O dia em que refugiados lotaram a pequena Nickelsdorf
Alison Langley (cn), da Áustria15 de setembro de 2015
Milhares de migrantes chegaram em apenas um dia à cidade austríaca na fronteira com a Hungria, com 1,6 mil habitantes. Apesar de esforços de voluntários, situação era precária, relata o repórter da DW Alison Langley.
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Há mais de uma semana, o austríaco Karl Wendelin percorre com sua bicicleta Nickelsdorf, na fronteira da Áustria com a Hungria, registrando com sua câmera a situação de refugiados alojados em abrigos temporários na região. Mas nesta segunda-feira (14/09), ele ficou sem palavras.
Havia gente a perder de vista – muitas crianças, mulheres grávidas, pessoas com dificuldades de locomoção, apoiando-se em parentes, e muitos carregando bebês de colo. A polícia já havia perdido a conta de quantos refugiados estavam abrigados na cidade, com cerca de 1,6 mil habitantes. Podiam ser 10 mil ou até mais.
As bananas distribuídas por voluntários da Cruz Vermelha não conseguiam afastar a exaustão evidenciada pelas olheiras nos rostos dos migrantes. A chuva persistente já não importava mais, nem o concreto oleoso na fronteira, onde caminhões costumavam ser parados para o controle aduaneiro.
Os migrantes enrolavam-se em cobertores e usavam como travesseiro a sacola plástica onde guardaram todos os bens que lhes restam. Famílias dormiam encolhidas, e mães amamentavam bebês sentadas sobre o chão de concreto.
Somente nesta segunda-feira, milhares de refugiados chegaram a Nickelsdorf. Era impossível estimar o número exato, pois, enquanto algumas famílias paravam para comer, para as crianças brincarem ou para procurar roupas limpas para vestir, outras seguiam adiante. Seus pés sangravam com bolhas, mas o corpo estava cansado demais para sentir qualquer dor.
Marcha em direção à Viena
Milhares haviam caminhado desde Hegyeshalim, a quatro quilômetros da fronteira, e continuavam a jornada a pé. Eles passaram, provavelmente, por um estacionamento com dezenas de ônibus de linha parados, pois não os motoristas não têm para onde levá-los.
Pouco antes, centenas de refugiados haviam tentado cruzar uma barreira policial, gritando, bebês choravam, uma mulher se agarrava à camisa do homem à sua frente para manter o equilíbrio. Eles desejavam chegar um a estacionamento vazio, pois havia rumores de que um ônibus partiria de lá para Viena.
Milhares de pessoas caminhavam ao longo da rodovia B10, e várias famílias iam em direção à A4, onde um grupo de jovens estava sentado embaixo de uma passagem subterrânea para fugir da chuva. Apenas poucos carros passavam pelos pedestres, devido ao congestionamento quilométrico provocado pelo restabelecimento do controle de fronteira.
Aqueles que caminhavam rumo a Nickelsdorf faziam uma pausa num posto onde bananas e chá eram distribuídos. Eles se encostavam em cercas cheias de rosas. Atrás dos jardins, havia casas simples com gramados aparados, como a que o jovem pai de família Raby Abbesi deseja ter um dia.
Outros tiveram a sorte de conseguir carona com um dos taxistas que foram a Nickelsdorf para ganhar um trocado extra. Embora as companhias de táxi tenham sido alertadas sobre preços superfaturados, muitos motoristas cobravam 450 euros pelo trecho até Viena. A corrida, normalmente, sairia por 170 euros. Alguns voluntários ofereciam carona de graça.
Aos gritos no telefone, o prefeito de Nickelsdorf, Gerard Zapfl, afirmou que isso era a pior coisa que ele já havia visto. "Não há planos, não há informações, nada", disse.
Vindo da cidade síria de Homs, Sabah Jalal, cuja casa foi destruída num bombardeio, disse já ter presenciado situações muito piores.
Estações da fuga em imagens
Cerca de 3,7 mil quilômetros separam a Alemanha da Síria. Para os refugiados da guerra civil, essa viagem dura semanas até meses. E ela é perigosa, também na rota dos Bálcãs.
Foto: picture-alliance/dpa/N. Armer
Últimas forças
Duma é uma cidade síria a nordeste de Damasco. Mesmo ferido, um homem procura por sobreviventes nos escombros. Pouco antes, a região foi atacada por bombardeios das forças armadas sírias. Desde o início da guerra civil, em 2011, mais de 250 mil pessoas morreram no país, segundo as Nações Unidas.
Foto: picture-alliance/A.A./M. Rashed
Terror ao alcance dos olhos
No campo de refugiados em Suruc, na Turquia, cerca de 40 mil sírios procuraram refúgio da guerra civil. A poucos quilômetros dali, em Kobane, o conflito continua. O campo é organizado como uma pequena cidade, com mesquita, escola e ruas. Ninguém quer permanecer aqui por muito tempo.
Foto: Getty Images/C. Court
Marcas da guerra
Abdurrahman Yaser al-Saad conseguiu chegar à cidade portuária turca de Izmir. O sírio de 16 anos mostra aos outros refugiados uma cicatriz enorme na barriga. Ele estava na escola quando as forças armadas sírias bombardearam o local e ele ficou gravemente ferido.
Foto: picture-alliance/AA/E. Menguarslan
Esperança de uma vida melhor
Na viagem em direção à Europa, muitos refugiados acabam em Izmir. Daqui eles desejam ir para a Grécia. Coletes salva-vidas são fundamentais, pois muitos não sabem nadas, e os barcos dos atravessadores ficam superlotados. Enquanto aguardam a partida, muitos dormem ao ar livre, porque não podem pagar um hotel.
Foto: picture-alliance/AA/E. Atalay
Jogado de volta
Com suas últimas forças, esse refugiado conseguiu nadar de volta até a praia de Bodrum, na Turquia. Pouco antes ele havia tentado alcançar um barco de atravessadores, que, por muito dinheiro, levam as pessoas ilegalmente até a Grécia. As embarcações estão sempre superlotadas.
Foto: Getty Images/AFP/B. Kilic
Desamparo
Na praia de Kos, uma ilha grega, turistas observam como refugiados tentam chegar à costa com um barco inflável. A viagem ilegal de Bodrum até aqui custa cerca de mil euros por pessoa. São apenas quatro quilômetros de distância, mas muitos não sabem nadar e acabam morrendo afogados.
Foto: picture-alliance/dpa/Y. Kolesidis
Realidade incômoda
No caminho para o hotel ou para a praia, turistas passam por muitos refugiados. Devem olhar? Devem ajudar?
Foto: picture-alliance/AA/G. Balci
Com braços e pernas
Da Grécia, muitos refugiados tentam chegar à Europa ocidental pelos Bálcãs. Uma estação importante é a cidade de Gevgelija, na Macedônia. Depois de dias de espera, todos desejam conseguir um lugar em um trem para a Sérvia.
Foto: picture-alliance/dpa/G. Licovski
Passo a passo
Já nas primeiras horas do dia, centenas de refugiados caminham ao longo da linha do trem, da Sérvia para a Hungria. De lá, muitos desejam ir para a Áustria ou Alemanha. A caminhada de quilômetros exige de muitos suas últimas forças.
Foto: Getty Images/AFP/A. Messinis
Desespero
Com medo de ser levado para um campo de refugiados na Hungria, o pai sírio se joga, com sua mulher e filho, nos trilhos da estação de Bicske. Eles achavam que o trem os levaria de Budapeste até Viena. Em vez disso, eles devem ser registrados pelas autoridades húngaras.
Foto: Reuters/L. Balogh
Quase lá
Centenas de refugiados do Iraque, da Síria e do Afeganistão decidiram ir a pé até a Áustria, caminhando pela rodovia. Eles esperaram durante dias por um trem na estação de Budapeste. A polícia, porém, bloqueia o trecho com frequência.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Roessler
Finalmente a chegada
Estação central de Munique: a esperança de muitos refugiados está na chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel. Diferente de outros países europeus, eles se sentem bem-vindos na Alemanha.