Inaugurado em 1907, em Berlim, o Moviemento sobreviveu a muitas transformações ao longo de sua história. Frequentado por David Bowie, Iggy Pop e Tom Tykwer, o cinema agora está ameaçado pela especulação imobiliária.
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Os processos de digitalização e modernização vieram numa velocidade acelerada e atingiram em cheio a indústria cinematográfica. Lembro-me de quando criança no Brasil costumava ir a cinemas grandes de rua construídos no centro da cidade, mas já na minha adolescência esses locais sucumbiram e deram lugar a salas padronizadas de shoppings. Praticamente do dia para noite, a comodidade acabou matando uma tradição surgida há décadas.
Aqui em Berlim, sem o avanço de shoppings, ainda restam muitos cinemas de rua, 91 ao todo, inclusive o mais antigo dos 1.672 cinemas em funcionamento na Alemanha, inaugurado em 1907, na rua Kottbusser Damm.
O cinema Moviemento sobreviveu a transformações da indústria cinematográfica com muita história para contar. Com três diferentes salas, que possuem entre 60 e pouco mais de 100 lugares, o local está longe de ser um cinema moderno, como estamos acostumados no Brasil, mas tem seu charme. A recepção é decorada com cartaz de filmes exibidos ali e, além de pipocas, os visitantes podem também comprar cerveja para beber durante a sessão.
Nos seus 112 anos, o Moviemento já teve diversos nomes e donos. Passou ainda por várias reformas. Foi frequentado por lendas da música, como David Bowie, Iggy Pop e Nina Hagen. Na década de 1980, o hoje diretor de cinema Tom Tykwer trabalhou no local como projecionista e, posteriormente, foi responsável pela programação do espaço.
Às vésperas de completar 100 anos, o cinema ia mal das pernas, correndo o risco de fechar suas portas. Foi quando Iris Praefke e Wulf Sörgel assumiram o local. Após uma reforma, reabriram o Moviemento em março de 2007. O casal conseguiu salvar o antigo cinema e, em menos de 10 anos, mais do que quintuplicar o número de espectadores, passando dos 16 mil em para 86 mil em 2016.
O local passou a exibir filmes para todas as idades e em diversos horários, com sessões matinais e vespertinas para grupos escolares. Passou também a receber festivais, inclusive um evento tradicional do cinema pornô.
Tudo parecia indo bem até outubro, quando Praefke e Sörgel receberam a notícia de que o proprietário do imóvel, a Deutsche Wohnen – uma empresa que possui 114 mil apartamentos na cidade e péssima reputação –, colocou o espaço à venda por 2 milhões de euros. O casal teme, e com razão, que, ao mudar de mãos, o aluguel deverá subir consideravelmente, inviabilizando a continuidade do cinema.
Para tentar salvar o cinema mais antigo da Alemanha, Praefke e Sörgel resolveram tentar comprar o espaço e, com ajuda de amigos, já arrecadaram 400 mil euros. Eles criaram ainda uma campanha de financiamento coletivo para reunir o valor restante.
Um dos defensores mais famosos do Moviemento, o diretor Tom Tykwer criticou a transformação econômica que está acabando com a vida característica e a identidade de Berlim. “Estamos destruindo a cidade assim”, destacou, em entrevista a uma emissora de rádio local.
Os donos do Moviemento esperam chegar a um acordo com a Deutsche Wohnen e acreditam que a empresa de capital aberto do setor imobiliário não vai querer entrar para a história como aquela que destruiu o cinema mais antigo da Alemanha. A gigante do setor tem se recusado a falar sobre o tema.
Hoje com 112 anos, o Moviemento está novamente ameaçado e sua sobrevivência depende muito, infelizmente, de uma empresa que tem contribuído em peso para a especulação imobiliária que está tornando os preços dos aluguéis em Berlim impagáveis.
Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.
Alguns são nomes consagrados do expressionismo alemão, muitos fugiram do país após a ascensão do nazismo e outros se firmaram em Hollywood. Conheça alguns dos diretores que marcaram o início da sétima arte na Alemanha.
Foto: ullstein bild
Fritz Lang (1890-1976)
Nascido em Viena, o cineasta é um dos nomes mais importantes dos primórdios do cinema alemão. Diretor de clássicos como "Metrópolis", considerado o precursor dos filmes de ficção científica, "Dr. Mabuse" e "M, o vampiro de Düsseldorf", entre outros, Lang criou personagens caricatas que mais tarde se tornariam realidade na política nazista. Sua estética inspirou muitos nomes do cinema no mundo.
Foto: ullstein bild
Lotte Reiniger (1899-1981)
Autora, entre outros, do primeiro longa-metragem de animação da história do cinema ("As aventuras do Príncipe Ahmed", 66 minutos), a diretora berlinense é admirada pela precisão com a qual esboçava suas figuras. Fã confessa da dança e do teatro, recorreu com frequência aos contos de fadas, mitos e libretos de ópera para realizar seus filmes. É a grande pioneira do cinema de animação na Alemanha.
Foto: picture-alliance / KPA/TopFoto
Friedrich Wilhelm Murnau (1888-1931)
Autor do clássico "Nosferatu", que popularizou os filmes de vampiro, Murnau dirigiu longas que antecipariam nas telas os horrores da Segunda Guerra. Em "Fausto", o diabo Mefisto quer dominar o mundo e corrompe a alma de um professor. Filme de contrastes fortes, típicos do expressionismo alemão, é admirado até hoje por sua precisão estética. Murnau deixou a Alemanha antes da ascensão do nazismo.
Foto: Friedrich Wilhelm Murnau Stiftung
Ernst Lubitsch (1892-1947)
Considerado mestre das comédias, Lubitsch trabalhou com grandes atores e atrizes de seu tempo, como Marlene Dietrich e Greta Garbo. Admirado posteriormente por nomes como Orson Welles e Alfred Hitchcock, era um dos poucos diretores capazes de entusiasmar público e crítica ao mesmo tempo. Um dos primeiros estrangeiros respeitados em Hollywood, realizou em torno de 70 filmes.
Georg Wilhelm Pabst (1885-1967)
Cineasta controverso por ter continuado a trabalhar na Alemanha durante o nazismo, G.W. Pabst foi importante para o cinema da República de Weimar. Além de "Segredos de uma Alma", sobre obsessão e fobia, realizado com apoio de psicanalistas, adaptou "A ópera dos três vinténs", de Bertolt Brecht. O filme resultou em um processo movido por Brecht, avesso a ver sua obra "transformada em mercadoria".
Foto: picture-alliance /
Walter Ruttmann (1887-1941)
Diretor do clássico "Sinfonia de uma metrópole", filme de 1927 tem Berlim como protagonista (em 2002, foi rodado um remake dirigido por Thomas Schadt). O filme, que documenta o cotidiano da cidade durante um dia, é considerado obra pioneira do documentário – gênero ainda não categorizado como tal nos anos 1920. Ruttmann concentrava-se em apresentar, de maneira abstrata, o movimento na tela.
Foto: picture-alliance/akg-images
Robert Wiene (1873-1938)
É o diretor de "O gabinete do Doutor Caligari" (1920), obra prima do expressionismo alemão e um dos primeiros filmes produzidos em estúdio. Construído como um delírio projetado na tela, o longa-metragem questiona o conceito de "normal", tendo se tornado obra obrigatória para qualquer cinéfilo. Suas imagens distorcidas e o uso da luz expõem os efeitos do autoritarismo e da tirania entre as massas.
Foto: picture-alliance
Leni Riefenstahl (1902-2003)
A mais controversa entre as cineastas alemãs foi a diretora predileta de Hitler e colocou sua produção a serviço do nazismo. Diretora de sete filmes, passou anos no ostracismo até ser "redescoberta" por especialistas que dissociam seus filmes do contexto político para analisá-los apenas como expressões estéticas – postura vista como inviável por outras correntes de pensamento.
Foto: Presse
Max Ophüls (1902-1957)
O franco-alemão Max Ophüls começou sua carreira na década de 1920. Mais tarde, mudou-se para Hollywood, onde fez quatro filmes antes de retornar à Alemanha. Hoje, dá nome a uma das principais premiações de cinema do país. Nascido no Sarre, chamava-se de fato Max Oppenheimer. O belo "Carta de uma desconhecida" foi seu filme mais elogiado, admirado entre outros pelo cineasta americano Joseph Losey.
Foto: imago/United Archives
Billy Wilder (1906-2002)
Nascido na Polônia, cresceu Viena e mudou-se em 1929 para Berlim, de onde fugiu em 1933, com a ascensão do nazismo, devido à origem judaica. Vários de seus parentes, inclusive sua mãe, foram assassinados em Auschwitz. Cineasta alemão mais premiado em Hollywood, recebeu seis Oscars e foi indicado 21 vezes para o prêmio. Entre seus filmes estão "O pecado mora ao lado" e "Quanto mais quente melhor".