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O perigoso conflito envolvendo a Caxemira

7 de agosto de 2019

Além de deixar dezenas de milhares de mortos, a disputa pela região corrompe as relações entre Índia e Paquistão desde que ambos se tornaram independentes, em 1947. Ao longo dessas sete décadas, a crise só se escalou.

Forças de segurança patrulham rua no estado de Jammu e Caxemira, na Índia
Forças de segurança patrulham rua no estado de Jammu e Caxemira, na ÍndiaFoto: AFP/R. Bakshi

O governo indiano revogou nesta semana o status especial da Caxemira, removendo a autonomia de sete décadas da região disputada com o Paquistão. A decisão elevou as tensões entre os dois países, levando o Paquistão a reduzir, nesta quarta-feira (07/08), as relações diplomáticas com Nova Délhi e a suspender o comércio bilateral.

Mas a crise entre as nações devido à Caxemira não é de hoje. Como tantos outros conflitos pelo mundo, a disputa pela região começou quando Índia e Paquistão se tornaram independentes do poder colonial.

Em 1947, o Reino Unido cedeu à luta por liberdade em sua colônia na Índia – liderada pelo movimento pacífico de Mahatma Gandhi, como também pela Liga Muçulmana – e garantiu independência à região. Assim, os britânicos deixavam para trás dois Estados: a secular União Indiana e a República Islâmica do Paquistão.

A divisão da Índia em 1947 apresentou um problema para o então estado principesco de Jammu e Caxemira, localizado ao longo da fronteira norte das duas novas nações. Tradicionalmente, o estado era governado por um marajá hindu (governante local), mas a maioria da população era muçulmana.

Na esperança de poder declarar seu território independente, o marajá Hari Singh adiou qualquer anexação a um dos dois novos países, Índia ou Paquistão, ambos interessados pela constelação especial no Vale de Caxemira.

Até hoje, a Índia se vê como uma nação secular na qual coexistem várias religiões. Isso torna Jammu e Caxemira, a única província de maioria muçulmana, uma parte importante da pluralidade religiosa da Índia.

O Paquistão, por outro lado, se via à época da independência como o lar de todos os muçulmanos no sul da Ásia – seu pai fundador, Mohammed Ali Jinnah, imaginou o Paquistão e a Índia como nações muçulmana e hindu separadas no subcontinente. Até 1971, Bangladesh, que fica a leste da Índia, também pertencia ao Paquistão.

As guerras da Caxemira

Enquanto o marajá hesitava em tornar a Caxemira parte de um dos países, os guerrilheiros paquistaneses tentaram assumir o controle do principado em 1947. Hari Singh pediu ajuda a Nova Délhi, e não demorou muito para que as tropas da Índia e do Paquistão se enfrentassem.

A primeira guerra da Caxemira começou em outubro de 1947 e terminou em janeiro de 1949 com a divisão de fato do estado principesco ao longo da chamada Linha de Controle (LoC), a fronteira não oficial ainda em vigor até hoje.

Naquela época, a ONU enviou uma missão de observação que ainda se encontra no território. O Paquistão assumiu o controle da província especial de Gilgit-Baltistan e da sub-região de Azad Caxemira (Caxemira Livre) desde 1949. Já a área assegurada pela Índia se tornou o estado indiano de Jammu e Caxemira em 1957.

As décadas seguintes foram marcadas por uma corrida armamentista em ambos os lados. A Índia começou a desenvolver uma bomba nuclear, e o Paquistão também iniciou um programa nuclear visando poder enfrentar seu poderoso vizinho. Hoje, a Índia e o Paquistão possuem cerca de 140 e 150 ogivas nucleares, respectivamente. Ao contrário do Paquistão, a Índia descartou explicitamente um primeiro ataque nuclear.

O Paquistão também investe quantias enormes em seu programa nuclear, enquanto tenta garantir que não fique atrás de seu vizinho em termos militares.

Em 1965, o Paquistão mais uma vez usou a força militar para tentar mudar as fronteiras, mas perdeu para os militares indianos. Os vizinhos entraram em confronto pela terceira vez em 1971, mas dessa vez a Caxemira não estava no centro do confronto.

Em vez disso, foi a luta pela independência em Bangladesh que precipitou a guerra. A Índia, que apoiava os combatentes pela independência bengali, derrotou mais uma vez o Paquistão. Um ano depois, Nova Dhéli e Islamabad assinaram o Acordo de Simla, que destaca a importância da LoC e se compromete com negociações bilaterais para esclarecer de uma vez por todas as reivindicações sobre a região da Caxemira.

Em 1984, as nações entraram novamente em confronto, dessa vez em torno da Geleira de Siachen, controlada pela Índia. Em 1999, os dois lados lutaram pelo controle de postos militares no lado indiano da LoC. Em 2003, a Índia e o Paquistão assinaram um novo cessar-fogo – mas ele tem se mostrado frágil desde 2016.

O terceiro vizinho

A China, que divide uma longa fronteira com Jammu e Caxemira, também tem um papel nesse conflito. Em 1962, o país ocupou uma parte da Índia que faz fronteira com a Caxemira – e fechou uma aliança com o Paquistão.

Até hoje, a China e o Paquistão fazem trocas comerciais através da recém-construída Karakoram Highway, que interliga os países por meio da região ocidental da Caxemira. Essa via está sendo ampliada como parte do projeto multibilionário do Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC, na sigla em inglês).

Essa antiga estrada de cascalho está atualmente sendo transformada numa rodovia asfaltada de múltiplas pistas e que pode ser usada durante todo o ano. A China está investindo 57 bilhões de dólares (228 bilhões de reais) em projetos paquistaneses de infraestrutura e energia, mais do que em qualquer outro país do sul da Ásia. A aliança econômica com seu poderoso vizinho ajudou a solidificar as reivindicações do Paquistão na região aos pés do Himalaia.

Rebeldes e ataques

Os governos dos países vizinhos já não são as únicas partes envolvidas no conflito da Caxemira. Por meio da violência, grupos militantes tentam perturbar o status quo em ambos os lados da LoC, pelo menos desde a década de 1980. Seus ataques contribuíram para uma deterioração da situação de segurança.

Ao menos 45 mil pessoas foram mortas em ataques terroristas nos últimos 30 anos. E o número total de mortes resultantes desse conflito é de pelo menos 70 mil, segundo estimativas de organizações de direitos humanos.

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