Após 1945, a atual capital alemã fora dividida politicamente, mas a circulação era livre. Até que, em 13 de agosto de 1961, uma construção literalmente cimentou a divisão entre o mundo comunista e o capitalista.
Anúncio
"Portão de Brandemburgo fechado". Com essa manchete, nas primeiras horas de 13 de agosto de 1961 a agência de notícias Associated Press (AP) anunciava um acontecimento decisivo para a história mundial: a construção do Muro de Berlim.
Nesse dia foi bloqueada a marca registrada da metrópole alemã, situada diretamente na junção entre o Leste e o Oeste. Simultaneamente, soldados do Exército Nacional do Povo (NVA) e tropas de operários da comunista República Democrata Alemã (RDA) obstruíam todos os demais caminhos para Berlim Ocidental, de início com arame farpado.
A operação "Salvaguarda das Fronteiras", comandada pelo futuro chefe de Estado alemão-oriental Erich Honecker, era o último passo para literalmente cimentar a divisão de Berlim. Pois em breve se começaria a erguer um quase intransponível muro de pedra e concreto, de 3,60 metros de altura.
Desse modo, selava-se a última e maior brecha por onde, desde a divisão estatal da Alemanha, em 1949, escapara grande parte dos cerca de 2,6 milhões de refugiados da RDA – na esperança de uma vida melhor, dos pontos de vista material, cultural e político, na República Federal da Alemanha (RFA), no oeste.
Símbolo concreto da Guerra Fria
O êxodo em massa empurrara o Estado alemão-oriental cada vez mais à beira da ruína econômica. Faltavam urgentemente sobretudo operários especializados e médicos. Para evitar a continuação da sangria demográfica e, desse modo, colocar uma tranca diante da RDA, os dirigentes em Berlim Oriental só viam uma saída: o Muro.
Na propaganda oficial, contudo, o fechamento da fronteira é justificado de modo bem diferente: "A manutenção da paz exige exige que se dê um fim às atividades dos revanchistas alemães-ocidentais." Essa retórica agressiva era típica de uma época em que a superpotência comunista União Soviética (URSS) e seu rival capitalista Estados Unidos travavam um duelo implacável pelo modelo social supostamente melhor.
Na disputa, a RDA estava do lado e sob a influência da URSS, enquanto a RFA integrava a facção dos EUA. O perigo de uma terceira guerra mundial, desta vez atômica, era muito real. Ambos os lados expandiam constantemente seus arsenais militares. Fala-se de um "equilíbrio do terror". Essa era, que só terminaria com a queda do Muro de Berlim, em 1989, entraria para a história como Guerra Fria.
Anúncio
Os quatro setores do pós-guerra
Em todas essas décadas, a Berlim dividida foi foco da disputa dos sistemas. Símbolo político da dominação dos nacional-socialistas, de 1933 a 1945, ela fora seccionada em quatro setores pelas potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial.
Na parte leste, os soviéticos é que mandavam; no oeste, os americanos, britânicos e franceses. Todas as tentativas dos comunistas de colocarem a metrópole inteiramente sob seu controle fracassaram diante da resistência dos Aliados ocidentais.
O então presidente americano John F. Kennedy definiu Berlim Ocidental democrática como uma "ilha de liberdade no mar comunista". No entanto, foi forçado a aceitar a construção do Muro, da mesma forma que os diretamente atingidos: os mais de 3 milhões de residentes de ambos os lados da "muralha anti-imperialista", como o regime da RDA denominava a proteção de fronteira de cerca de 155 quilômetros de extensão.
Nos 28 anos de sua existência, mais de 140 cidadãos morreram por causa do Muro de Berlim. Hoje, para recordar esses destinos há o memorial central da rua Bernauer Strasse, onde ainda se manteve um trecho de mais de 200 metros do Muro. Curiosos de todo mundo vão até lá para ter uma ideia do que significou a divisão da atual capital alemã.
O homem que cavou um túnel para os outros
Testemunhas da época relatam suas experiências, entre as quais histórias mirabolantes. Como a de Joachim Rudolph, que, após conseguir escapar, cavou um túnel de 140 metros do Oeste para o Leste, a fim de abrir para outros o caminho da liberdade.
O túnel por onde 57 pessoas fugiram de Berlim Oriental
01:50
Passados 60 anos da construção do Muro, o ex-cúmplice de evasão é um homem extremamente solicitado. Numa roda de debates da fundação federal para avaliação da ditadura comunista da RDA (Bundesstiftung Aufarbeitung), ele conta sobre uma vivência decisiva, quando inspecionava a área com um amigo, pouco após o bloqueio da fronteira.
"Nós vimos uma cerca de arame farpado atravessada sobre a Bernauer Strasse. Na frente, estavam cinco ou seis soldados de fronteira, de kalashnikov pendurada no pescoço e capacete de aço na cabeça." De repente, os amigos ouviram os brados: "O que é que estão pensando, não sabem ler? Aqui é zona de fronteira! Proibido entrar!"
Nesse momento, Rudolph sentiu que a situação era séria, pois os soldados não deixaram a menor dúvida: se ele e o amigo não dessem meio volta imediatamente, eles iam fazer uso das armas.
O Muro e os muros para os jovens
Testemunhas da época e locais autênticos como a Bernauer Strasse são um ponto de atração em especial para os jovens interessados na história do Muro de Berlim. Lennart Siebels, de 26 anos, cresceu nos limites de Berlim, onde hoje corre o Mauerweg, a "trilha do Muro".
"Morando tão perto do bosque, com essa trilha e essa faixa de areia do lado, naturalmente você se pergunta, desde cedo: 'Por que ela está aí?' Acho que assim o interesse nasceu muito mais cedo do que se eu morasse na cidade."
A relação é bem diferente para Lena Quincke, de 22 anos, nascida no Camarões, filha de pai alemão, e crescida na Etiópia. Apesar de só ter vindo para a Alemanha em 2017, estudava na África numa escola alemã, e o Muro de Berlim fazia parte do currículo.
Desde que está no país, contudo, conseguiu ter uma noção melhor de como er a da Berlim antes dividida tornou-se muito mais diferenciada: "Quando se vê estes restos de construção e sabe que antes aqui havia um muro, e que a gente não podia simplesmente passar, isso desencadeia muitos sentimentos." E questões, como "com que parte da Alemanha você se associa".
Apesar de suas biografias tão diversas, ambos partilham uma característica típica de sua geração: ao escutar a palavra "muro", não pensam imediatamente no que cortou Berlim de 1961 a 1989, mas naquele planejado pelo ex-presidente americano Donald Trump, entre os EUA e o México. O de Berlim, afinal, "eu nem vivenciei", explica Siebels.
Quincke vê paralelos entre os velhos e os novos muros. Sobretudo os perigos são iguais: onde está um, há sempre alguma brecha, os seres humanos sempre encontram um jeito de ultrapassar, "e isso termina para muitos de modo muito sangrento ou perigoso".
Como exemplo, ela cita a divisão entre Israel e os territórios palestinos, especificamente o muro de Jerusalém. Lá se vê o impacto sobretudo sobre a população civil. Não importa de que muro se fale, a reação de Quincke é de repulsa: "Com certeza, para mim é sempre uma 'bandeira vermelha'."
O Muro de Berlim, uma história em fotografias
A 13 de agosto de 1961, guardas da Alemanha Oriental começaram a fechar com arame farpado e concreto a fronteira que separava as partes oriental e ocidental de Berlim, bem como Berlim Ocidental da Alemanha Oriental.
Foto: AP
RDA é hoje pura nostalgia
Diante do Museu de Checkpoint Charlie e fantasiado de guarda de fronteira da RDA, o berlinense Wolfgang Kolditz carimba – com um carimbo postal original da Alemanha comunista – os cartões e lembranças comprados pelos turistas, dez anos após a queda do Muro. Naquele local esteve o mais famoso posto de controle, conhecido em todo o mundo através de inúmeros filmes sobre espionagem e a Guerra Fria.
Foto: AP
Onde foi?
Hoje, pouco resta da histórica muralha que separou dois Estados alemães por tanto tempo.
Foto: DW
Os 'pica-paus' do Muro
Depois do dia 9 de novembro de 1989 foi apenas uma questão de meses até que o Muro desaparecesse inteiramente da paisagem de Berlim. Ficaram famosos na época os chamados 'pica-paus' do Muro: berlinenses e turistas que, armados de martelo e cunha, arrancaram pedaços da muralha para guardar de lembrança. Por muito tempo, lojas de suvenires em Berlim ofereceram lascas de concreto com um duvidoso 'certificado de autenticidade'.
Foto: AP
A dança sobre o Muro
No dia 10 de novembro de 1989, berlinenses orientais e ocidentais confraternizaram-se com uma verdadeira dança sobre o Muro, que deixara de ser uma barreira desde a noite anterior. Ao fundo, o Portão de Brandemburgo – o símbolo de Berlim. Com as fronteiras abertas, milhares de cidadãos alemães orientais viajaram imediatamente à parte ocidental da Alemanha, para fazer compras, visitar parentes e amigos ou simplesmente para satisfazer a curiosidade pessoal.
Foto: AP
A confusão histórica
Durante uma entrevista coletiva no dia 9 de novembro de 1989, o jornalista e membro do politburo do SED – Partido Socialista Unificado – Günter Schabowski, interpretou erroneamente um comunicado oficial do governo da Alemanha Oriental, anunciando a abertura das fronteiras entre as duas partes da Alemanha. Poucas horas depois, a pressão popular fez com que a guarda de fronteiras da RDA abrisse o Muro de Berlim.
Foto: dpa
O fim de uma carreira
Poucas semanas após as festividades comemorativas do 40º aniversário da República Democrática Alemã, o chefe de Estado e de partido Erich Honecker foi destituído de todas as suas funções. A pressão dos protestos populares e as fugas em massa da RDA fizeram com que os comunistas mais jovens ainda tentassem salvar o regime, depondo a liderança conservadora. A rebelião palaciana não trouxe o efeito desejado: os protestos continuaram, culminando com a queda do Muro de Berlim.
Foto: dpa
A festa final
Com a presença do convidado especial – o chefe de Estado e de partido da União Soviética, Mikhail Gorbachev – foi comemorado no dia 7 de outubro de 1989 o 40º aniversário da República Democrática Alemã. Para irritação da liderança comunista da RDA, Gorbachev advertiu para a urgência de reformas no país.
Foto: dpa
Plataforma para pichações
Em toda a sua extensão, o Muro de Berlim tornou-se uma plataforma de pichações no lado ocidental. Com lemas políticos ou meros desenhos, milhares de berlinenses e de turistas lançaram mão dos aerossóis para deixar uma mensagem colorida sobre o concreto. Como a profecia que se vê na foto: 'Berlim ficará livre do Muro'.
Foto: AP
Propaganda dos dois lados
Em outubro de 1964, foi posto um cartaz (à esq.) no lado oriental de Berlim com os dizeres: 'Acordos sobre salvo-condutos são melhores que provocações'. Poucos dias depois, foi afixada nas proximidades a resposta ocidental: 'O Muro continuará sendo uma provocação, mesmo com salvo-condutos!'.
Foto: AP
A fuga com um balão
Na noite de 16 para 17 de setembro de 1979, duas famílias da Alemanha Oriental lograram uma fuga sensacional. Os casais Strelzik e Wetzel, com seus quatro filhos em idade entre dois e 15 anos, conseguiram cruzar a fronteira em direção à Alemanha Federal a bordo de um balão de ar quente, que eles próprios construíram às escondidas, durante meses de trabalho. O balão pousou de madrugada em Naila, na Baviera, sem chamar a atenção dos guardas de fronteira.
Foto: dpa
Um túnel por baixo do Muro
No final de 1963, um grupo reunido pelo ator Wolfgang Fuchs, do qual fazia parte o estudante Klaus-Michael von Keussler (foto), iniciou a construção de um túnel sob o Muro de Berlim. Durante dez meses foi escavado um subterrâneo de 145 metros de extensão, 80 centímetros de altura e numa profundidade de até 12 metros. Nos dias 3 e 4 de outubro de 1964, um total de 57 pessoas conseguiu fugir da RDA, antes que a polícia descobrisse e fechasse o túnel, no dia seguinte.
Foto: dpa
A última oportunidade
No dia em que foi iniciada a divisão de Berlim, o domingo 13 de agosto de 1961, e nos dias subsequentes registraram-se cenas dramáticas como a da foto. Uma mulher tenta saltar da janela de uma casa do lado oriental para fugir para a parte ocidental de Berlim. Um policial tenta puxá-la de volta, enquanto berlinenses ocidentais procuram apoiá-la na fuga, que acaba obtendo êxito. Nas semanas seguintes, esta casa – como outras na linha fronteiriça – foi demolida, abrindo espaço para a construção do Muro.
Foto: dpa
A morte junto ao Muro
Cenas espetaculares de fuga acompanharam o Muro de Berlim em toda a sua história. Algumas com final feliz, outras com um desfecho trágico. A primeira vítima fatal foi o jovem Peter Fechter, em 17 de agosto de 1962. Atingido pelos disparos da guarda de fronteiras da RDA, Fechter agonizou durante 50 minutos na chamada 'terra de ninguém', falecendo pouco depois de ser recolhido pela polícia alemã oriental.
Foto: AP
Hora da opção
No dia 15 de agosto de 1961, o soldado alemão-oriental Conrad Schumann foi destacado para controlar a linha divisória na rua Bernauer, marcada por arames farpados, pois o Muro ainda não estava pronto. Schumann jogou fora o fuzil e pulou sobre o arame farpado, passando para o lado ocidental. A cena foi fotografada por jornalistas que acompanhavam o desenrolar dos acontecimentos em Berlim.
Foto: picture-alliance/dpa/R.Jensen
Pedra sobre pedra
Depois do fechamento das ruas de Berlim, selando a divisão da cidade a partir de 13 de agosto de 1961, o governo comunista da Alemanha Oriental ordenou a construção do Muro. Vigiados de perto pelos soldados do chamado Exército Popular Nacional (NVA), os operários demoliram os prédios localizados na linha divisória, construindo uma muralha e um campo minado em seu lugar.
Foto: AP
O símbolo isolado
O símbolo arquitetônico de Berlim, o Portão de Brandemburgo, ficou inteiramente isolado com a construção do Muro. O acesso a ele só era possível a partir do lado oriental da cidade, ficando reservado às autoridades policiais, militares e aos próceres do regime comunista. Hoje, a área circunvizinha do Portão de Brandemburgo é novamente uma das mais movimentadas e freqüentadas da capital alemã.
Foto: AP
Kennedy visita o Muro
Em junho de 1963, quase dois anos depois da construção do Muro, o presidente norte-americano John F. Kennedy visitou Berlim para informar-se sobre a divisão da cidade. Acompanhado pelo então prefeito Willy Brandt (ao centro) e pelo chanceler federal alemão Konrad Adenauer (à direita), Kennedy foi aclamado pela população de Berlim Ocidental.
Foto: AP
Uma fortaleza
Partes do Muro de Berlim tinham o aspecto de uma verdadeira fortaleza: com pista para o transporte de soldados e guarita para controlar as ocorrências nos dois lados da linha divisória. Além da muralha, uma 'terra de ninguém' com campo minado e cerca de arame farpado impedia o acesso ao Muro, no lado oriental.
Foto: AP
Tanques cara a cara
Nas semanas que se seguiram à construção do Muro de Berlim, a Guerra Fria atingiu um dos seus momentos mais dramáticos. A tensão entre os EUA e a União Soviética podia ser vista claramente no posto de controle da rua Friedrich, o chamado Checkpoint Charlie, no centro de Berlim: tanques americanos e soviéticos permaneceram durante dias, frente a frente, à espera de um comando de ação militar.
Foto: AP
O idealizador do Muro
Ninguém desejava uma muralha de pedra e concreto armado mais do que Walter Ulbricht, o chefe de Estado da República Democrática Alemã (RDA). Ele precisava dela para impedir o êxodo de milhares de pessoas para o outro Estado alemão, a República Federal da Alemanha. A União Soviética não apoiou com muita convicção a 'muralha antifascista' de Ulbricht. Não obstante, a fronteira de 155 quilômetros cercando Berlim Ocidental sedimentou a divisão alemã durante 28 anos.