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O adeus ao futebol de Höwedes

Gerd Wenzel
Gerd Wenzel
4 de agosto de 2020

É o sétimo campeão mundial de 2014 que decide pendurar as chuteiras. Ao colocar um ponto final na sua carreira, jogador afirmou estar farto. "O negócio do futebol se desenvolveu de uma forma brutal."

Höwedes, com a camisa do Lokomotiv MoscouFoto: Imago-Images/Jan Huebner

Já é o sétimo campeão mundial de 2014 que decide pendurar as chuteiras. Antes dele, Miroslav Klose (2016), Philipp Lahm (2017), Per Mertesacker, Roman Weidenfeller (2018), Bastian Schweinsteiger (2019) e André Schürrle há alguns dias, seguiram o mesmo caminho. Especula-se que o próximo a tomar rumo idêntico será Mario Götze, considerado herói do título pelo gol que marcou contra a Argentina.  

A rigor, da Alemanha campeã mundial de seis anos atrás, sobraram apenas três jogadores cujas carreiras continuam a todo vapor, seja no respectivo clube ou na seleção: Manuel Neuer, Matthias Ginter e Toni Kroos.  O próprio Neuer declarou recentemente que ainda "sente muito prazer" em jogar mas "se um dia o futebol se tornar um peso para mim, vou fazer igual ao Philipp Lahm". O então capitão da Mannschaft e do Bayern se aposentou em 2017, aos 33 anos.

Em 2001, com apenas 13 anos de idade, Benedikt Höwedes chegou no Schalke 04 vindo do TuS Haltern, clube de sua cidade natal do mesmo nome onde jogava nos times infantis. Com os "azuis reais" logo foi se tornando peça-chave no setor defensivo das equipes juvenis e foi promovido a capitão do time sub-19 em 2005. Um ano mais tarde venceu o título de campeão alemão dessa categoria.

Não demorou muito para assinar o seu primeiro contrato profissional. Foi em 2007 com um salário inicial de quatro mil euros por mês.  No Schalke 04, Höwedes era considerado um "all-rounder", um pau para toda obra no setor defensivo. Atuava como zagueiro, lateral e, se necessário fosse, como volante de contenção.

Por conta de suas consistentes apresentações com os "azuis reais" acabou sendo convocado por Joachim Löw e chegou ao auge de sua carreira na Copa do Mundo de 2014. Atuou em todas partidas do começo ao fim como lateral esquerdo, posição na qual costumava jogar em tenra idade nos times infantis. Höwedes faz parte da galeria de apenas dez jogadores alemães campeões mundiais que estiveram em campo em todas as partidas de um Mundial.

No Maracanã, chegou ao lugar mais alto no pódio do futebol mundial. A partir desse momento histórico não havia mais nada maior a ser conquistado. É até natural que a sua carreira tenha começado a declinar. E foi exatamente o que aconteceu.

Na seleção, ele fez o seu último jogo em março de 2017 contra o Azerbaijão e, no mesmo ano foi praticamente banido do elenco do Schalke 04 pelo recém-chegado técnico Domenico Tedesco. Perdeu a braçadeira de capitão e, sem mais nem menos, foi sendo marginalizado no elenco. 

Ainda encontrou um respiro jogando pelo Lokomotiv Moscou por duas temporadas, mas agora disse basta: "O negócio do futebol se desenvolveu de uma forma brutal. No meu último ano no Schalke, tomei injeções para ficar apto. Não adiantou nada. O novo técnico não quis nem saber. Fui relegado ao ostracismo".

A entrevista que Höwedes deu à revista Der Spiegel revela o que rola nos bastidores do negócio aparentemente brilhante do moderno futebol profissional: "Cansei de ter que me submeter aos treinos diários e à uma competição massacrante por um lugar ao sol no time titular. Para no fim acabar morgando no banco de reservas. Percebi que minha batata estava assando".

Durante suas últimas férias, enquanto dirigia um motor-home rumo ao sul da França, olhou para seu filho de quase dois anos e chegou à conclusão de que "a vida com a família é muito mais importante do que o futebol e se tiver que decidir entre um ou outro, vou decidir pela minha família". Foi exatamente o que fez. 

É uma narrativa muito parecida com a de André Schürrle e também de Per Mertesacker que largou o negócio do futebol em 2018. As histórias de Höwedes, Schürrle, Mertesacker – e, talve,z logo também de Mario Götze – mostram que salários exorbitantes, fama globalizada e todo glamour em torno do futebol profissional não representam uma garantia de vida plena de autorrealização.

Mostram ainda que o futebol, assim como todo o big business que gira ao seu redor, "piorou para pior". É muito marketing, é muita comercialização, é muita compra e venda, é muita grana em jogo. É como bem descreveu o jornalista Peter Ahrens em seu comentário na Spiegel: "É uma goela gananciosa gigantesca cujo único objetivo é manter por tempo indeterminado o atual modelo do negócio”. 

No frigir dos ovos, sobra muito pouco para corações emocionados, para sonhos realizáveis, para um futebol de corpo e alma, porque na próxima esquina esperam propostas irrecusáveis.

É por essas e outras que Benedikt Höwedes coloca um ponto final na sua carreira de jogador de futebol profissional. Vai se dedicar à família e, quem sabe, vez por outra fazer uma visita ao seu clube de origem na bucólica cidade onde nasceu.

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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Desde 2002, atua nos canais ESPN como especialista em futebol alemão. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit sai às terças. Siga-o no TwitterFacebook e no site Bundesliga.com.br

 

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Halbzeit

Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Na coluna Halbzeit, ele comenta os desafios, conquistas e novidades do futebol alemão.