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O Brasil na imprensa alemã (10/08)

10 de agosto de 2022

Periódicos alemães destacam a relação entre Jair Bolsonaro e militares, a prisão de cônsul alemão no Rio após a morte de marido belga e a nova "onda vermelha" na América Latina.

Jair Bolsonaro acena em meio a militares
Periódico alemão questiona se Brasil é forte o suficiente para impedir uma ruptura institucionalFoto: Eraldo Peres/AP/picture alliance

Der Freitag – Tudo depende do Exército (04/08)

Não há espaço neste país para "retrocessos autoritários", dizia uma carta aberta que circulou no fim de junho. Juízes, empresários e músicos se manifestaram numa aliança incomum, e a exigência – de que os resultados das eleições de outubro devem ser absolutamente respeitados – era clara. Em poucos dias, mais de 500 mil brasileiros assinaram o apelo.

Mesmo que nenhum nome fosse mencionado, estava claro a quem a mensagem era direcionada: Jair Bolsonaro. O presidente ultradireitista já anunciou repetidamente sua intenção de contestar a eleição. [...] Bolsonaro diz que "só Deus" pode tirá-lo do cargo, e só pretende aceitar os resultados do pleito se for reeleito. O Brasil é forte o suficiente para impedir uma ruptura institucional?

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Há muitas indicações de que Bolsonaro e o ex-presidente Lula (2003-2011) devem se enfrentar [nestas eleições]. Mesmo que Bolsonaro possa confiar no núcleo sólido de seu eleitorado – ele é adorado por alguns como um semideus –, as pesquisas são tudo, menos, promissoras para ele.

Recentemente, Lula chegou a liderar com uma vantagem de 18%. O melhor patrimônio eleitoral do ex-líder sindical é a atuação desastrosa de Bolsonaro: por causa de sua política ambiental, o Brasil há muito é considerado internacionalmente como um Estado pária. A indiferença na gestão da pandemia de covid-19 também afastou muitos eleitores conservadores. Mais grave é o declínio econômico – o estado de uma economia em queda livre.

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A imagem habilmente construída de Bolsonaro, de homem certinho, também parece rachada e desgastada. Vários ex-ministros estão sendo investigados por corrupção, e consta que ele sabia de acusações de corrupção na compra de vacinas e não interveio. O suposto ícone anti-establishment preferiu ficar com a "velha política". Bolsonaro se opôs veementemente a esta, durante a campanha eleitoral de 2018, mas os parceiros políticos receberam cargos para evitar processos de impeachment.

Apesar de tal saldo, seria prematuro descartar Bolsonaro. Muito vai acontecer antes da eleição: tradicionalmente, o comportamento do eleitor é extremamente volátil, e Bolsonaro se recuperou um pouco nas últimas semanas. [...] O presidente alimenta discursos provocando constantemente conflitos com instituições democráticas, imprensa e adversários políticos. As imagens da invasão do Capitólio, em 2021, podem servir como modelo. Há quem tema até um golpe de Estado clássico.

Será um exagero? As opiniões divergem sobre se os militares vão se envolver num experimento autoritário. Bolsonaro, ele próprio capitão da reserva, não está isento de controvérsias no Exército. Alguns não perdoam suas leviandades de jovem soldado, enquanto outros ficam incomodados com seu tom grosseiro. Mas, especialmente nos escalões mais baixos ele goza de muita simpatia. As Forças Armadas receberam privilégios no governo de direita. Enquanto Bolsonaro fez cortes em quase todas as áreas, o orçamento da Defesa disparou.

Os militares foram poupados de cortes na Reforma da Previdência. Mais de 3 mil deles pertencem à administração estatal, uns 340 ocupam cargos bem remunerados ou mesmo de chefes de ministérios, muitas vezes sem as qualificações necessárias. Mesmo no auge da ditadura, entre 1964 e 1985, não havia essa presença. É duvidoso que esses privilégios sejam cedidos voluntariamente.

Bild – Diplomata é preso ao voltar à cena do crime

Gesticulando e usando luvas de borracha, Uwe Herbert H. está em sua sala num bairro nobre do Rio de Janeiro. Diante da câmera, ele descreve como seu marido teria morrido.

O diplomata alemão ésuspeito de ter matado seu marido belga Walter B. na sexta-feira. Ele mesmo nega o crime, alegando ter sido um acidente após o consumo de bebidas alcoólicas.

A Polícia Civil divulgou o vídeo de seu depoimento na cena do crime. "O senhor pode me dizer o que realmente aconteceu?", pergunta a policial. O homem de 60 anos diz: "Estávamos sentados neste sofá. Acho que ele estava fumando um cigarro."

Ele explica que seu marido se assustou, correu em direção à varanda e caiu – não está claro o motivo. "Ele foi muito rápido. Caiu de bruços." O diplomata continua: "Nos últimos dias, teve vários ataques de pânico. Eu disse: 'Vamos lá, Walter, levanta, você tem que ir para a cama'. E aí eu vi o sangue". Uwe Herbert H. até tirou uma foto, mandou para um amigo e escreveu: "Walter está bêbado de novo."

As autoridades não acreditam nele. "A versão do cônsul contradiz nossas conclusões", diz a porta-voz da polícia do Rio. Segundo o médico legista Nelson Massini, os ferimentos do morto apontam para práticas sexuais sadomasoquistas. A autópsia revelou mais de 30 ferimentos. O Consulado da Alemanha no Rio de Janeiro solicitou a libertação de seu diplomata, mas uma juíza negou o pedido ontem.

FAZ – A nova onda vermelha (07/08)

Houve uma grande surpresa quando o político de esquerda e ex-guerrilheiro Gustavo Petro venceu as eleições presidenciais na Colômbia, em junho, contra um candidato populista de direita. Numa Colômbia tradicionalmente conservadora – onde inúmeros jornalistas, ativistas e políticos de esquerda foram mortos por grupos paramilitares de direita nas últimas décadas e onde mais da metade da população rejeitou um processo de paz com os ex-guerrilheiros das Farc em 2016 – era quase inimaginável um ex-guerrilheiro ser eleito para o cargo mais alto do país. Mas aconteceu. Petro será o primeiro presidente de esquerda na história da Colômbia.

Além disso, a vitória de Petro parece confirmar uma tendência que vem ocorrendo além das fronteiras da Colômbia há algum tempo, ou seja, uma virada à esquerdana política de diversos países latino-americanos. Nos últimos quatro anos, candidatos de esquerda venceram as eleições presidenciais no México, Argentina, Peru e Chile, e agora a Colômbia se junta ao grupo. E em outubro, no Brasil, o ex-sindicalista Lula – que foi presidente entre 2003 e 2011 – poderá vencer as eleições contra Jair Bolsonaro.

Bolsonaro é notório em todo o mundo por suas declarações antidemocráticas, racistas, misóginas e por sua indiferença ao desmatamento da Floresta Amazônica. Se Lula vencer – as pesquisas indicam que as chances são boas –, os seis países da América Latina maiores e economicamente mais fortes teriam chefes de Estado com uma agenda de esquerda. Diante desse quadro, vários meios de comunicação internacionais já falam de um "continente vermelho", uma "nova esquerda" e uma "onda progressista" na América Latina.

Não é a primeira vez nas últimas décadas que o panorama político da América Latina é descrito com termos semelhantes. Num continente cuja história repetidamente dá a impressão de ser cíclica – presa entre desigualdade, corrupção e crises sociais e econômicas, grandes promessas de políticos messiânicos, fases intermediárias de modernização e depois a persistência de velhos problemas –, a tendência atual lembra os primeiros anos deste século.

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Os governos de esquerda no início do século eram muito diferentes. No entanto, compartilhavam uma força motriz: eles aproveitaram a demanda internacional por matérias-primas liderada pela China.

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Hoje a situação é completamente diferente. Nos últimos anos, o estado social e econômico de toda a América Latina deteriorou-se significativamente, especialmente para as classes baixa e média. Isso levou a uma grave agitação social em várias cidades, em 2019, brutalmente repelida pelos respectivos governos conservadores em países como Colômbia e Chile. A pandemia de covid-19 apenas piorou a desigualdade social.

Portanto desta vez a força motriz da esquerda pode ter sido a grande decepção: muitos latino-americanos possivelmente não viram nos candidatos de direita uma alternativa à situação que vivenciaram em seu passado recente.

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