos.

Mas, fora do rigor da legislação, a homossexualidade era vivida de forma relativamente aberta, em ambos os estados alemães, em bares, cinemas, discotecas. A legislação para homossexuais só seria abolida no curso da Reunificação. A Alemanha Oriental deu o primeiro passo, ainda em 1988. Na Alemanha reunificada, o trecho chamado popularmente de "parágrafo dos homossexuais" sumiu do direito penal em 1994, no âmbito da equiparação das legislações dos dois Estados alemães.

No início dos anos 80, grandes manifestações pacifistas tomaram o gramado em frente à Universidade de BonnFoto: ullstein bild - BPA

Sintetizadores e uma doença perigosa

A Berlim do tempo da Reunificação é hoje uma lenda. No meio de toda a agitação política, particularmente a parte oriental da cidade se tornou uma espécie de zona livre. Em bairros como Prenzlauer Berg, já um lugar de rebeldia juvenil nos tempos da Alemanha Oriental, havia muito espaço para criatividade. Punks de penteado moicano conviviam com ecologistas de blusa de lã. Prédios quase em ruínas foram ocupados, e festas eram organizadas em antigas fábricas abandonadas, onde os sons dos sintetizadores ecoavam a toda altura.

Alguns anos mais tarde, o espetáculo tecno Love Parade levaria às ruas uma multidão até hoje não superada por nenhum outro evento musical em Berlim.

Mas um fantasma pairava sobre essa nova liberdade juvenil: a aids. A doença havia sido diagnosticada pela primeira vez em 1981, e três anos depois, o vírus HIV era identificado como a causa. Tanto a Alemanha Oriental como a Ocidental iniciavam suas primeiras campanhas na televisão e nas escolas. Mas, na Alemanha Oriental, havia a crença de que o Muro protegia os cidadãos do país. A teoria não estava completamente errada. Até 1990, apenas 133 cidadãos orientais foram infectados com o vírus mortal, e 27 pessoas morreram de aids até a Reunificação. Já na Alemanha Ocidental, quase 42 mil pessoas foram infectadas com o HIV, e mais de 5 mil adoeceram de aids até 1990.

Quando a Conferência Mundial sobre Aids foi realizada na Berlim reunificada, em 1993, os pesquisadores ainda estavam pessimistas. Mas, 25 anos depois, as pessoas que vivem com o HIV na Alemanha conseguem ter uma vida relativamente normal, graças a novos medicamentos, embora a cura ainda não exista.

Movimento pacifista, manifestações de segunda-feira, queda do Muro: os jovens alemães fizeram valer o slogan "nós somos o povo". Até hoje, o 9 de novembro de 1989 é uma das poucas datas da história alemã associada a sentimentos positivos. A geração dos que nasceram em 1989 cresceu com liberdades desconhecidas pelos jovens até então. E, com elas, vieram novos desafios.

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