Com a eleição de Donald Trump e a crise governamental em Seul, o frágil balanço de poderes na península pode sofrer mudanças, e Coreia do Norte tenta capitalizar. "Tudo pode mudar, para melhor ou pior", diz observador.
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No fim de semana, a agência de notícias norte-coreana KCNA difundiu imagens, no mínimo, ameaçadoras: elas mostram armas de artilharia pesada sendo disparadas de colinas, e dezenas de forças especiais saltando de paraquedas e invadindo um complexo de edifícios semelhante à residência presidencial em Seul. Em seguida, eles põem o prédio em chamas.
Numa outra imagem vê-se o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, com binóculos e um sorriso irônico no rosto. O ditador supervisionou o exercício militar a partir de uma sentinela.
Era uma simulação, segundo a própria KCNA, de um ataque militar contra a Coreia do Sul.
A reação de Seul veio prontamente. Ainda na segunda-feira, o Ministério da Defesa de seus aliados em Washington um maior envio de sistemas de vigilância e reconhecimento à Coreia do Sul. Cerca de 40 mísseis anti-bunker teriam sido estacionados no país.
O KEPD-350, da fabricante alemão Taurus, possui um alcance de cerca de 500 quilômetros e, segundo um especialista em armas do Fórum Coreano para Defesa e Segurança, "tem precisão o suficiente para atingir o escritório de Kim Jong-un".
Sinais de Washington
O equilíbrio político na península coreana está mudando. As sanções da ONU contra o regime de Pyongyang deixaram pouco espaço para aproximações entre Sul e Norte. Washington, Pequim e Seul também não querem alterar o status quo – apenas a Coreia do Norte parece querer continuar ampliando seu arsenal nuclear.
No início de novembro, Donald Trump foi eleito presidente dos EUA. Durante a campanha, ele ameaçou, por exemplo, retirar os cerca de 30 mil soldados americanos estacionados na Coreia do Sul, caso os parceiros da aliança não assumissem uma fatia maior dos custos.
Ao mesmo tempo, anunciou estar pronto para conversações diretas com o ditador Kim Jong-un, apenas para, pouco mais tarde e de forma pouco diplomática, difamá-lo como um "maluco".
"Trump parece considerar toda a gama de opções – desde conversas sérias a um ataque militar", disse John Delury, especialista em Coreia, em entrevista recente à imprensa americana.
Então eclodiu a crise política na Coreia do Sul. Na sexta-feira, o Parlamento sul-coreano decidiu pelo impeachment da presidente Park Geun-hye. Seu sucessor temporário, Hwang Kyo-ahn, é considerado um conservador linha-dura. Durante seu tempo como juiz constitucional, ele acusou regularmente sindicalistas e membros da oposição de serem "pró-norte-coreanos".
Logo depois de assumir o poder, Hwang alertou seu gabinete sobre a ameaça representada por Pyongyang, que, segundo ele, iria explorar o temporário vácuo de poder em Seul. Em 2016, o regime norte-coreano já realizou dois testes nucleares e lançou um satélite ao espaço.
Vácuo de poder em Seul
De acordo com a análise da maioria dos especialistas de Coreia do Norte, porém, há pouca evidência de que Kim Jong-un seguirá com suas provocações nas próximas semanas. Por um lado, o regime norte-coreano está ciente de que o partido conservador (Partido Saenuri) em Seul poderia usar outro teste nuclear como forma de desviar a atenção do atual escândalo político.
"Seria extremamente imprudente por parte de Pyongyang, justamente um mês antes da posse do governo Trump, gastar capital político", escreve Christopher Greene, pesquisador de Coreia do Norte na Universidade de Leiden, na Holanda.
Na Coreia do Sul acredita-se que, em 2017, o novo presidente do país será do partido de centro-esquerda, atualmente na oposição. Diversos candidatos defendem uma mudança radical em relação à Coreia do Norte. Um deles é Park Won-soon, atualmente prefeito de Seul. Recentemente, ele apresentou sua visão da nova relação entre as Coreias.
Ele pediu por aproximação econômica e cultural, descrevendo a Coreia do Norte como uma "ponte para a Eurásia". Igualmente, a oposição insta o cancelamento do Thaad, um planejado sistema antimíssil dos EUA, rejeitado, segundo pesquisas, por grande parte da população sul-coreana. A China também vê o sistema como um ataque à sua soberania.
"A incerteza sobre o que esperar da Coreia do Norte nos próximos meses poderia abrir o caminho para um reinício muito necessário", diz James Pearson, correspondente para as Coreias da agência de notícias Reuters. Atualmente, porém, ainda é impossível estimar em qual direção as relações vão se mover: "A situação traz um potencial igualmente forte tanto para melhorar como para piorar."
Os encantos secretos da Coreia do Norte
Natural de Cingapura, o fotógrafo Aram Pan percorreu durante vários dias o território da ditadura comunista na Ásia. Mas se recusou a abordar política: para ele o que contam são belezas naturais e arquitetônicas.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Tranquila beleza de Pyongyang
O fotógrafo cingapurense Aram Pan viajou em 2013 à Coreia do Norte para realizar o projeto DPRK 360, em que buscou imortalizar o povo e a forma de vida desse hermético Estado asiático, expondo as imagens online. Esta foi tirada do Hotel Yanggakdo, onde Pan se hospedou durante sua estada na capital, Pyongyang.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Ao pé dos ídolos nacionais
O Grande Monumento Mansudae é um dos pontos turísticos mais visitados da capital norte-coreana. Turistas locais e internacionais costumam depositar flores aos pés das gigantescas estátuas dos líderes comunistas Kim Il-sung e Kim Jong-il, que se destacam em meio à esplanada extremamente bem cuidada.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Polícia robótica
Aram Pan conta que a policial da foto se manteve imóvel apenas os segundos necessários para registrá-la. Embora no país não circulem muitos automóveis, as cidades mantêm funcionários encarregados de manter a ordem no tráfego – para o que executam movimentos rítmicos, como robôs.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Metrô sob o signo do perigo
São 15h de um dia de agosto de 2013. Embora não seja horário de pico, o metrô da capital está abarrotado. As estações do meio de transporte urbano, que dispõe de duas linhas, foram construídas a vários metros de profundidade, a fim de resistirem a eventuais bombardeios.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
"Shiny happy people"
Cidadãos dançando felizes e despreocupados, numa ditadura comunista? Além de não interferir no que registra, Pan se recusa a discutir política. Ele pede aos que veem suas fotografias que não pensem nele, mas na gente e nas paisagens do país. "Ninguém viaja a um país para fotografar cárceres", argumenta, ao ser criticado por mostrar uma Coreia do Norte amável. A imagem foi feita perto de Wonsan.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Sol, areia e mar
Na costa norte-coreana, não há diferença visível entre os divertimentos dos cidadãos nas praias e os de qualquer democracia do mundo. Eles jogam voleibol, brincam na areia, entram de boia na água. Não faltam chuveiros para tirar a areia antes da volta para casa. Em muitas fotografias de Pan veem-se rostos sorridentes.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Chove sobre a cidade
Dia de chuva em Wonsan, na costa leste. Aram Pan brinca, afirmando que as pessoas sabem mais sobre o cosmos do que sobre a Coreia do Norte. E acrescenta que deseja contribuir com seu pequeno grão de areia para que isso mude.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
De guarda-chuva no palácio
Estas graciosas meninas são alunas do Palácio de Crianças de Mangyongdae, uma escola perto de Pyongyang. Dança, música, interpretação teatral e desenho são algumas das disciplinas ensinadas na conceituada instituição pública.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Talento genuíno
O fotógrafo de Cingapura conta que esteve cinco minutos observando este garoto desenhar e pode atestar que seu talento é genuíno. Alguns visitantes da página do DPRK 360 no Facebook duvidam da autenticidade das fotografias, que poderiam ser encenadas ou seriam meras atuações para os turistas. Aram Pan assegura que não é o caso.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Sensacional coordenação
O famoso Festival Arirang, de que participam até cem mil ginastas, é uma das maiores demonstrações de trabalho coordenado do mundo. A celebração iniciada em 2002, em honra do fundador da nação, Kim Il-sung, é outra das grandes atrações turísticas norte-coreanas.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Expressão da normalidade
Perto de Kaesong, cidade famosa por dispor de fábricas de investidores sul-coreanos, Aram Pan viu esta senhora que passeava com uma menina. Ele diz que a imagem expressa exatamente o que desejava mostrar da Coreia do Norte: gente comum e normal.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Maravilhas de natureza
Os arredores do monte Kumgang são muito frequentados pelos norte-coreanos, que lá vão para fazer piquenique enquanto admiram a paisagem. A região é umas das grandes apostas do regime: o país aspira transformar-se em polo turístico internacional, e maravilhas naturais como Kumgangsam deverão convencer até os mais céticos.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Vida noturna na capital
À noite, os moradores de Pyongyang tomam o bonde para voltar à casa. Aram Pan enfatiza a misteriosa beleza noturna da cidade, quando o silêncio toma conta dela e as luzes lhe conferem uma atmosfera inigualável.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Maior que o de Paris
Construído em 1982 em homenagem ao 70º aniversário do líder Kim Il-sung, o Arco do Triunfo de Pyongyang é uma dezena de metros mais alto do que seu equivalente em Paris, em cuja arquitetura é baseado. Também aqui a escuridão do céu e a iluminação urbana criam um clima mágico.
Foto: Aram Pan, All Rights Reserved
Um mundo sem política?
Enquanto o sol se põe na capital, vê-se, em primeiro plano, a Torre Juche, enorme obelisco de 170 metros de altura também erguido em 1982 em honra de Kim Il-sung. O fotógrafo Aram Pan não quer saber de conflitos, ideologias ou violações dos direitos humanos: para ele o que conta são as belezas naturais e arquitetônicas da Coreia do Norte, as quais quer mostrar ao mundo em seu projeto DPRK 360.