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O que esperar do primeiro dia do terceiro governo Lula?

Retrato de Magna Inácio, cientista política e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Magna Inácio
30 de dezembro de 2022

Lula aproveitou cada minuto da transição para ampliar seu capital político. Ele sabe que a divisão no país poderá chamuscar sua liderança se não demonstrar rapidamente a força do seu governo, escreve Magna Inácio.

Foto: Lincon Zarbietti/dpa/picture alliance

A posse do governo Lula ocorre no próximo domingo, iniciando a fase de lua-de-mel da nova presidência. Nesses primeiros 100 dias de governo, os presidentes eleitos usam o seu capital político, votos e popularidade, para tomar decisões e ampliar o apoio às suas ações no comando do país.

É também um período em que partidos e políticos dão "um tempo" ao presidente e ver para onde sopram os ventos da nova gestão. O sucesso nos 100 dias, embora não seja garantia de nada, pode afetar os humores de muitos, para o bem ou para o mal. O que esperar da lua-de-mel de Lula a partir do dia 1 do governo?

O presidente sabe bem qual é o tamanho do seu capital político. Lula aproveitou cada minuto da transição presidencial para ampliá-lo e tentar convencer a todos dos ganhos que ele pode gerar. Mas o presidente eleito também sabe da divisão política no país que poderá chamuscar a sua liderança política se não demonstrar rapidamente a força do seu governo. Por isso, a fase inaugural do governo Lula será muito diferente daquelas vividas em 2003 e 2007.

A alternância na presidência costuma impulsionar mudanças expressivas nessa fase de lua-de-mel, principalmente quando ocorre uma dupla alternância, partidária e ideológica. Nos primeiros 100 dias do primeiro mandato presidencial, Collor (1990) FHC (1995) e Lula (2003) foram os que mais utilizaram medidas provisórias e decretos infralegais para marcar essa alternância. Em 2003, Lula editou 12 medidas provisórias e 134 decretos numa alternância muito mais suave se comparada à sucessão de um governo de extrema-direita de Bolsonaro que acontece agora.

Isso cobra sinais inequívocos e mais fortes de mudança e Lula não esperou o dia 1 do governo para correr atrás disso. A "transição de portas abertas" e o perfil dos 37 nomeados para o gabinete presidencial já dão mostras da reorientação das políticas públicas. Mas isso irá demandar, a partir de agora, a revisão de decisões de Bolsonaro e a inovação das próprias agendas dos governos anteriores do PT. Uma vez subida a rampa, as agendas legislativa e administrativa se tornam os desafios da lua-de-mel do governo Lula.

As iniciativas legislativas do Executivo, editadas quando o Congresso está em recesso em janeiro, são primeiros sinais das políticas prioritárias do governo, mas também da relação entre eles. As medidas provisórias (MP), decretos com força de lei, têm um papel importante para mostrar a que veio o governo. A MP no. 1, que mexe nos organogramas da Esplanada e Planalto, diz sobre quem ganha e quem perde mais do que o mero status de ministra ou ministro. É por meio dessas mexidas que o presidente estabelece hierarquias de poder e dá a estatura real dos ministros e partidos no seu governo.

Com o patrocínio da emenda constitucional 126, o presidente desobstruiu parcialmente a agenda legislativa, contornando os riscos de uma queda de braço com o Congresso logo na partida do governo. Isso abriu espaços para agendas mais positivas e as primeiras medidas provisórias devem se concentrar na reorientação de políticas prioritárias do novo governo.

A revisão de políticas do governo Bolsonaro deve ocupar apenas parte dessa agenda legislativa. A razão disso é que Bolsonaro, dada a sua fragilidade no Congresso, fez dos decretos administrativos unilaterais a sua arma para mudar políticas e diretrizes governamentais. O gabinete de transição anunciou o "revogaço" ou a revisão administrativa dos decretos de Bolsonaro, dado que o presidente tem a prerrogativa de suspender ou alterar tais atos. Quando esses são utilizados abusivamente, mais numerosos serão os decretos para alterá-los, como fez o presidente Biden ao revisar as decisões administrativas e unilaterais de Trump. Algo como "quem com o ferro fere, com o ferro será ferido".

Se a lua-de-mel é importante pelos sinais que emite, vale uma ressalva. A revisão das políticas do governo que sai, por mais que sejam necessárias, vai além da sua revogação pela via legislativa ou administrativa. Não se trata de colocar, novamente, o gênio dentro da lâmpada. Calibrar os esforços de revisão dos atos do governo anterior e a construção de novas políticas pode ser o caminho mais efetivo para dar mais sustentabilidade e legitimidade às políticas vitoriosas nas urnas. Afinal, a lua-de-mel na política tem, digamos, um sentido especial. Ela não se contenta em reforçar os laços entre os parceiros, mas, ao contrário, trata de conquistar novos. Um feito que pode fazer toda a diferença no Brasil a partir de 2023.

Planaltices é uma coluna semanal sobre política brasileira. Os textos são escritos por colaboradores do grupo de pesquisa PEX (Executives, presidents and cabinet politics), vinculado ao Centro de Estudos Legislativos (CEL) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordenada pela cientista política e professora da UFMG Magna Inácio, a coluna é publicada simultaneamente pela DW Brasil e repercutida no blog do PEX

O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.

Magna Inácio Cientista política e professora da UFMG e coordenadora da coluna Planaltices.
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Esta coluna é uma parceria da DW Brasil com o PEX, núcleo de estudos sobre presidencialismo institucional da UFMG e capitaneado por Magna Inácio.