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O que diz nova lei de autodeterminação de gênero da Alemanha

Roberto Crescenti
Publicado 24 de agosto de 2023Última atualização 14 de abril de 2024

Legislação aprovada pelo Parlamento simplifica mudança de nome e sexo no registro civil. Qualquer pessoa maior de idade poderá solicitar as alterações, sem necessidade de laudos ou decisão judicial.

Casal vestindo roupas com as cores do arco-íris e mochila com o dizer "Pride" (orgulho) na Christopher Street Day de Berlim, em 2022
Foto: Dan Herrick/REUTERS

O Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão) aprovou nesta sexta-feira (12/04) a chamada Lei de Autodeterminação de Gênero, que permitirá a uma pessoa modificar seu nome e seu sexo no registro civil com uma simples declaração de vontade.

A aprovação elimina a exigência de um laudo pericial, como vinha ocorrendo até agora. A partir de 1º de novembro, as mudanças poderão ser realizadas através de um simples procedimento nos cartórios do registro civil do país. 

A lei é voltada para pessoas transexuais, intersexuais e não binárias. Segundo a nova legislação, transexuais são pessoas que não se identificam com o sexo com o qual foram registradas no nascimento. Intersexuais são pessoas que tem características físicas que as impedem de serem claramente identificadas como "(apenas) masculinas ou (apenas) femininas". Não binário é uma autodesignação para pessoas que não se identificam nem como homens nem como mulheres.

Como era

Pela lei anterior, de 1980, quem deseja alterar o sexo registrado deveria apresentar dois laudos psicológicos diferentes e aguardar decisão judicial. Muitas pessoas trans já reclamaram que esse processo é burocrático, oneroso e também discriminatório, por incluir perguntas de caráter íntimo.

O Tribunal Federal Constitucional (suprema corte alemã) já havia determinado que vários trechos da lei de 1980 eram inconstitucionais.

Como fica

Com a nova lei, qualquer cidadão maior de idade pode dirigir-se a um cartório do registro civil e solicitar a alteração. Há tempo para reflexão, pois só depois de três meses é que a mudança passa a valer. O registro poderá ser novamente alterado após um ano.

Os menores de idade poderão modificar o sexo registrado com o consentimento dos pais a partir dos 14 anos, enquanto abaixo dessa idade serão os pais que poderão fazer a alteração se a considerarem conveniente.

A reforma também previne que o sexo anterior de uma pessoa seja revelado contra a vontade dela, sob pena de multa. No entanto, o governo diz que há exceções para impedir que a lei seja usada por pessoas que querem escapar de processos criminais alterando seu nome e sexo.

Questão de dignidade

Defensores dos direitos dos transsexuais afirmavam que a lei ainda em vigor resultava em humilhações, com as pessoas forçadas a serem submetidas a avaliações psicológicas e questionamentos íntimos.

"Como pessoas trans, vez após vez vivemos a experiência de que nossa dignidade é um tema de negociação", afirmou nesta sexta a parlamentar do Partido Verde Nyke Slawik, uma mulher trans que realizou as mudanças de gênero e nome sob a lei atual.

"É difícil colocar em palavras o que essa lei significa para os aguardaram durante anos para que ela fosse aprovada", afirmou Kalle Hümpfner do grupo de defesa dos diretor LGBTQ+ Bundesverband Trans.

Debates acalorados e desinformação

A votação no Bundestag foi disputada e, por vezes, emocional. Ao final, a lei foi aprovada por 374 votos a 251, com o apoio dos partidos da coalizão de governo – o Partido Social-Democrata (SPD), do chanceler federal da Alemanha, Olaf Scholz; o Partido Liberal Democrático (FDP) e os Verdes – e pelo A Esquerda.

Votaram contra os conservadores da União Democrata Cristã (CDU) e da União Social Cristã (CSU), assim como os membros do partido ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD) e da aliança populista de esquerda BSW, liderada por Sahra Wagenknecht.

Os conservadores disseram temer que a nova lei possa permitir que no futuro as pessoas mudem de gênero de maneira arbitrária. O parlamentar da AfD Martin Reichardt classificou a legislação como um "absurdo ideológico" levado adiante por "extremistas trans". 

O comissário do governo alemão para temas LGBTQ+, Sven Lehmann, afirmou que a lei ainda em vigor "viola a dignidade humana". Ele considera que a nova proposta é relativamente simples e bastante popular, "apesar de um debate acalorado e de campanhas de desinformação".

Após passar pelo Bundestag, a nova lei não precisará ser submetida à aprovação no Bundesrat (câmara alta do Parlamento).

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