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O controverso plano turco de converter monumento em mesquita

Pelin Ünker | Daniel Derya Bellut md
2 de julho de 2020

Erdogan pressiona para que Hagia Sophia, um dos cartões-postais de Istambul, deixe de ser um museu. Com medida, presidente tenta reconquistar popularidade perdida entre eleitores de tendência nacionalista-islâmica.

A Hagia Sofia, com seus quatro minaretes
Hagia Sophia, ou Basílica de Santa Sofia, serviu a duas religiões mundiais por 1.500 anosFoto: DW/D. Dedovic

A antiga basílica de Santa Sofia, também conhecida como Hagia Sophia, não é apenas o marco de Istambul, mas também a atração turística mais popular da Turquia. A enorme cúpula e os elaborados afrescos em seu interior atraem milhões de visitantes todos os anos e renderam ao edifício o status de Patrimônio Mundial da Unesco.

Mas Hagia Sophia é mais do que apenas uma obra-prima arquitetônica – sempre foi um símbolo político. O edifício monumental foi erguido no século 6 pelo imperador bizantino Justiniano. Quando os otomanos conquistaram Constantinopla, em 1453, o sultão Mehmed 2° rapidamente transformou a igreja em uma mesquita.

O fundador da República Turca, Mustafa Kemal Atatürk, também usou a igreja para um ato de grande importância simbólica: em 1935, transformou a Hagia Sophia em um museu. "A Turquia moderna é um país secular", era a mensagem que queria se passar na época.

Agora, o atual presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, quer explorar simbolicamente o edifício, situado no bairro de Fatih. Para muitos de seus eleitores de tendência nacionalista-islâmica, a Hagia Sophia é um símbolo da conquista da Constantinopla cristã pelos otomanos e da superioridade do mundo islâmico.

O sonho de uma mesquita

O chefe de Estado agora faz tudo para reverter a decisão de Atatürk. A Hagia Sophia deve, segundo ele, se tornar novamente acessível a serviços religiosos islâmicos.

Discussões ocorreram repetidas vezes na Turquia sobre a conversão do prédio em uma mesquita – mas desta vez os planos estão assumindo contornos claro: nesta quinta-feira (02/07), o Conselho de Estado – maior tribunal administrativo turco – anunciou, após uma curta audiência, que tomará uma decisão sobre o assunto dentro de 15 dias. A corte avalia a legalidade do decreto de Atatürk, que transformou a Hagia Sophia em museu nos anos 30.

Imagem da Virgem Maria ladeada por símbolos muçulmanos no interior da Hagia SophiaFoto: Bulent Kilic/AFP/Getty Images

A iniciativa, promovida pelo partido de Erdogan, o Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), é acompanhada de uma retórica nacionalista. "A Hagia Sophia é nossa posse geográfica. Quem a conquistou com a espada também tem direitos de propriedade", argumentou o vice-presidente do AKP, Numan Kurtulmus. "A Hagia Sophia faz parte de nossa soberania."

O partido governista está certo da vitória: na última segunda-feira, em comemoração ao 567° aniversário da conquista de Constantinopla, a legenda levou um imã para ler trechos do Alcorão na Hagia Sophia. Alguns especularam se a decisão já teria sido tomada e, por isso, já estariam sendo realizados os primeiros preparativos.

Um ato simbólico que divide

Na realidade, a iniciativa de Erdogan tem como objetivo levar o eleitorado turco novamente ao AKP. Segundo pesquisas recentes, o partido claramente perdeu popularidade. Por esse motivo, o presidente vem tentando repetidamente nos últimos meses gerar sentimentos nacionalistas.

Mas essa tentativa agora pode abrir novas trincheiras entre a população. O patriarca Bartolomeu de Constantinopla, chefe da Igreja Ortodoxa, se disse estritamente contra a conversão de Hagia Sophia em uma mesquita. "A Hagia é um dos monumentos mais importantes da civilização humana e pertence não apenas aos seus proprietários imediatos, mas a toda a humanidade", disse, durante uma missa em Istambul.

Nikolas Uzunoglu, presidente da Federação dos Turcos Descendentes de Gregos, também disse à DW que acha errado que Hagia Sophia se torne um ponto político de discórdia. O edifício, segundo ele, representa a paz entre religiões e civilizações. "Declarações que falam de 'conquista da Hagia Sophia pela espada' devem ser motivo de preocupação para toda a nossa sociedade", afirma Uzunoglu.

Monumento também é lugar de adoração de fiéis ortodoxosFoto: Mustafa Ozer/AFP/Getty Images

"Sem justificativa religiosa"

O mundo acadêmico também está preocupado com a possível transformação do museu. "O edifício serviu a duas religiões mundiais por 1.500 anos sem que sua arquitetura tivesse que ser fundamentalmente modificada", sublinha o historiador Edhem Eldem, da Universidade Bogaziçi, em Istambul.

"Existem apenas alguns desse tipo de edifício em todo o mundo. E eles precisam ser protegidos", ressalta, acrescentando que a Hagia Sophia também representa uma herança humana universal e comum. "Queremos isolar e ocultar esse legado – ou é melhor não apresentá-lo ao mundo inteiro?", questiona Eldem.

O teólogo Ihsan Eliacik tem opinião semelhante. Para ele, não há justificativa religiosa para essa medida. "'Um direito pela espada' não tem lugar no Alcorão. A incorporação violenta de locais culturais é proibida", destaca. "A Hagia Sophia é um símbolo de paz entre o mundo islâmico e o cristão."

As críticas não ficam só na Turquia. Nesta quinta-feira, o Ministério do Exterior da França defendeu que o monumento seja mantido como um museu. "Símbolo de tolerância e diversidade, este lugar deve permanecer aberto a todos", disse um porta-voz.

São objeções que parecem não interessar muito ao presidente turco. Recentemente ele disse, em relação à comunidade ortodoxa grega na Turquia: "Vocês nos dizem: 'Por favor, não transformem Hagia Sophia em uma mesquita.' Você acha que a Turquia precisa se curvar à vontade de vocês? Estamos aguardando a decisão do Conselho de Estado. Depois, as medidas necessárias serão tomadas."

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