Chegada do magnata à Casa Branca gerou um nível de incerteza inédito entre seus aliados tradicionais, e cúpula na antiga capital alemã flexibiliza formato para que países-membros possam buscar esclarecimentos.
Anúncio
Os chefes de diplomacia dos países do G20 se reúnem a partir desta terça-feira (16/02) em Bonn, antiga capital alemã, em sua primeira cúpula desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca. As atenções estão voltadas para o secretário de Estado americano, Rex Tillerson.
A chegada de Trump à presidência gerou um nível de incerteza inédito entre seus aliados tradicionais e muitos governos ocidentais acreditam que esta reunião sirva para começar a esclarecer alguma das questões fundamentais do panorama internacional, da Síria à Ucrânia, passando por Rússia e Irã.
O ministro americano também deve enfrentar questões sobre o conflito entre israelenses e palestinos, depois de Trump causar consternação internacional na quarta-feira ao se distanciar da solução de dois Estados, base da política dos EUA para o Oriente Médio durante décadas.
As relações dos EUA com a China também estão no centro das atenções. A reunião marcará o primeiro encontro entre Tillerson e o chanceler chinês, Wang Yi, cuja presença foi confirmada apenas dois dias antes, após um telefonema entre Trump e o presidente Xi Jinping.
Durante a conversa, Trump reafirmou o compromisso dos EUA à posição de décadas de Washington sobre a política de "uma só China", em que considera que Taiwan não é um território independente da China. Será também o primeiro encontro de Tillerson com o chancele russo, Sergei Lavrov.
O primeiro tour diplomático do governo Trump inclui ainda a presença do secretário de Defesa americano, James Mattis, no segundo dia de reunião da Otan, nesta quinta-feira em Bruxelas; e do vice-presidente, Mike Pence, na Conferência de Segurança de Munique, no sul da Alemanha.
Na capital belga, Mattis reafirmou o compromisso de Washington com a Aliança Atlântica, depois de Trump tachar a organização de obsoleta. Mas ele também repreendeu severamente os Estados-membros, afirmando que os EUA vão "moderar seus compromissos" com a aliança a menos que os países-membros aumentem suas contribuições financeiras.
"Há muitas incertezas sobre o que eles querem e o que eles planejam", afirmou um diplomata europeu sobre o governo Trump. "Esperamos obter alguma clareza nas próximas semanas."
Alemanha alerta contra isolacionismo
O ministro alemão do Exterior, Sigmar Gabriel – que também estreia em reuniões internacionais de peso após a saída de Frank-Walter Steinmeier do cargo –, ressaltou em comunicado a importância do G20 como fórum para analisar de forma conjunta "as causas dos conflitos e as possibilidades de prevenção pacífica".
Segundo Gabriel, a política externa não deve se limitar a "ir constantemente de um fogo ao seguinte com o extintor" e considerou que cada vez há mais "grandes problemas internacionais" cuja resolução requer cooperação entre países.
"O terrorismo, a escassez de água, os deslocamentos forçados e as crises humanitárias não se superam com isolamento. A mudança climática não é combatida com arame farpado", afirmou o chefe da diplomacia alemã.
Os organizadores alemães, que não preveem que haja uma declaração final, decidiram não revelar a agenda do jantar de trabalho que será realizado nesta sexta-feira entre os ministros do G20, para que possam abordar de maneira informal todos os pontos não incluídos nela.
Além disso, vão acontecer em Bonn múltiplos encontros bilaterais e uma reunião de uma dúzia de países sobre a Síria – na qual a Rússia não estará presente.
A reunião do G20 terá nesta quinta-feira uma primeira sessão sobre a Agenda 2030 de objetivos globais de desenvolvimento da ONU e uma segunda, na sexta-feira, sobre prevenção de conflitos e consolidação da paz.
Esta é apenas a segunda ocasião na qual o país que ostenta a presidência rotativa do G20 organiza uma reunião de ministros das Relações Exteriores – após México em 2012 – e, portanto, que dá cabimento a questões de política internacional na agenda.
Esta opção é questionada por alguns países, já que estes assuntos são tratados tradicionalmente em outros formatos, principalmente no seio do Conselho de Segurança da ONU.
Está previsto que 18 dos ministros das Relações Exteriores dos 20 países-membros (a Índia e Austrália enviam seus vice-ministros) participem do encontro em Bonn, assim como titulares desta pasta de outros países convidados – como é o caso do espanhol Alfonso Dastis – e do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.
O G20, que reúne as economias avançadas e emergentes, além dos atores regionais relevantes, inclui EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Austrália, Canadá, China, Índia, Indonésia, África do Sul, México, Argentina, Brasil, Rússia, Coreia do Sul, Turquia, Arábia Saudita e União Europeia.
FC/efe/dpa/afp/ap/rtr
Os decretos de Donald Trump
Donald Trump estremeceu o cenário político em seus primeiros dias como presidente dos EUA com uma série de decretos e memorandos impactantes. Entenda a diferença e o significado de cada um deles.
Foto: picture-alliance/dpa/Sachs
Forma rápida de cumprir promessas eleitorais
Com menos de duas semanas na presidência, Donald Trump emitiu 17 medidas executivas. Embora este número em si não seja significativo – no mesmo período Barack Obama assinou praticamente o mesmo número de ordens – o conteúdo dos decretos de Trump é. Parece que o novo presidente dos EUA quer implementar muitas de suas promessas de campanha – incluindo as controversas - o mais rápido possível.
Foto: Reuters/K. Lamarque
O que são ordens executivas e memorandos?
As ações executivas (EA) permitem que o presidente dos EUA dê ordens que não precisam de aprovação do Congresso a agências governamentais, contornando o processo legislativo e acelerando sua implementação. Ordens executivas são uma forma mais abrangente de EA que muitas vezes lidam com diretrizes organizacionais maiores, enquanto memorandos presidenciais ordenam agências específicas a fazer algo.
Foto: picture-alliance/CNP/A. Harrer
Enfraquecer Obamacare (ordem executiva)
A primeira ordem executiva assinada por Trump foi uma para retardar partes do Affordable Care Act (Obamacare) para "minimizar encargos regulatórios". Enquanto Trump sozinho não pode revogar a legislação instituída por Obama, ele pode minar a implementação do programa de saúde enquanto a maioria republicana no Congresso se prepara para revogá-lo.
Foto: Reuters/J. Rinaldi
Retirar subsídio para aborto (memorando)
Trump reinstituiu uma política que impede o financiamento federal para ONGs que fornecem aconselhamento sobre aborto e defendem o direito ao aborto. Essa diretriz tem uma longa história: foi inicialmente instaurada pelo republicano Ronald Reagan, rescindida pelo democrata Bill Clinton, reinstituída pelo republicano George W. Bush, antes de ser reativada pelo democrata Barack Obama.
Foto: REUTERS/A. P. Bernstein
Deportação de imigrantes (ordem executiva)
Trump ordenou que os agentes de imigração expandissem o escopo das deportações. Ele visa retirar concessões federais das chamadas cidades-santuário (onde imigrantes sem documentos não são processados) e que imigrantes suspeitos de um crime sejam detidos, mesmo sem acusação. Trump pretende contratar 10 mil novos agentes e publicar um relatório sobre crimes cometidos por imigrantes sem documentação.
Foto: picture alliance/AP Images/G. Bull
Construir o muro (ordem executiva)
Numa ordem executiva assinada em 25 de janeiro, Trump solicitou "a construção imediata de um muro físico", a fim de proteger a fronteira entre México e EUA. Ele também se referiu aos imigrantes sem documentos como "deportáveis", dizendo que o Poder Executivo deve "acabar com o abuso das disposições de liberdade condicional e refúgio usadas para impedir a remoção legal de estrangeiros deportáveis."
Foto: Getty Images/AFP/S. Huffaker
Veto a muçulmanos (ordem executiva)
Trump assinou este controverso decreto em 27 de janeiro. Ele proibiu pessoas de sete países de maioria muçulmana de entrar nos EUA por três meses, suspendeu indefinidamente o programa de refugiados sírios e suspendeu a admissão de refugiados por 120 dias. Protestos contra a ordem estouraram em todo o país e até mesmo os senadores republicanos John McCain e Lindsey Graham criticaram a medida.
Foto: DW/M. Shwayder
EUA deixam TPP (memorando)
Não foi nenhuma surpresa Donald Trump ter abandonado a Parceria Transpacífico (TPP). Durante a campanha, ele criticou frequentemente o TPP e a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), afirmando que outros países se beneficiaram desses acordos comerciais, em detrimento dos EUA. O porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, disse que Trump prefere lidar individualmente com os países.
Foto: Getty Images/AFP/
Sinal verde para oleodutos (memorando)
Três memorandos diferentes – um sobre a construção do oleoduto Dakota Access, outro sobre a continuação da construção do oleoduto Keystone e uma terceira ordem sobre o uso de materiais americanos nas obras – foram emitidos no quarto dia de Trump no governo. Obama tinha negado licenças para ambos os oleodutos após protestos em massa de ambientalistas, que temem o impacto de eventuais vazamentos.
Foto: REUTERS/S. Keith
Expandir as Forças Armadas (memorando)
Trump cumpriu sua promessa eleitoral de investir num Exército maior ao assinar na sua primeira semana no cargo um memorando que pede mais tropas, navios de guerra e um arsenal nuclear modernizado. Quatro dias antes ele ordenou congelar a contratação de civis em agências federais por até 90 dias, para que seu governo possa desenvolver um plano de longo prazo para encolher a força de trabalho.
Foto: Reuters/K. Pempel
Steve Bannon no NSC (memorando)
Trump ordenou uma revisão do Conselho de Segurança Nacional (NSC) para elevar o papel de Stephen Bannon. Trump retirou vários membros do painel responsável por tomar decisões de política externa, enquanto seu estrategista-chefe – conhecido por opiniões de extrema direita – servirá no comitê geralmente preenchido por generais. Isso rompe com a norma de longa data de não nomear políticos para o NSC.
Foto: pciture-alliance/AP Photo/E. Vucci
Desregulamentações (executiva e memorando)
Trump quer que agências federais eliminem ao menos duas normas para cada nova regulamentação e ordenou o congelamento de regulamentações federais, até que um chefe de departamento designado por ele possa revisá-las. Ele também pediu pela rápida aprovação de "projetos de infraestrutura de alta prioridade". Na campanha, Trump disse que o "excesso de regulamentações" feriu o comércio americano.
Foto: Getty Images/AFP/M. Ralston
Precedente presidencial
Obama emitiu um total de 277 ordens executivas – uma média de quase três por mês e um pouco menos do que seu antecessor, George W. Bush (291). Obama assinou 644 memorando presidenciais para contornar imposições no Congresso – um precedente do qual Trump aparenta estar tirando proveito, embora a maioria em ambas as Casas do Congresso seja republicana.