Mexicanos que emigraram para os EUA e retornam ao país natal não recebem qualquer apoio do governo. Se programa de proteção dos "dreamers" acabar, situação poderá se tornar caótica.
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De operária de fábrica ilegal nos Estados Unidos a fundadora de uma startup na Cidade do México: à primeira vista, a carreira profissional de Ana Laura López, de 42 anos, parece ser uma história de sucesso bastante comum.
Todas as semanas, ela recebe repatriados mexicanos vindos do norte no café que acaba de inaugurar, bem próximo ao aeroporto Benito Juárez. López é gestora da organização de autoajuda Deportados unidos en la lucha (Deportados unidos na luta) e, com outros repatriados, opera a gráfica Deportados Brand, na qual são produzidas camisetas – muito procuradas – com estampas anti-Trump.
Só que López não retornou de livre vontade. Ela foi deportada depois de 15 anos nos Estados Unidos e teve que recomeçar do nada a vida em seu país de origem. A empresária foi bem-sucedida, mas histórias de sucesso como a dela poderão se tornar exceção num futuro próximo, pois o México está completamente sobrecarregado com a reintegração dos repatriados.
Deportados e recusados
A situação poderá se tornar caótica se o programa para a proteção dos chamados dreamers(jovens imigrantes ilegais levados para os EUA quando crianças) realmente expirar em 5 de março, pois não há um programa nacional de reintegração na sociedade mexicana para centenas de milhares de repatriados.
"Não dá para perdoar o governo mexicano por fazer tão pouco por aqueles que retornam ao país", afirma Luicy Pedrosa, pesquisadora sobre imigração no Instituto Giga para a América Latina, com sede em Hamburgo. Segundo ela, o assunto não é novo, já que, desde 2008, cerca de 300 mil mexicanos são deportados anualmente.
Pobreza no próprio país
"Um motivo pelo qual o Estado faz tão pouco pelos repatriados é a pobreza", suspeita Pedrosa. "Não se pode dizer aos 40 milhões de mexicanos que vivem abaixo da linha da pobreza que 'agora vamos fazer mais por aqueles que voltam ao país e nada mais por vocês'", explica.
O apoio aos repatriados mexicanos se restringe a estandes adicionais de informação em aeroportos e terminais rodoviários, onde aqueles que chegam podem esclarecer as primeiras dúvidas organizacionais. Além disso, há programas que preveem apoio financeiro para continuar a viagem para a cidade de origem, bem como um primeiro aprovisionamento com comida e bebida.
"Isso não é reintegração", diz Pedrosa. Ela afirma que especialmente os dreamers sofrem com a discriminação no seu novo lar – que, apesar da origem, lhes é distante. "Eles falam inglês perfeitamente, mas não falam espanhol tão bem. Como não possuem contatos sociais, de amizade ou familiares no México, não se sentem em casa", descreve.
Mão de obra especializada
Há um ano, o Senado mexicano aprovou a chamada "Iniciativa Monarca", voltada especialmente aos dreamers. O nome foi inspirado numa borboleta ameaçada de extinção no México e que, anualmente, voa de volta ao país a partir do Canadá. Um objetivo da iniciativa: reforçar o atendimento a migrantes de formação profissional sólida nos consulados mexicanos nos Estados Unidos, avaliando assim as chances que eles têm no mercado de trabalho mexicano.
Mas, durante um evento de informação do consulado mexicano de Los Angeles, ficou claro que o que falta, na realidade, é apoio de base: os migrantes mexicanos pediram menos burocracia, taxas consulares mais baixas para a emissão dos documentos necessários, apoio jurídico e mais facilidade na viagem e no transporte de retorno ao México.
"Realmente, há muito pouco apoio para os repatriados", confirma López, que foi deportada no dia 30 de setembro de 2016. "Os que voltam precisam de um plano de saúde, um abrigo e ajuda para criar uma empresa, por exemplo", relata.
O exemplo da Cidade do México
López teve suas necessidades atendidas porque procurou a ajuda de Amalia García Medina. A Secretária do Trabalho do governo regional da Cidade do México é uma das políticas de esquerda mais conhecidas do país e apoia os deportados com contatos, programas de treinamento e pequenas ajudas financeiras.
Mas apenas 500 repatriados participam do programa de Medina – um número ínfimo se comparado aos 300 mil mexicanos que voltam ao país anualmente. A secretaria tem 16 escritórios na capital mexicana, com um orçamento que, segundo a imprensa local, totaliza cerca cerca de 550 milhões de pesos mexicanos (86 milhões de reais).
"É muito difícil voltar e encontrar um país que, infelizmente, pouco mudou", disse López à rede de TV Bloomberg do México. "De uma hora para outra, pequenas coisas que se acreditava serem óbvias desaparecem: uma cama, uma xícara de café, uma geladeira ou um travesseiro."
Mas o que mais a faz sofrer é a distância dos filhos. "É cruel como as famílias são dilaceradas", constata. Para ela, o único consolo é que os deportados ao México se unem e tentam tomar as rédeas do próprio destino. "Lutamos para que o México se torne um país do qual as pessoas não tenham mais que emigrar", diz López.
Filmes sobre a fronteira entre EUA e México
Em seu mandato, o ex-presidente americano Donald Trump prometeu construir um muro entre EUA e México. Mas, muito antes disso, esta fronteira já havia sido foco de filmes espetaculares. Veja a lista.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
John Wayne em guerra
Em meados do século 19, EUA e México entraram em guerra sobre o estado do Texas, que pertencia aos mexicanos, mas foi anexado pelos americanos. A longa disputa foi muitas vezes retratada por Hollywood nos faroestes que detalhavam os violentos conflitos entre colonos americanos e o Exército mexicano. Entre os mais espetaculares está "Álamo" (1960), estrelado por John Wayne e Richard Widmark.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
Dietrich e a fronteira
Em 1958, Marlene Dietrich fez uma breve aparição no brilhante suspense "A marca da maldade". O diretor Orson Welles, que teve o papel principal no filme, fez da região fronteiriça entre México e EUA o cenário para falar sobre corrupção, tráfico de drogas e outros crimes.
Foto: picture-alliance/United Archives/IFTN
"Rio Bravo"
Quando John Wayne apareceu em "Álamo", a grande era do faroeste americano estava quase no fim. Mas, quando o gênero cresceu na década de 1950, muitos faroestes se passaram na fronteira entre Texas, Novo México e Arizona de um lado, e o México, do outro. Um marco simbólico era o rio Grande que, localizado nesta fronteira, rendeu o título do legendário filme do diretor John Ford, de 1950.
Foto: picture-alliance/Mary Evans Picture Library
A fronteira em faroestes posteriores
No entanto, a fronteira entre os dois países conseguiu manter sua importância em numerosos faroestes lançados posteriormente. A região desempenhou um papel de destaque em "Meu ódio será tua herança" (1969), do diretor Sam Peckinpah, um épico do faroeste selvagem com muito sangue e que enfoca a ilegalidade em uma terra esquecida.
Foto: Imago/Entertainment Pictures
Variações modernas
O diretor americano Robert Anthony Rodriguez tem uma paixão pela região de fronteira, o que talvez se deva às suas raízes mexicanas. Muitos de seus filmes reproduzem o choque de culturas nesta região fronteiriça. Seu filme "Um drink no inferno", de 1996, viu Quentin Tarantino e George Clooney encenando irmãos que roubam bancos e que tentam fugir para o México.
Foto: picture-alliance/United Archives
Não há lugar para envelhecer
Ganhador de vários Oscars em 2008, entre eles o de melhor filme e direção, "Onde os fracos não têm vez" foi dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen. A produção aborda as drogas, máfia, assassinatos e fraudes. O filme se passa na fronteira entre EUA e México – um lugar perigoso, onde a morte é comum e poucos envelhecem.
Foto: picture-alliance/dpa/Paramount Pictures
Ao sul de Albuquerque
Albuquerque, no Novo México, é o cenário da extremamente popular série de televisão "Breaking Bad", que foi produzida entre 2008 e 2013. Ela enfoca histórias na região envolvendo drogas. Ao sul de Albuquerque, fica a lendária fronteira entre Estados Unidos e México.
Foto: Frank Ockenfels 3/Sony Pitures
O lado obscuro do comércio
No filme "Desaparecidos" (2007), o diretor alemão Marco Kreuzpaintner escolheu contar a história de crianças mexicanas que atravessam a fronteira para os Estados Unidos como parte do tráfico de escravos sexuais. A estrela de Hollywood Kevin Kline desempenhou o papel principal.
Foto: picture-alliance/kpa
Guerra de drogas na fronteira
"Sicario: terra de ninguém" examina o impacto das guerras do narcotráfico na área de fronteira entre Arizona e México. O cineasta canadense Denis Villeneuve fez o agitado suspense em 2015, tendo Benicio del Toro no papel principal. A obra foi filmada no sul do Arizona.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Lionsgate/Richard Foreman Jr.
Filmes sobre drogas
A questão do narcotráfico parece atrair diretores de forma mágica. Em 2013, o cineasta britânico Ridley Scott filmou um suspense também nesta região fronteiriça. "O conselheiro do crime", estrelado por Brad Pitt e Michael Fassbender, foi filmado em El Paso, no Texas, e na Espanha.
Foto: picture-alliance/dpa
Crime e política
Há 17 anos, o diretor Steven Soderbergh lançou o renascimento dos filmes sobre a guerra das drogas. Em "Traffic", ele retrata a complexa relação entre polícia, traficantes e políticos – cujos laços uns com os outros estão indissociavelmente interligados para além das fronteiras geográficas.
Foto: picture-alliance/United Archives
Histórias de detetive
Além de faroestes e suspenses sobre drogas, inúmeras histórias de detetives e assassinatos misteriosos decorrem na fronteira entre EUA e México. Um clássico do gênero é o filme "O perigoso adeus" (1973), de Robert Altman, baseado em um romance de Raymond Chandler. O filme foi gravado na Califórnia, mas também em Tepoztlán, no México.
Foto: picture-alliance/United Archives/Impress
A fronteira em tempos de globalização
Em 2006, o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu filmou o drama narrativo múltiplo "Babel". A obra traça os destinos entrelaçados de várias pessoas de diferentes regiões do mundo, e é uma parábola cinematográfica sobre a questão do significado da fronteira para as pessoas em tempos de globalização.
Foto: picture alliance/kpa
Comédia de fronteira
Não há muito o que rir quando se trata de uma fronteira. A maior parte dos filmes que lida com os laços entre EUA e México tendem à seriedade. Mas, em 2004, James L. Brooks fez a comédia "Espanglês" sobre um encontro com muito clichê entre um americano rico (Adam Sandler) e uma faxineira mexicana (Paz Vega).
Foto: picture-alliance/United Archives
Drama sobre imigração
Nos últimos anos, mais e mais filmes foram produzidos sobre imigração e pobreza na região. No ano passado, a coprodução Alemanha-França-México "Soy Nero" estreou na Berlinale. O diretor Rafi Pitts, com raízes iranianas, conta a história de um jovem mexicano que atravessa a fronteira para os EUA em busca de uma vida melhor.
Foto: picture-alliance/dpa/Neue Visionen
Um clássico moderno
Talvez o filme mais impressionante sobre a imigração do Sul para o Norte tenha sido feito por Cary Fukunaga, em 2009. "Sem identidade" retrata o destino de vários jovens do México que estão tentando chegar aos EUA. Enquanto alguns estão tentando escapar de bandos criminosos de suas cidades, outros procuram o paraíso na Terra.