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O preço de uma alternativa ao dólar e ao euro

Jean-Philip Struck9 de julho de 2015

Países do Brics debatem usar suas próprias moedas em transações comerciais entre si. Especialistas apontam vantagens, como a redução nos custos com câmbio, mas afirmam que iniciativa tem mais peso político que econômico.

Foto: Reuters

A ideia de que os países do Brics utilizem suas próprias moedas nas transações entre si, em vez de euros e dólares, voltou a ser debatida na cúpula encerrada nesta quinta-feira (09/07), na cidade russa de Ufá.

A iniciativa já é discutida desde 2012, quando foi tema durante a reunião do grupo em Nova Déli. Em 2014, na cúpula de Fortaleza, ela foi defendida por empresários dos países-membros (África do Sul, Brasil, China, Índia e Rússia). Em Ufá, os russos reforçaram seu apoio à proposta.

"Nós precisamos trabalhar com o possível uso das moedas nacionais nos cálculos comerciais", disse o presidente russo, Vladimir Putin, à presidente Dilma Rousseff durante encontro na quarta-feira.

Economistas ouvidos pela DW Brasil são categóricos em afirmar que a ideia por enquanto tem muito mais peso político do que econômico, e que uma eventual adesão ao modelo ainda deve demorar.

“É muito mais uma iniciativa política de confrontar a hegemonia da moeda americana do que algo que vai ter efeitos num curto prazo para os exportadores”, afirma o economista Júlio Hegedus, da consultoria Lopes Filho & Associados.

Os economistas destacam pontos positivos da iniciativa, que acabaria com a necessidade de conversões e deixaria os membros do Brics, que tiveram quase 300 bilhões de dólares em volume comercial entre eles em 2014, menos expostos às variações do dólar e do euro. Porém, ressaltam que os países podem acabar sofrendo com problemas das suas próprias moedas.

Menor custo no câmbio

O chefe da delegação brasileira no Conselho Empresarial do Brics, José Rubens de la Rosa, afirma que uma das vantagens seria cortar alguns custos nas operações cambiais no momento em que as trocas comerciais são efetuadas.

Segundo essa visão, uma transação direta de moeda entre os países do Brics facilitaria a negociação entre as empresas sediadas em países do grupo, dispensando as duas partes de fazer uma dupla conversão de suas moedas pelo dólar, divisa predominante nas negociações internacionais, em uma eventual transação.

A economista Renata Amaral, da consultoria Barral M Jorge, concorda, mas afirma que esse tipo de economia depende muito da natureza do contrato fixado entre as partes e que é difícil calcular o volume que será poupado. “De qualquer forma, alguns custos de corretagem e conversão podem cair, caso as partes resolvam não usar o dólar”, afirma.

Putin a Dilma: "Nós precisamos trabalhar com o possível uso das moedas nacionais"Foto: Reuters

Segundo Amaral, o comércio bilateral em moedas nacionais pode gerar outros tipos de simplificação, já que o comércio direto permite uma previsão mais precisa dos pagamentos. “O exportador pode saber exatamente quanto vai receber em sua moeda local e se programar de maneira mais eficiente”, diz.

Sem consenso sobre sistema

A China e a Rússia já adotam há anos um modelo que permite o comércio em moedas locais sob certas condições. No último ano, Moscou, com dificuldade de realizar transações em dólar por causa das sanções econômicas impostas pelo Ocidente, tem tentando promover ainda mais esse modelo no comércio entre os membros.

Em uma declaração divulgada na quarta-feira em Ufá, Andrey Kostin, presidente do banco russo VTB, o segundo maior do país, afirmou prever que o comércio com moedas locais deve ser implementado num futuro próximo. Ele disse que entre 40% e 50% do comércio entre os países do grupo poderá ocorrer com moedas locais.

Os países-membros ainda divergem como o sistema de troca em moeda local seria implementado. A China favorece um sistema que pode tornar sua moeda, o yuan, hegemônica no bloco. Já o Brasil defende um modelo semelhante ao Sistema de Pagamento em Moeda Local (SML), já adotado com a Argentina, que dispensa o uso de dólares e permite a exportação e a importação em reais.

Para os especialistas, o comércio em moeda local também tem a vantagem de diminuir a dependência à volatilidade do dólar, que sofre a influência do crescente endividamento da economia americana e das periódicas mudanças na taxa de juros aplicadas nos Estados Unidos. O comércio em euros também tem apresentado instabilidade, por causa da crise grega.

“A hegemonia do dólar funciona dessa forma: o banco central americano [Federal Reserve] determina uma taxa de juros nos EUA, e o mundo tem que se adaptar a isso. Outras opções de trocas para diminuir os efeitos de tais ajustes são bem-vindas”, diz André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos.

Desvantagens

Se os países do Brics querem evitar ficar reféns da volatilidade do dólar e do euro ao realizarem negócios, eles podem, ao mesmo tempo, acabar sofrendo com problemas das suas próprias moedas.

De acordo com André Perfeito, o comércio com moeda local pode ser bastante dificultado pela falta de liquidez de algumas economias do Brics. “É difícil fazer negócios com moedas de economias instáveis. É só ver o caso da Rússia”, opina. O economista Júlio Hegedus concorda: “Qual é exatamente o mercado para rublos russos no Brasil?”

Já Amaral cita o exemplo dos exportadores brasileiros de carne, que se animaram no ano passado com as sanções impostas à Rússia e viram o episódio como uma oportunidade de aumentar o volume de exportações ao país.

“O volume aumentou, mas a questão do lucro é mais complicada por causa da desvalorização do rublo. É difícil fazer previsões de comércio e negociar com a moeda de economias assim”, diz.

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