Três cachorros com pelo azulado foram avistados nos arredores da antiga usina atômica na Ucrânia, palco de desastre nuclear de 1986. Especialistas descartam anomalia causada pela radiação.
A cor azul vibrante dos cães gerou especulações nas redes sociaisFoto: Clean Futures Fund
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Três cães com pelagem azul brilhante foram vistos vagando perto da chamada Zona de Exclusão de Tchernobil, na Ucrânia, local do desastre nuclear de 1986.
Os animais foram descobertos em 6 de outubro pelo programa Dogs of Chernobyl, administrado pela organização sem fins lucrativos Clean Futures Fund, que há anos captura, esteriliza e liberta cães que ficaram abandonados após o acidente.
"Encontramos três cães que pareciam estar quase completamente cobertos por uma substância azul", disse Jennifer Betz, diretora veterinária do programa, à DW por e-mail.
"Tentamos capturá-los várias vezes, mas eles têm muito medo de pessoas e precisamos usar dardos tranquilizantes para contê-los. Infelizmente, não conseguimos desta vez", acrescentou.
Especulações sobre mutações descartadas
A impressionante cor azul gerou inúmeras especulações sobre possíveis mutações genéticas ligadas à radiação de Tchernobil. No entanto, especialistas descartam essa possibilidade.
"Não estamos afirmando, de forma alguma, que isso esteja relacionado à radiação de Tchernobil", diz Betz.
Segundo a veterinária, os cães provavelmente rolaram em uma substância viscosa que grudou em seus pelos. "Suspeitamos que essa substância tenha vindo de um banheiro químico antigo que estava no mesmo local que os cães", explica.
ONG nega ter tingido os animais
A organização também teve que esclarecer rumores que a acusavam de tingir os animais para chamar a atenção.
Pesquisadores sugerem que animais provavelmente rolaram em uma substância químicaFoto: Clean Futures Fund
Durante a campanha de esterilização, os veterinários usam, na cabeça dos animais, um marcador temporário – que desbota em dois ou três dias – nas cores verde, vermelha, azul ou roxa, para identificar aqueles que já foram atendidos.
"A cor é aplicada apenas no topo da cabeça e é completamente diferente dos cães que encontramos, que estavam cobertos de azul da cabeça aos pés", explica Betz.
"Não temos tempo para isso"
Em sua conta no Instagram, o Clean Futures Fund reiterou sua rejeição a essas acusações. "Para aqueles que comentam que estamos falsificando essas fotos ou que estamos borrifando ou tingindo esses cães de propósito, ou que os capturamos deliberadamente para tingi-los a fim de ganhar dinheiro ou espalhar informações falsas, não sei o que dizer, exceto que não temos tempo para fazer tal tipo de coisas, nem precisamos."
"Estamos tentando há dias encontrá-los novamente para recapturá-los com o único propósito de esterilizá-los e possivelmente limpar qualquer coisa em que possam ter se envolvido", acrescenta.
Embora Betz reconheça no e-mail que ainda não conseguiram confirmar suas suspeitas sobre a causa da cor dos cães, o especialista acredita que a substância não representa perigo. "Os cães parecem saudáveis, assim como todos os outros que encontramos durante nosso tempo em Tchernobil. Presumo que, contanto que não lambam a maior parte da substância de seus pelos, não lhes fará mal algum."
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Caso semelhante na Rússia
A publicação científica IFLScience observa que esta não é a primeira vez que são encontrados cães com pelagem azul brilhante. Em 2021, em Dzerzhinsk, na Rússia, moradores descobriram uma matilha semelhante perto de uma fábrica de produtos químicos abandonada.
"Nesse caso, suspeita-se que os cães tenham se esfregado em sulfato de cobre, um produto químico azul claro usado na fabricação", afirmou a publicação.
Vida selvagem retorna a Tchernobil
Após o desastre nuclear de Tchernobil, mais de 120 mil pessoas foram evacuadas, deixando para trás não apenas suas casas, mas também seus animais de estimação.
Mas, apesar dos altos níveis de radiação, cães e outros animais conseguiram sobreviver e se reproduzir, contra todas as probabilidades.
Hoje, além de raposas, lobos, javalis, guaxinins e pássaros, os cães colonizaram um ambiente antes considerado inabitável, adaptando-se notavelmente bem à zona radioativa.
Os últimos habitantes de Tchernobil
Os arredores da cidade ucraniana continuam inabitáveis 32 anos depois do acidente nuclear. Mas algumas pessoas já voltaram para suas casas. O cotidiano delas foi fotografado por Alina Rudya.
Foto: DW/A. Rudya
O otimismo de Baba Gania
Baba (mulher, senhora) Gania (e) tem 86 anos. Há dez, ela é viúva e, há 25, cuida da irmã Sonya, portadora de deficiência mental. "Não tenho medo da radiação. Cozinho os cogumelos até sair tudo", explica. A fotógrafa ucraniana Alina Rudya a visitou várias vezes: "É a pessoa mais calorosa e gentil que eu conheço", diz.
Foto: DW/A. Rudya
Casas vazias, indício de fuga apressada
Gania e a irmã vivem em Kupuvate, um vilarejo na área restrita que foi delimitada num raio de 30 km ao redor das ruínas da usina nuclear de Chernobyl. Depois da explosão do reator, em abril de 1986, 350 mil pessoas precisaram deixar a região. A maioria das casas em Kupuvate ficou vazia. Gania usa essa casa nas proximidades para guardar o seu caixão e o da irmã.
Foto: DW/A. Rudya
A volta dos mortos
"Na verdade, o cemitério de Kupuvate se parece com qualquer outro cemitério dos vilarejos da Ucrânia", conta Alina Rudya. "Muitas pessoas hoje enterradas aqui tiveram de abandonar a região depois da catástrofe e passaram a vida fora da área de radiação nuclear. Eles só voltaram depois de morrer", relata.
Foto: DW/A. Rudya
O último desejo de Baba Marusia
Os poucos que ficaram cuidam dos restos mortais dos familiares – como Baba Marusia, que veio até o túmulo da mãe. A filha vive em Kiev com o marido e duas crianças. "Fico feliz de ter ficado aqui", diz Baba Marusia. "Aqui é minha casa. Quero ser enterrada aqui." E acrescenta: "Mas do lado da minha mãe, não do meu marido."
Foto: DW/A. Rudya
Samosely: voltando para ficar
"Samosely" é como são chamados os habitantes que voltaram e vivem ilegalmente dentro da área de exclusão de Chernobyl. Galyna Ivanivna é um deles. "Minha vida passou como um raio. Tenho 82 anos e parece que nunca vivi. Quando era mais jovem, sonhava em viajar pelo mundo inteiro. Mas eu nunca consegui ir além de Kiev", recorda.
Foto: DW/A. Rudya
Vivendo no próprio mundo
Ivan Ivanovich e sua mulher também fazem parte das poucas centenas de habitantes que mudaram de volta para a área contaminada por radiação nuclear nos anos 1980. Entre os turistas que visitam a região, Ivan se tornou uma espécie de celebridade. "Ele conhece inúmeras histórias que oscilam entre verdade e imaginação", explica Alina Rudya.
Foto: DW/A. Rudya
Testemunhas mudas do passado
Uma semana antes do aniversário de 32 anos da catástrofe de Chernobyl, no dia 26 de abril, Alina Rudya foi à vila de Opachichi. Segundo ela, apenas uma mulher idosa ainda vive aqui – os outros habitantes já morreram. Suas casas vazias ficam abertas como testemunho mudo, mas eloquente, do ocorrido, através de fotos, calendários, cartas, toalhas bordadas e móveis.
Foto: DW/A. Rudya
Despedida a prestação
Marusia observa o marido, Ivan, dormindo. Ele teve um AVC recentemente e sofre de demência. "Às vezes, ele acorda à noite e sai procurando o seu trator. Trabalhou com o veículo por 42 anos." Ela diz que o desejo de morrer está vindo lentamente para ela. "Não quero ser um fardo para meus filhos e netos", afirma.
Foto: DW/A. Rudya
Prevenidos para a morte
Antes de ficar doente, Ivan, marido de Marusia, ainda construiu dois caixões para estar preparado para a própria morte e a morte da mulher. Os caixões ficam num galpão, diretamente ao lado da bicicleta velha. "O de baixo é meu, e o de cima é o do meu marido", explica Marusia.
Foto: DW/A. Rudya
Os últimos "samosely"
Apenas poucos samosely ainda vivem na zona de exclusão. Alina Rudya, que também nasceu perto de Chernobyl, os visitou várias vezes e fez retratos de alguns para um projeto fotográfico de longo prazo que ela quer publicar em livro. "Visitar os vilarejos abandonados está ficando cada vez mais triste. Toda vez que eu venho, alguém morreu, porque quase todos têm mais de 70 anos", explica.