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O avanço da pandemia num reduto dos negacionistas

15 de dezembro de 2020

Muitos se perguntam por que as infecções dispararam no estado alemão da Saxônia. Para uns, culpa é dos negacionistas e da AfD; para outros, da fronteira com a República Tcheca.

Rua comercial deserta em Bautzen, na Saxônia, Alemanha.
Lockdown deixou a rua comercial de Bautzen desertaFoto: Sabine Kinkartz/DW

A pequena cidade de Bautzen, no extremo sudeste da Alemanha, registrou um número dramático de 641 novas infecções por coronavírus por 100 mil habitantes nos últimos sete dias, segundo o Instituto Robert Koch, a agência alemã de controle de doenças.

A média nacional é de 176. Mesmo este já é um número muito alto, e, por causa disso, lojas, escolas e jardins de infância fecharão mais uma vez em todo o país a partir desta quarta-feira (16/12).

Na Saxônia, onde Bautzen está localizada, o lockdown começou dois dias antes por causa do enorme aumento no número de infecções nas últimas semanas.

A Reichenstrasse, a principal rua comercial da cidade, está deserta nesta segunda-feira. Na área de pedestres, a maioria das vitrines tem as luzes apagadas, e apenas algumas pessoas passeiam pelo centro.

Dificuldade em acompanhar as novas restrições

As máscaras, agora, devem ser usadas em todos os espaços públicos. A maioria das pessoas tem obedecido a regra – embora muitas de maneira relutante.

"Eu não concordo muito com isso", diz uma senhora idosa empurrando um andador, de máscara, mas com o nariz descoberto. O lockdown e os regulamentos rígidos são "uma bagunça", disse ela à DW, acrescentando que tem dificuldades em acompanhar as mudanças. "Não sei quem pode visitar quem no Natal. Simplesmente não entendo."

As novas regras são melhor recebidas por outro senhor, este com uma máscara cirúrgica posicionada firmemente em seu rosto. Até pouco tempo atrás, ele não acreditava na ameaça de pandemia, mas sua filha trabalha em um hospital e lhe contou sobre o que se passa por lá. "Desde então, mudei de ideia", diz. "É bom que agora esteja tudo fechado."

Culpa dos negacionistas?

Nenhum dos dois quer arriscar uma explicação para a taxa de infecção da Saxônia estar tão alta, mas há quem veja uma relação com o número particularmente alto de pessoas nesse estado que se recusam a usar máscaras. Muitas delas vão regularmente à Rodovia 96, ao sul de Bautzen, para protestar contra as medidas para conter a pandemia do coronavírus, ao lado de extremistas de direita que agitam bandeiras do Império Alemão.

O relojoeiro Heinz Krahl, de 76 anos, não gosta de usar máscara e a descreve como "uma focinheira humilhante". Ele está entre os que duvidam de quase tudo da pandemia, questionando o número de infecções, o desenvolvimento de vacinas e até a própria existência do vírus.

O relojoeiro Heinz Krahl está entre os céticos do coronavírusFoto: Sabine Kinkartz/DW

"Há muitas coisas acontecendo que são difíceis de entender, e eu realmente tenho que expressar minhas dúvidas", diz Krahl, dono de uma joalheria em Bautzen há mais de 30 anos.

Apesar disso, Krahl incentiva seus clientes a usarem máscaras. "Você está protegendo a si mesmo e a nós de uma multa", diz um bilhete pendurado na porta da frente de sua loja – a palavra multa está destacada em vermelho.

A opinião de que máscaras e distanciamento social são desnecessários é compartilhada pelo partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD), que tem forte presença na Saxônia. Martin Dulig, encarregado de Leste Alemão no Partido Social-Democrata (SPD), diz que a AfD tem parte da culpa nos últimos desdobramentos da pandemia.

Segundo Dulig, o partido populista se tornou "o braço parlamentar dos negacionistas da pandemia". A correlação, acrescenta, é rapidamente demonstrada quando se compara um mapa com os resultados eleitorais da AfD com um que mostre onde estão as maiores taxas de infecções no país.

O prefeito de Bautzen, Alexander Ahrens, discorda que haja uma correlação entre a extrema direita e o aumento das infecçõesFoto: Sabine Kinkartz/DW

Essa teoria provoca indignação no prefeito de Bautzen, Alexander Ahrens, também do SPD. Ele diz que é ridículo e absurdo afirmar que uma pandemia tem correlação com tendências políticas. Em vez disso atribui as altas taxas de infecção na região de Bautzen e na região mineradora do Erzgebirge, que fica mais ao sul, à proximidade com a República Tcheca, onde a taxa de infecção disparou há alguns meses.

"Isso era de se esperar nas regiões de fronteira", diz ele. "Há meses já havíamos dito que, se as fronteiras com a República Tcheca não fossem fechadas, a onda viria para cá porque há muita circulação de pessoas."

Fronteiras abertas

A República Tcheca é um dos países mais afetados pela pandemia na Europa. Cerca de 20 mil tchecos viajam diariamente para a região de Bautzen para trabalhar, e muitas pessoas do sul da Saxônia também vão regularmente para a República Tcheca para fazer compras ou visitar amigos. O mesmo vale para a Saxônia oriental e sua fronteira com a Polônia.

"O contato é muito próximo, o que é desejado, afinal de contas," diz Ahrens. Para ele, ninguém é culpado pelo alto índice de infecções e cabe a todos saber lidar com a situação. "Os hospitais da região estão ficando lotados", alerta. "Em breve, eles atingirão um nível com o qual não poderemos mais lidar."

Sofrimento no comércio

Dada a gravidade da situação, Ahrens diz que a grande maioria dos residentes de Bautzen apoia as novas medidas de bloqueio. Os que são contra, acredita, são uma minoria barulhenta.

"É claro que muitos se perguntam se é realmente justo que os restaurantes e pequenos varejistas que, durante o verão, tanto investiram na implementação de regras de higiene sejam agora também afetados pelo lockdown", acrescenta.

Uma dessas pessoas é Gundolf Hänsel, que abriu um café na Reichenstrasse há pouco menos de um ano. No início de novembro, ele foi forçado a fechar seu negócio por causa do bloqueio parcial. Agora, seu futuro parece incerto.

Gundolf Hänsel tem dúvidas sobre o futuro do café que recém abriu em BautzenFoto: Sabine Kinkartz/DW

Hänsel acredita que seu café não será reaberto antes de março. Olhando para trás, ele acha que o caminho que a Alemanha adotou no fim de outubro – um lockdown parcial em que restaurantes, teatros, cinemas e academias foram forçados a fechar em novembro e dezembro, enquanto lojas, escolas e jardins de infância permaneceram abertos – foi errado e não trouxe benefício algum.

Tentativa e erro

Quando Hänsel conversa com outros varejistas, eles geralmente lamentam a falta de perspectiva e esperança. "Acho que os políticos cometeram muitos erros", avalia.

Ele também acredita que há uma conexão entre as altas taxas de infecção na Saxônia e a proximidade com a República Tcheca e a Polônia. "Devíamos ter agido logo o e fechado as fronteiras", diz. "Os políticos parecem estar em pânico: cada semana decidem algo diferente."

Ahrens diz entender as críticas, mas contra-argumenta. "Se tivéssemos anunciado um bloqueio rigoroso em outubro, quando tínhamos baixas taxas de infecção, isso não teria sido aceito", argumenta. Com uma vacina cada vez mais perto de ser autorizada, ele diz ver luz no fim do túnel.


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