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O que está em jogo na reforma da Previdência

Nathalia Tavolieri
8 de dezembro de 2016

O pagamento de aposentadorias, pensões e benefícios tornou-se insustentável aos cofres públicos. Entenda as principais mudanças previstas na PEC 287, proposta pelo governo federal.

Indústria
Foto: picture-alliance/ dpa

O deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), o relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/16 entregou nesta quinta-feira (08/12) parecer favorável ao texto que estabelece as novas regras para a reforma da Previdência. As mudanças, apresentadas nesta semana pelo governo federal, estabelecem novas regras sobre a idade e o tempo de contribuição mínimos para a aposentadoria.

A proposta deve ser analisada na semana que vem pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), que vai verificar a constitucionalidade das novas regras. Se aprovada, a PEC 287/16 seguirá para análise no Congresso Nacional.

Por que uma reforma é necessária?

O Brasil está envelhecendo. A cada ano, mais brasileiros se aposentam e menos trabalhadores, os pagadores de impostos, ingressam no mercado de trabalho. Isso torna mais difícil para o governo garantir o pagamento de aposentadorias e pensões sem prejudicar investimentos em outros setores importantes do país.

De acordo com as estimativas do governo federal, se nenhuma reforma na Previdência for adotada, o déficit do Instituto Nacional do Seguro Nacional (INSS) chegará a 149,2 bilhões de reais, o equivalente a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2017, o rombo deve atingir 181,2 bilhões de reais. Com a reforma da Previdência, o governo federal estima, a partir de 2018, uma economia de 740 bilhões de reais nos próximos dez anos.

O Brasil gasta quase 12% do PIB com aposentadorias, pensões e benefícios. "É um valor parecido com o de outros países desenvolvidos, ricos e velhos, coisa que não somos ainda", afirma o especialista em previdência do IPEA e do Instituto Millenium Paulo Tafner. "Países com pirâmide demográfica similar à brasileira gastam entre 3% e 6% com Previdência."

Como os gastos no setor são maiores do que as arrecadações, o governo precisa usar dinheiro que poderia ser convertido em investimentos essenciais ao país para financiar aposentadorias, pensões e benefícios – muitas vezes destinados a aposentados na faixa dos 50 anos (a média nacional da idade mínima para aposentadoria é de 54 anos, uma das mais baixas do mundo), e de classe média. "O sistema previdenciário brasileiro age como um Robin Hood às avessas", afirma Tafner.

Críticas às novas regras

Apesar do consenso de que é necessária uma reforma na Previdência, há divergências sobre como e que mudanças devem ser introduzidas. Entre os maiores críticos da proposta apresentada pelo governo federal estão as forças sindicais.

Para o presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical (Sindnapi), Carlos Ortiz, a reforma da Previdência é necessária, mas da forma como foi apresentada é uma "afronta" ao trabalhador brasileiro. "As novas regras vão prejudicar quem está trabalhando agora, os trabalhadores rurais e quem está para se aposentar", diz Ortiz. "O governo quer dificultar a possibilidade de os brasileiros se aposentarem e usufruírem de um benefício conquistado em anos de dedicação."

Os sindicalistas argumentam que as novas regras tratam de forma igual trabalhadores com perfis muito diferentes. "Não dá para colocar num mesmo grupo o filho de um trabalhador pobre que começou a trabalhar antes dos 16 anos, sob condições extremamente difíceis, e o filho de um médico que entrou no mercado de trabalho com carteira registrada aos 25 anos", afirma Carlos Ortiz.

Na leitura do presidente da Sindnapi, a aprovação das novas regras levaria muitos brasileiros a deixar de contribuir com a Previdência. "O trabalhador vai pensar muito antes de começar a contribuir, porque vai precisar trabalhar 49 anos para receber o benefício." Para Ortiz, além da redução de trabalhadores com carteira assinada, as novas regras incentivarão trabalhadores de classes mais altas a recorrer para planos de aposentadoria privada.

Na análise de Tafner, caso a reforma da Previdência não seja aprovada, a PEC do Teto dos Gastos, que prevê o congelamento dos gastos públicos, não será capaz de impedir o agravamento da crise econômica, acompanhada do retorno da inflação alta, da recessão econômica e do desemprego. "Não mudar as regras atuais seria um desastre para a economia brasileira e as gerações futuras pagarão um preço altíssimo por isso." Segundo o especialista, não adianta congelar as despesas públicas sem reduzir os gastos previdenciários. "Sem a reforma da Previdência, a PEC do Teto dos Gastos não se sustenta."

Entenda o que propõe a nova lei:

- Tempo de contribuição e idade de aposentadoria

Para poder se aposentar, o trabalhador terá de contribuir por pelo menos 25 anos e ter idade mínima de 65 anos para ter direito a 76% do valor integral.

A partir desses 25 anos mínimos, a cada novo ano que contribuir, o trabalhador terá direito a um ponto a mais no percentual do benefício. Por exemplo, com 26 anos de contribuição, o benefício será de 77%, e assim por diante. Fazendo as contas, ele terá de contribuir mais 24 anos para chegar a 100% do valor, totalizando 49 anos de contribuição.

- Como funciona hoje?

Atualmente, não há uma idade mínima para o trabalhador se aposentar por tempo de contribuição. O que é exigido para esse tipo de aposentadoria é o tempo mínimo de contribuição: de 30 anos para as mulheres e de 35 anos para os homens. Para receberem a aposentadoria integral, mulheres devem somar, entre idade de aposentadoria e tempo de contribuição, 85 anos, e homens, 95 anos.

Já para quem se aposenta por idade, a idade mínima de contribuição é de 15 anos. É preciso ter pelo menos 60 anos de idade, no caso das mulheres, e 65 anos, no caso dos homens. 

Pela nova regra, ambos só poderão se aposentar a partir dos 65 anos de idade.

- Quais serão as mudanças nos valores?

O valor integral da aposentadoria será equivalente a 51% da média dos 80 maiores salários de contribuição. Sobre este valor, será acrescido 1% ao ano de contribuição. Para que se atinja 100% do salário do trabalhador, serão necessários, portanto, 49 anos de contribuição.

O valor máximo continuará sendo limitado ao teto do INSS, que atualmente é de 5.189,82 reais. O valor é reajustado anualmente pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).

- Quem será afetado pelas novas regras ?

As novas regras não valem para quem já é aposentado, recebe pensão ou para quem já alcançou as condições necessárias para se aposentar ou receber uma pensão. As mudanças valerão apenas para homens com menos de 50 anos e mulheres com menos de 45.

- E o resto da população?

Os contribuintes que estão acima dessas idades (50 anos para homens e 45 para mulheres) e ainda não alcançaram o direito de se aposentar passarão a fazer parte de uma faixa de transição. De acordo com a proposta, esses contribuintes terão de pagar um "pedágio" de 50% a mais no tempo que ainda faltaria para atingir a idade mínima de aposentadoria, tendo como base a regra antiga.

Por exemplo, se falta um ano para um contribuinte em regime de transição se aposentar, em vez de ele parar de trabalhar daqui a um ano, ele se aposentará daqui a um ano e meio. 

De acordo com Tafner, cerca de 24,8% dos trabalhadores brasileiros farão parte do grupo de transição, em que as novas regras serão implementadas de forma mais suave. Os outros 75,2% dos contribuintes já estarão sujeitos à nova legislação.

- O que muda para os trabalhadores rurais?

Os trabalhadores rurais passam a ter de contribuir com a Previdência. Na regra atual, o trabalhador rural pode contribuir, mas a aposentadoria é garantida para quem não contribuiu. Hoje, em vez de pagar uma quantia fixa, como os trabalhadores urbanos, os rurais podem pagar um valor percentual que varia de acordo com sua produção. 

- E para professores?

Hoje, os professores também têm regras que permitem que se aposentem antes. Com a PEC 287/16, os professores passam a seguir as mesmas regras de tempo de contribuição e idade mínima para aposentadoria dos servidores do setor privado.

- O que muda para viúvas e viúvos?

As pensões pagas a viúvas e viúvos passam a equivaler a 50% do valor da aposentadoria recebida pela pessoa que morreu, com um adicional de 10% por filho. O valor não passará dos 100%, inclusive para pensionistas que tiverem mais de cinco filhos.

Além disso, esta cota adicional não será mais revertida para a viúva (ou viúvo) quando o dependente completar 18 anos de idade. Pela proposta, não será possível acumular mais de uma pensão.

- O que acontece com o BPC?

Hoje, deficientes e idosos com mais de 65 anos que não contribuíram com a Previdência (ou que tinham renda inferior a um quarto do salário mínimo) recebem o chamado Benefício de Prestação Continuada (BPC), equivalente a um salário mínimo. De acordo com as novas regras, a idade mínima para receber este benefício subirá para 70 anos.

- Por que os militares não serão incluídos nas novas regras?

O pagamento da aposentadoria de trabalhadores das Forças Armadas funciona de acordo com regras específicas, diferentes das que valem para o resto da população. Por isso, mudanças na aposentadoria deste grupo devem ser apresentadas ao Congresso separadamente, em forma de projeto de lei.

- Quando as mudanças entrarão em vigor?

Na semana que vem, a PEC 287/16 será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que vai verificar se as mudanças propostas estão de acordo com a Constituição. Se aprovada, seguirá para a apreciação dos parlamentares no Congresso Nacional. Um parecer definitivo só deve acontecer no primeiro semestre de 2017.

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