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O que aprendi no primeiro ano de Bolsonaro

18 de dezembro de 2019

A política, como a vida, é uma caixa de surpresas. Da China aos EUA, de Jerusalém a Washington, o primeiro ano do presidente Jair Messias Bolsonaro foi repleto delas, comenta o jornalista Thomas Milz.

Presidente Jair Bolsonaro com expressão preocupada
Bolsonaro deixou de implementar muitas promessas, aponta Thomas MilzFoto: Reuters/A. Machado

Abaixo os comunistas da China e Venezuela, ouvia-se por toda parte no fim de 2018. "Nossa bandeira jamais será vermelha", era o lema. Um ano depois, devo constatar, o mundo está bem diferente.

Nesse ínterim, os comunistas chineses se tornaram amigos íntimos do Brasil, até mesmo ajudando o governo Bolsonaro a evitar que o megaleilão do pré-sal se tornasse um megafracasso. E aposto que o grupo chinês Huawei em breve construirá a infraestrutura 5G do Brasil. Mesmo que os EUA sob Donald Trump se oponham veementemente.

Surpresas também foram vistas nos países vizinhos. Em vez do maligno socialista Nicolás Maduro em Caracas, de repente quem cambaleia é o neoliberal Sebastián Piñera, presidente do Chile; e seu colega argentino, Mauricio Macri, já se foi de vez. Até Evo Morales, o único esquerdista com uma boa conexão com Bolsonaro, um pragmático e sobrevivente nato, foi-se embora. Se alguém tivesse me afirmado isso no começo do ano, eu teria dito que era louco.

Mas a vida é cheia de surpresas – e também não é. A luta contra a corrupção, uma das bandeiras de Jair Bolsonaro na campanha eleitoral, foi rapidamente suspensa assim que caiu na mira o filho do presidente Flávio. Os laços de família são fortes no Brasil, quer na esquerda, quer na direita.

Mas o emprego dos sonhos de embaixador em Washington acabou não se concretizando para o outro filho do presidente, Eduardo. De qualquer forma, em 2019 ficamos sabendo que Eduardo fala mal inglês. Mas, uma vez que seu pai não fala nada da língua de seu país dos sonhos, os EUA, isso é algo que Jair não havia percebido, até agora.

Mas certo está que ele notou que os EUA de Donald Trump não são o esperado melhor amigo. Os contratempos nas "relações especiais" com o irmão mais velho do Norte atingiram duramente os Bolsonaros. Não só a orientação da política externa do governo precisou ser questionada, mas o futuro projeto de Eduardo Bolsonaro de um movimento de extrema direita baseado no The Movement, de Steve Bannon, também sofreu com a recusa amorosa americana. O evento de fundação do movimento acabou se revelando um fracasso, semelhante ao primeiro congresso dos terraplanistas brasileiros, algumas semanas depois.

Olavo de Carvalho, guru da família Bolsonaro residente nos Estados Unidos, também foi vítima da aproximação com a arqui-inimiga China. Em janeiro, ele criticara membros do partido presidencial PSL que haviam viajado para o Império do Meio. Agora o astrólogo mantém silêncio. As más línguas dizem que ele perdeu toda e qualquer credibilidade o mais tardar quando afirmou que o filósofo alemão Theodor W. Adorno foi o verdadeiro autor dos sucessos dos Beatles.

Por falar em PSL, poucas vezes se viu um presidente simplesmente implodir assim sua própria sigla, a que forma sua base do Congresso. Depois de passar 30 anos mudando de um partido para outro, como um nômade, Bolsonaro agora se atreve a fundar sua própria legenda personalizada.

Com os grupos do WhatsApp que o levaram ao cargo, ele não tem como fazer política no longo prazo. A "nova política" rapidamente bateu em seus limites, o discurso antissistema não basta mais. Bolsonaro precisa dos milhões do fundo partidário para moldar seu futuro político.

Será também uma questão de conteúdo? Até agora Bolsonaro não conseguiu implementar muito de sua "agenda de costumes". Ele não concretizou a Escola sem Partido nem o armamento de todos os cidadãos. Isso também se deve ao papel mais forte do Congresso, a quem Bolsonaro deu carta-branca na formulação de políticas.

Decisão planejada ou involuntária? Seja como for, ele até agora tem desapontado o campo evangélico, que o apoiou maciçamente em 2018. Ele não conseguiu realizar sequer a mudança da Embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, anunciada como um dos seus primeiros atos oficiais.

As maiores expectativas, contudo, foram depositadas no início do ano em Paulo Guedes, o "Posto Ipiranga" de Bolsonaro em questões de economia. Mas até agora não houve mudanças radicais em direção a uma sociedade eficiente e justa. Grandes assalariados e os privilegiados no Judiciário, política e entre os militares foram poupados da reforma da Previdência. Mas era de se esperar outra coisa?

E a privatização de empresas estatais como a Petrobras ainda está basicamente em aberto. Em vez disso, a gigante do setor energético foi mais uma vez instrumentalizada para fins políticos – por exemplo, para impedir uma greve dos caminhoneiros e evitar o fracasso do megaleilão do pré-sal.

Os saques do FGTS, destinados a estimular a economia, também são conhecidos de governos anteriores. A única novidade aqui é o fato de o ministro da Economia achar engraçado seu patrão insultar a esposa do presidente francês. Além disso, Guedes se revelou um apoiador de ideias autoritárias, como a reintrodução do AI-5.

Meus amigos me dizem que o Brasil se tornou ainda mais absurdo sob Jair Bolsonaro. "Estamos vivendo dentro de um tuíte de Carlos Bolsonaro", escreveu Anderson França, colunista da Folha. Mas me pergunto se o filho presidencial ainda está mesmo tuitando? Talvez eu tenha me acostumado de tal forma a essas surreais mensagens curtas, que atualmente elas nem me chamam a atenção.

Muitos eleitores de Bolsonaro estão agora percebendo que ele não produz nada além de muito palavreado, disse-me há alguns dias uma moradora de um bairro pobre da periferia de São Paulo. É para eu me espantar?

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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.

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