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O que aconteceu com Lula?

Thomas Milz
Thomas Milz
30 de agosto de 2022

Depois de uma entrevista forte ao Jornal Nacional, o petista decepcionou no primeiro debate entre os presidenciáveis. Seria apenas nervosismo, cansaço ou algo mais grave?

"Pensei que o Lula fosse acordar depois da largada queimada. Mas, no decorrer do debate, ele foi parecendo até mais apático", escreve Thomas MilzFoto: Andre Penner/AP/dpa/picture alliance

Era o sonho de todos nós ver o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) entrando no mesmo ringue, para finalmente lutarem um contra o outro pela primeira vez. Não houve um duelo direto em 2018, pois Lula estava na cadeia. Agora, Bolsonaro até ameaçou não comparecer ao primeiro debate, na Band. Mas foi. E o Lula também.

Já vi Lula discursando para plateias inúmeras vezes ao longo dos anos. Ele é um mestre das palavras, da encenação do discurso. Vi o petista fazer até três discursos diferentes por dia durante as caravanas de campanha. Com esse mestre, o Bolsonaro não pode, pensei, esperando que o Lula fosse esmagar Bolsonaro com frases de efeito e sacadas rápidas.

Mas algo deu errado logo na primeira resposta de Lula. Bolsonaro tinha questionado o ex-presidente sobre corrupção. Óbvio que ele iria fazer isso. E Lula citou todas as leis e órgãos que criou para combater a corrupção. Quando chegou a citar o Coaf, pensei: agora vem o ataque à família Bolsonaro, um contra-ataque para jogar as "rachadinhas" na cara do presidente.

Mas nada. De repente, Lula estava falando sobre empregos que criou no seu governo. Nada a ver com o assunto corrupção. Parecia que o Lula tentava enterrar esse assunto. Mas, ao desviar do tema, ele parecia surpreendentemente fraco. Perdeu esse primeiro embate com Bolsonaro. De surpresa.

Pensei que o Lula fosse acordar depois da largada queimada. Mas, no decorrer do debate, ele foi parecendo até mais apático. Num certo momento, tinha a mesma expressão facial que meu pai quando fica com pressão baixa e desmaia. Será que o Lula não está bem de saúde? Ele teve um câncer na laringe em 2011. Foi curado. No fim do ano passado, apareceram boatos de que o câncer teria voltado, mas não foram apresentadas provas.

No debate entre os presidenciáveis, Lula se segurou. Teve até um momento forte, ao responder à Soraya Thronicke, candidata pelo União Brasil, que o mundo lindo que ele pinta existe, mesmo quando a senadora não o vê: "A senhora não viu melhora. Mas seu motorista e sua empregada doméstica viram." De resto? Nada de Lula.

Busca-se agora uma explicação pelo fraco desempenho do petista. Será que as perguntas o pegaram de surpresa? Pouco provável, são as mesmas perguntas que Lula ouve há anos. Pessoalmente, aposto em desgaste físico: estava com a voz rouca e visivelmente cansado. Trata-se, vamos lembrar, de um homem de 76 anos. Costumamos falar mal da "múmia" Joe Biden, de 79 anos. Mas Lula está apenas alguns anos atrás do presidente americano.

O debate muda o cenário eleitoral? Por enquanto não. Quem se saiu bem foram a Simone Tebet (MDB) e o Ciro Gomes (PDT), que têm 3% e 7% das intenções de voto, respectivamente, segundo a última pesquisa do Ipec. Lula ainda lidera a corrida, com entre 8 e 12 pontos percentuais de vantagem em relação a Bolsonaro, dependendo da pesquisa. Mas qualquer ponto que vai para a "terceira via" diminui as chances de liquidar a fatura já no primeiro turno.

Haverá, bem provavelmente, um segundo turno entre Bolsonaro e Lula. Já estou ansiosamente esperando pelo duelo entre os dois antes da votação final e decisiva. Desta vez, não vou tomar como garantida uma vantagem natural de Lula sobre Bolsonaro. A corrida continua em aberto, com uma vantagem significativamente grande de Lula. Mas as zebras parecem soltas.

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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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Realpolitik

Depois de uma década em São Paulo, Thomas Milz mudou-se para o Rio de Janeiro, de onde escreve sobre a política brasileira sob a perspectiva de um alemão especializado em Ciências Políticas e História da América Latina.