Meios de comunicação do país destacam nesta semana o escândalo de corrupção da construtora Odebrecht, que se espalha pela América Latina, e a situação das instalações olímpicas no Rio de Janeiro.
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O Brasil voltou a ser destaque na imprensa alemã nos últimos dias. O site de notícias Spiegel Online publicou uma longa reportagem sobre o escândalo de corrupção da construtora Odebrecht, que atinge políticos de vários países da América do Sul.
Já o diário Süddeutsche Zeitung, de Munique, dedicou três páginas da sua edição de fim de semana ao legado dos Jogos Olímpicos. O jornal compara as expectativas em relação ao uso futuro das obras com a situação atual, tomando como ponto de partida o abandono do estádio do Maracanã.
O jornal berlinense Der Tagesspiegel publicou uma crítica do filme Joaquim, de Marcelo Gomes. Depois de elogiar "O homem das multidões", um filme anterior do diretor brasileiro, o jornal afirma que, a Joaquim, falta tudo aquilo que distinguia "O homem das multidões".
Spiegel Online: Presos na rede do príncipe brasileiro, 15.02.2017
"Da Argentina até o México, um escândalo gigantesco de corrupção estremece a América Latina. A construtora Odebrecht teria subornado atuais e antigos presidentes. (...) Eles o chamam de príncipe. Mas Marcelo Odebrecht, de 49 anos, não é nenhum fã de pompa e circunstância. Ele é um asceta, não bebe álcool e é considerado um workaholic. (...) Como uma aranha, Odebrecht estava sentado numa rede de contas secretas, empresas de fachada e doleiros que a construtora teceu sobre toda a América do Sul. Ele puxava os fios que levavam aos poderosos – e os depoimentos de seus diretores estremecem todo o subcontinente. (...) Ele era chamado de 'príncipe' por ser o filho favorito e sucessor do patriarca Emilio Odebrecht. Mas 'príncipe' também era adequado a esse homem discreto porque deputados, ministros e presidentes se inclinavam perante ele como cortesãos."
Süddeutsche Zeitung: As ruínas do Rio, 18.02.2017
"No verão [europeu], o mundo celebrou uma festa esportiva estonteante às margens de Copacabana. Desde então, muito foi destruído. Também por isso, cada vez mais pessoas dizem não aos Jogos Olímpicos, como aconteceu, por último, na Suíça. (...) Quem conhece histórias como essa [refere-se à despedida de Zico no Maracanã], deve ter ficado sentido com as imagens que foram vistas esta semana, do Rio meio ano depois dos Jogos Olímpicos de 2016: Arenas esportivas apodrecendo (...) O estádio aquático com seu revestimento em farrapos. O campo de golfe que parece a superfície enrugada de um planeta até então desconhecido. E o Maracanã. (...) Assentos arrancados por vândalos e amontoados nas catacumbas por funcionários. Placas indicativas que viraram entulho. O gramado como um tapete ralado."
Der Tagesspiegel: Crítica do filme Joaquim, 17.02.2017
"Só depois de eles abandonarem tentativas vãs [de encontrar ouro], Joaquim se torna um revolucionário, e não se fica sabendo exatamente por quê. O diretor brasileiro Marcelo Gomes, que há três anos participou da Panorama com o maravilhoso e esteticamente ambicioso filme urbano O homem das multidões, que ele realizou junto com o artista plástico Cao Guimarães, assina Joaquim. Mas neste filme falta tudo aquilo que distinguia O homem das multidões: uma concepção clara, enfoques cuidadosamente elaborados, atores minimalistas e sobretudo uma história.
Pode ser que Gomes quisesse contar algo sobre as minorias étnicas no Brasil e os movimentos migratórios, sobre a exploração econômica do país pelos senhores coloniais e a sociedade de classes e patriarcal dos colonizadores, sobre a brutal ausência de lei da vida na colônia, onde todo tipo de aventureiro seguia a própria cobiça. Mas então ele deveria ter contado isso."
AS/ots
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.