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O que esperar da AfD no Parlamento alemão?

Jefferson Chase jps
24 de outubro de 2017

Comportamento dos membros do partido populista de direita em parlamentos estaduais dá indicações de como seus representantes vão agir em Berlim. Veja o que se deve esperar nos próximos quatro anos.

Bernd Baumann no primeiro discurso da AfD no Parlamento alemão
Bernd Baumann no primeiro discurso da AfD no Parlamento alemãoFoto: Reuters/F.Bensch

O Parlamento alemão se reuniu nesta terça-feira (24/10) pela primeira vez desde as eleições de setembro, com os deputados eleitos já em suas cadeiras.

É a primeira vez em décadas que o Bundestag têm um partido populista de direita em suas fileiras, no caso a legenda Alternativa para a Alemanha (AfD).

O que se deve esperar do partido nos próximos quatro anos?

Projetos de lei: poucas chances

A AfD não será capaz de aprovar qualquer legislação própria. Os partidos governistas na Alemanha, em sua posição de maioria, não precisam aprovar projetos de partidos da oposição, e eles com certeza não vão abrir uma exceção para um partido que tem em suas fileiras populistas de direita.

Diante desse quadro, os deputados da AfD devem aproveitar as sessões parlamentares do Bundestag para fazer barulho, direcionando a discussão a temas que lhes são caros: refugiados, lei e ordem e a alegada "islamização da Alemanha".  

"A presença da AfD nos parlamentos estaduais já expandiu o debate para incluir posições políticas que estão à direita da União Democrata-Cristã (CDU) de Merkel”, diz Alexander Hensel, do Instituto para a Pesquisa da Democracia da Universidade de Göttingen. "Para os partidos do Bundestag, isso vai representar um desafio sério com os quais eles vão ter que aprender a lidar.”

O que é populismo?

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A estratégia da AfD vai englobar o que Hensel chama de "cuidadosas e ensaiadas quebras de tabus”, incluindo comentários sobre refugiados, muçulmanos e a história alemã. Esses comentários não serão direcionados para seus colegas no Bundestag, mas a um público mais amplo, especialmente na internet.

"Sessões parlamentares serão usadas para alimentar as redes sociais com controvérsias e possibilidades de escalada”, escreve Fedor Ruhose, um líder do Partido Social-Democrata (SPD) no estado da Renânia-Palatinado, em um documento que sugere como lidar com os populistas. "Os deputados da AfD tendem a assumir posições de pouco destaque em comissões não abertas ao público ou que despertem pouca atenção da mídia. Ou eles simplesmente nem comparecem.”

Partidos tradicionais: como reagir

A tarefa dos partidos é encontrar um equilíbrio. De acordo com Ruhose, há um reconhecimento generalizado de que, em sua posição de partido eleito democraticamente, a AfD deve receber os privilégios parlamentares convencionais, como vagas em comissões e uma vice-presidência do Bundestag.

O político também adverte que os deputados da AfD não devem ser ridicularizados ou interrompidos, já que isso só vai estender o tempo de fala deles e reforçar sua imagem de outsiders que lutam de maneira nobre contra o establishment.

Espere também ver mais deputados comparecendo aos debates gerais. Na batalha pela influência na percepção do público, a superioridade numérica é importante. "Nossos deputados vão se sentar aqui”, disse Ruhose a jornalistas em Berlim em 17 de outubro após um encontro do SPD que discutiu estratégias.

Ao mesmo tempo, ele diz que é importante não aceitar tudo que os deputados da AfD venham a dizer.  "Há linhas que não podem ser ultrapassadas”, afirma Ruhose. "Deve ser comunicado claramente que a ala extremista da AfD que agora ocupa lugares no Bundestag não tem lugar na política convencional.”

Quando a linha fora ultrapassada 

Essa tarefa é do futuro presidente do Bundestag – o veterano conservador Wolfgang Schäuble – e dos vice-presidentes, que tradicionalmente são indicados por cada partido representado no Parlamento.

Esses funcionários asseguram que o Bundestag não se desvie de sua agenda. Eles podem ainda punir membros que interromperem os procedimentos. As punições vão de uma advertência oral até uma suspensão temporária do direito de participar de discussões parlamentares.  

Wolfgang Schäuble, da CDU, é quem vai decidir quando uma linha foi ultrapassada. Foto: picture-alliance/dpa/K. Nietfeld

Muitas pessoas apostam que Schäuble vai ter muita dor de cabeça com a AfD, já que muitos dos deputados do partido são completos novatos na política parlamentar. Mas a experiência no estado da Saxônia sugere que as coisas podem vir a ser mais civilizadas do que em episódios prévios com outros partidos de direita. 

"Nos últimos dois anos e meio da atual legislatura, apenas três deputados foram advertidos: dois do partido A Esquerda e um da AfD”, diz Ivo Klatte, porta-voz do Parlamento da Saxônia. "Para efeito de comparação, quando o partido de extrema direita NPD ocupou cadeiras em duas legislaturas, mais de 70 deputados foram advertidos e alguns deles foram suspensos por vários dias.”

Klatte acrescenta que o presidente do Parlamento e seus ajudantes têm espaço de manobra para definir o que é um discurso aceitável, mas que o racismo não é tolerável.   

"O presidente ou um vice-presidente sempre vão intervir durante um discurso com insultos a indivíduos ou discriminação contra algum grupo de pessoas”, diz Klatte.

O que se deve temer

Hensel, que coescreveu um estudo sobre a trajetória da AfD em três parlamentos estaduais, disse que os "inimigos puros” dos populistas de direita são os membros do Partido Verde. Mas os ataques dos membros da AfD costumam ser direcionados aos deputados do grupo que eles consideram como um "oponente político”: a conservadora CDU e o braço bávaro da sigla, a CSU.

"A AfD cultiva, especialmente no oeste da Alemanha, a imagem de sucessora ou herdeira legítimo do conservadorismo alemão pré-Merkel”, disse Hensel. "É por isso que a AfD concentra particularmente seus ataques contra a CDU e tenta explorar feridas ainda abertas.” 

Segundo Hensel, no nível estadual, os populistas foram bem-sucedidos em se apoderar de temas que antes eram considerados como de competência dos conservadores, como a lei e a ordem. "Estruturalmente, a AfD pode exercer uma pressão especial sobre a CDU porque o partido conservador costumava defender uma série de posições hoje defendidas pelos populistas, e alguns desses temas ainda são relevantes para os eleitores”, disse. 

O papel da oposição

Tradicionalmente, partidos de oposição no Bundestag encaram seus papéis como de críticos do governo, sem se preocupar com outros partidos opositores. Mas os sociais-democratas e a A Esquerda devem passar a se ocupar de colocar a AfD em seu devido lugar.

"Poderá ocorrer facilmente a formação de uma frente multipartidária contra a AfD no Parlamento”, diz Hensel. "Isso tornará mais difícil para o SPD se destacar como um líder da oposição. O desafio do SPD é se opor à AfD por um lado ao mesmo tempo em que marca posição contra o governo.”  

A oposição, adverte Hensel, vai precisar evitar a armadilha de transformar todos os debates em um duelo da AfD contra todos os partidos tradicionais, algo que pode vitaminar a aura rebelde dos populistas.

Por fim, Hensel diz que a própria AfD é um grupo heterogêneo e que a sigla pode ter dificuldade em transpor a sua própria divisão entre "moderados”, que são críticos da atual política migratória, e a ala extremista, que prega o nacionalismo étnico:

"É certo que vamos ver no futuro uma série de conflitos internos na bancada da AfD no Bundestag.”

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