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O que deve mudar com a reforma trabalhista?

27 de abril de 2017

Projeto aprovado pela Câmara altera profundamente as relações trabalhistas no Brasil. Governo aposta em mais empregos, mas críticos apontam que mudanças sabotam sindicatos e Justiça do Trabalho.

Foto: picture alliance/dpa/S. Stache

Após uma série de embates entre governo e oposição e cerca de 14 horas de sessão, a Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (26/04) o controverso projeto de lei da reforma trabalhista, uma das prioridades do governo Michel Temer.

Foram 296 votos a favor e 177 contra (eram necessários 257). Ainda que não tenha alcançado os 308 votos pretendidos pelo governo – um sinal de que teria apoio suficiente para aprovar a Reforma da Previdência, que exige um quórum maior –, o Planalto celebrou a vitória. A reforma trabalhista segue agora para o Senado.

O texto é defendido pelo governo Temer como uma forma de flexibilizar a legislação, corrigir distorções e facilitar contratações. Já os críticos afirmam que ele vai precarizar ainda mais o mercado de trabalho e enfraquecer a Justiça trabalhista. Também apontam que a promessa de criar mais empregos é uma miragem. No total, o projeto mexe em cem pontos da legislação. Veja abaixo as principais mudanças:

Acordos coletivos prevalecem sobre a legislação

A espinha dorsal do projeto é estabelecer que acordos coletivos negociados entre trabalhadores e empresas prevaleçam sobre previsões da CLT. Esses acordos podem contemplar um total de 40 pontos.

Dessa forma, será possível negociar jornadas maiores, de até 12 horas diárias, desde que elas não somem mais de 220 horas mensais (contando as horas extras). Hoje o limite é 44 horas semanais, com no máximo 8 horas de trabalho por dia.

O período de férias também poderá ser fatiado em até três vezes. Também está previsto que as "horas in itinere", o tempo de deslocamento até o trabalho, possam ser ignoradas por meio de acordo, não cabendo pagamento pelo período.

Outros pontos que podem envolver negociação: parcelamento da participação nos lucros e resultados (PLR); plano de cargos e salário; estabelecimento de intervalos durante a jornada; prorrogar acordo coletivo após expiração; banco de horas; remuneração por produtividade; e registro de ponto.

Estão fora de qualquer possibilidade de negociação: normas de segurança; direito de greve; FGTS; salário mínimo; licenças-maternidade e paternidade; e aposentadoria, entre outros pontos.

Entidades sindicais criticaram a proposta, que efetivamente enfraquece a posição dos sindicatos, que poderão ser substituídos por comitês de trabalhadores dentro das empresas. O Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), afirma que essas novas formas de representação de trabalhadores têm "maior possibilidade de sofrer interferência do empregador".

Fim da obrigatoriedade da contribuição sindical

Atualmente, o pagamento da contribuição equivale a um dia de trabalho, obrigatoriamente descontado em folha de pagamento e remetido para entidades de classe da área do trabalhador, independentemente de ele ser sindicalizado ou não. Pela proposta, a contribuição sindical se torna facultativa.

Hoje há 5.190 sindicatos de empregadores e 11.327 sindicatos de trabalhadores. Eles recolhem 3,6 bilhões de reais anualmente. O relator do projeto, Rogério Marinho (PSDB-RN), disse que já estava mais do que na hora de acabar com a obrigatoriedade. "A contribuição sindical tem inspiração claramente fascista, uma vez que tinha como principal objetivo subsidiar financeiramente os sindicatos para que dessem sustentação ao governo", afirmou.

Centrais sindicais como a CUT defendem a extinção da obrigatoriedade, mas pediram que isso fosse imposto de maneira gradual, permitindo que os sindicatos pudessem se adaptar. "Para que seja um fator de fortalecimento dos sindicatos e não de sua destruição", afirmou a CUT em comunicado.

Trabalho intermitente e home office

O projeto cria duas novas modalidades de emprego. Uma delas é o intermitente, em que o trabalhador é pago pelo serviço efetivamente efetuado. Dessa forma, poderá trabalhar apenas algumas horas por dia ou alguns dias por semana, desde que isso seja negociado. O valor da hora não poderá ser inferior ao que é pago aos empregados regulares da empresa.

Atualmente a CLT prevê apenas a contratação parcial, cuja duração não deve passar de 25 horas semanais. Mesmo a contratação parcial deve passar por mudanças, passando a contemplar horas extras e aumentando o limite da carga para 30 horas mensais.

Crítica da proposta, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) disse que isso é a "institucionalização do 'bico'". Deputados da oposição apontaram que a extensão do contrato parcial vai permitir que trabalhadores sejam contratados para exercer funções que deveriam ser provisórias ou temporárias de modo quase integral.

Já o chamado home office, ou teletrabalho, estabelece regras para quem atuar remotamente. A modalidade deverá constar no contrato de trabalho, que vai especificar as atividades desempenhadas pelo contratado. O documento deverá fixar responsabilidade sobre aquisição e manutenção dos equipamentos. As despesas ficam por conta do empregador.

Dificultar ações trabalhistas e enfraquecer Justiça do Trabalho

O projeto dificulta que trabalhadores possam ingressar com ações judiciais. Pelo texto, se o empregado assinar a rescisão contratual, ficará impedido que questioná-la posteriormente. Também limita em oito anos o prazo de tramitação processual. Se até lá a ação não tiver sido concluída, será extinta.

O projeto também prevê uma multa para trabalhadores que ingressarem com ações por "má-fé", e que o ingresso de uma ação judicial só pode acontecer depois de uma prévia de conciliação entre as partes. Se a ação for mesmo adiante, quem entrar com ação será responsabilizado pelo pagamento de honorários periciais, que normalmente são cobertos pelo poder público.

A rescisão do contrato de trabalho também poderá ser feita sem a participação dos sindicatos, na própria empresa, apenas com a presença dos advogados do patrão e do empregado.

A reforma também estabelece um teto para alguns pedidos de indenização. "Ofensas graves" cometidas por empregadores devem ser de no máximo "cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido". Até a reforma era papel dos juízes estipular o valor. Segundo o Diap, a Justiça do Trabalho também "perderá a razão de existir, já que a lei só poderá ser aplicada caso não haja acordo ou convenção coletiva dispondo de modo diferente".

Demissão em comum acordo

O texto inclui a possibilidade de demissão em comum acordo entre empregado e empregador. Nessa modalidade, o empregador pode pagar metade do aviso prévio. O trabalhador também poderá movimentar 80% do FGTS, mas não terá direito ao seguro-desemprego.

Gestantes em trabalho insalubre

Gestantes poderão trabalhar em ambientes considerados insalubres (como hospitais) desde que apresentem atestado médico comprovando que não há risco para ela ou o feto.

Terceirização

Em março, Temer sancionou a controversa lei que permite a terceirização de todas as atividades de uma empresa. O texto da reforma trabalhista impõe algumas salvaguardas para o trabalhador terceirizado. Estabelece uma "quarentena" para impedir que o empregador demita um trabalhador efetivo para recontratá-lo como terceirizado em menos de 18 meses.

Mas o projeto também oficializa a lei da terceirização, preservando quase todos os seus pontos. O projeto já sancionado foi criticado por oferecer a possibilidade de sabotar o direito de greve (permite contratar temporários se os efetivos pararem), promover a "pejotização" em todos os setores e expandir empregos precários.

Em 2013, uma pesquisa do Dieese apontou que trabalhadores terceirizados recebiam em média 24,7% a menos que os contratados em regime de CLT e trabalhavam três horas a mais. O Ministério Público do Trabalho também advertiu que a terceirização no setor público "abre caminho para o retorno do nepotismo" em órgãos de governo, apontando que parentes ou apadrinhados de políticos poderão usar a lei como brecha.

Multas

Antes do projeto, o empregador que mantinha trabalhadores sem registro estava sujeito a multa de um salário mínimo regional, por empregado, acrescido de igual valor em cada reincidência. Com o projeto, o valor passa a ser de 3 mil reais para cada empregado não registrado nas grandes empresas e de 800 reais para as micro e pequenas empresas.

O texto aprovado pela Câmara também prevê multa a empresas que comprovadamente discriminarem, de acordo com sexo ou etnia, empregados que desempenhem a mesma função e pelo mesmo tempo de serviço. Nestes casos, o empregador terá de pagar 50% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, além das diferenças salariais devidas.

Bônus

A Justiça do Trabalho normalmente considerava prêmios concedidos ao trabalhador pelo empregador como parte do salário. Dessa forma, incidiam encargos previdenciários sobre esses prêmios. Com a reforma, eles deixam de ser considerados parte do salário.

 

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