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O punk da Alemanha Oriental revisto

Jane Paulick (rr)31 de agosto de 2005

Nem mesmo a ex-Alemanha Oriental foi poupada da explosão do movimento punk no final da década de 70. Mas, como mostra uma exposição em Berlim, ser punk sob a ditadura comunista tinha um significado bem diferente.

Retratos da geração 'no future' no LesteFoto: presse

Quando Michael Böhlke, também conhecido como Pankow, subiu ao palco durante a abertura da primeira exposição alemã sobre o movimento punk da ex-Alemanha Oriental, na última sexta-feira (26/08), foi como se os últimos 25 anos nem tivessem existido. Ele e seus companheiros de banda fizeram tremer as paredes.

"Aquilo me fez sentir tão bem. Eu percebi que nasci para tocar", disse ele mais tarde. Mas, enquanto bandas punk da Alemanha Ocidental puderam se estabelecer e criar um renome – como Die Toten Hosen, Die Ärtzte e Einstürzende Neubauten, para citar apenas algumas –, Pankow nunca conseguiu uma carreira de sucesso.

Como muitos punks da antiga RDA (República Democrática Alemã), seu envolvimento com a contracultura teve conseqüências. No fim dos anos 80, ele foi proibido de estudar direção teatral e teve que se contentar com a formação de mecânico. Sua namorada na época, Jana – cujas fotos estão à mostra na exposição –, foi mandada para a prisão por sua atitude punk e guarda o trauma até hoje.

"Eu era mais um hippie"

Enojado pela recente moda da Ostalgie, a nostalgia pela vida atrás do Muro de Berlim e na RDA em geral, Pankow decidiu organizar uma mostra para documentar a história do punk sob a ditadura comunista. O resultado mostra algo inesperado. Se na Alemanha Ocidental o punk era descartado pela sociedade por seu caráter niilista, na RDA punks eram cheios de otimismo e de um anseio de mudar a sociedade.

Foto: presse

"Quando eu olho para trás, vejo que eu era mais um hippie", admite Pankow, encolhendo os ombros. "Eu tinha uma visão, era cheio de esperança de que as coisas pudessem melhorar. Nós não tomávamos drogas, nem bebíamos – pensávamos que éramos melhores que os outros e, como todos na RDA bebiam cerveja como se não houvesse amanhã, optar pelo chá era uma forma de se rebelar."

Mas também era um movimento muito envolvente. "O punk no Leste era um fenômeno transcultural", explica Pankow. "A tristesse da RDA gerava um enorme potencial criativo e, no momento em que você cruzava as margens da sociedade, você caía em uma outra rede de atividades artísticas."

A profundidade cultural do punk no Leste está bem retratada na exposição. Num velho armazém industrial no bairro de Prenzlauer Berg, na parte leste da cidade, estão reunidos pinturas, objetos de arte gráfica, fotografias, filmes em super 8, colagens, gravações raras e uma miscelânea de objetos da cultura pop, como capas de discos, broches, flyers e pôsteres.

De jovem rebelde a pária político

Vista aérea da Alexanderplatz, lar de punks até hojeFoto: AP

Em 1979, Pankow era apenas mais um adolescente frustrado. "Eu ficava nervoso com meus pais, com a escola, com o Estado", conta. "Até que um dia vi uma foto do Johnny Rotten dos Sex Pistols na revista Bravo, e ele era a perfeita encarnação do que eu sentia. Daí eu me abaixei imediatamente e rasguei meu jeans."

No começo, ele era o único punk que conhecia. Mas o movimento logo ganhou adeptos, inspirado pelo desenvolvimento da cena inglesa. "Toda quinta-feira às duas da manhã, meus amigos e eu ouvíamos o programa do John Peel em nossos rádios transístores. A gente costumava perambular na praça Alexanderplatz [um dos marcos da ex-Berlim Oriental], pois sabíamos que era lá que ficavam os turistas, e nós queríamos ser vistos pelo maior número de gente possível."

Um risco consciente

Mas turistas não eram os únicos a fotografar os punks. Enquanto os discípulos dos Sex Pistols eram desacreditados pelo establishment inglês, na RDA isso significava ser perseguido e espionado pela polícia secreta e arriscar uma sentença penal.

"O punk se tornou inevitavelmente político com muita rapidez", disse Pankow. "Se você estava em alguma banda, tinha que solicitar uma permissão para poder tocar em público e se apresentar diante de um comitê que comprovaria sua competência musical, sua aparência e, acima de tudo, se você era politicamente aceitável. Os punks se recusaram a continuar fazendo isso, pois era considerado um compromisso."

Quando os jovens rebeldes começaram a fugir ao controle estatal, os punks deixaram de ser vistos apenas como adolescentes transviados e passaram a ser considerados inimigos do Estado. Até 1983, a polícia secreta já havia se infiltrado no movimento e a cena foi aos poucos invadida por informantes, seus membros forçados a optar entre cooperar, ir para a cadeia, ser expulso do país ou enviado ao serviço militar.

"Era assustador quantos colaboradores da Stasi [polícia secreta da RDA] havia na cena punk", lembra Pankow. Mas, mesmo que a cena tenha se desfeito entre acrimônia e decepção no mais tardar até a reunificação alemã em 1989, a abertura da exposição foi um evento comemorativo. "Algo como um reencontro de classe", disse Pankow, sorrindo.

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