O que está paralisado no Congresso devido à crise?
Fernando Caulyt11 de abril de 2016
Processo de impeachment contra Dilma Rousseff desvia foco de parlamentares e paralisa Câmara e Senado na análise e votação de medidas importantes, como a reforma da previdência e o pacote anticorrupção.
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A crise política e o andamento do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff prejudicam a análise e votação pelos parlamentares de diversos projetos importantes para o país.
Entre eles estão, além de pontos da reforma política, a reforma da previdência e o pacote anticorrupção. Também estão praticamente paralisadas ações do governo federal para cortar gastos, tentar estimular a economia e reverter o déficit nas contas públicas.
A tendência é que projetos de lei fiquem em segundo plano por quase todo o primeiro semestre de 2016 e que, no segundo, sejam em parte também afetados pelas eleições municipais de outubro. Alguns dos projetos que se arrastam por conta da crise política são:
Reforma da previdência
A reforma continua na pauta do governo. Um fórum técnico composto por integrantes do governo e iniciativa privada foi instalado pela presidência para discutir o assunto, e pretendia-se enviar as propostas até o final de abril para o Congresso. Porém, o governo adiou a entrega do relatório final, e há a expectativa de que isso fique para o segundo semestre, por não haver clima nem apoio político para um tema tão polêmico. Segundo dados do governo, o sistema beneficia 31 milhões de pessoas, e a reforma deverá afetar cerca de 70 milhões de cidadãos que atualmente contribuem para a Previdência.
Reforma política
A reforma é considerada uma das mais importantes e uma das mais difíceis de saírem do papel por os interesses dos próprios parlamentares estarem em jogo. Em setembro do ano passado, Dilma sancionou o texto da reforma política aprovada pelo Congresso com vetos em relação à doação de empresas e voto impresso. E sancionou itens envolvendo, por exemplo, a redução da duração e estipulação de gastos na campanha eleitoral, doação de pessoa física, participação feminina, prestação de contas, entre outros.
No início deste ano, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado começou a analisar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 113-A/2015 que trata de itens aprovados pelos deputados, entre eles o fim da reeleição para cargos do Poder Executivo, voto impresso, regulamentação para o recebimento do Fundo Partidário e acesso ao tempo gratuito em rádio e televisão, entre outros. Mas, com a intensificação da crise política, não há previsão de quando os projetos deverão ir a plenário.
Pacote anticorrupção
Após os protestos realizados em março de 2015, o governo federal encaminhou um conjunto de sete medidas ao Congresso. Mais de um ano depois, das propostas enviadas em regime de urgência ao Parlamento, cinco aguardam aprovação: punição de responsáveis por improbidade administrativa, enriquecimento ilícito, prática de caixa dois eleitoral, irregularidades contra a ordem pública e o critério de ficha limpa para servidores dos três Poderes. Até agora, só foram colocadas em prática as medidas que dependiam do Poder Executivo: a regulamentação da lei anticorrupção e a instituição de um grupo de trabalho para dar mais rapidez à análise dos processos envolvendo corrupção.
Reforma fiscal
No final de março, o governo federal detalhou as medidas da reforma fiscal que serão enviadas ao Congresso. Entre elas está um plano em que os governos locais poderão alongar a dívida com a União em até 20 anos, de 2027 para 2047, e as dívidas com o BNDES em dez anos. Os estados mais endividados poderão também pedir um desconto de 40% no valor das parcelas, por até 24 meses, limitado a 160 milhões de reais. Em troca, os governadores terão que aprovar leis locais sobre responsabilidade fiscal, a não concessão de novos incentivos fiscais, entre outros.
O governo pretende enviar ainda nos próximos dias ao Congresso a proposta, que inclui ainda a revisão da meta fiscal de 2016 e a fixação de um limite aos gastos públicos. Existem já projetos em ambas as Casas sobre taxação de contribuintes que queiram regularizar recursos não declarados no exterior, a elevação das taxas sobre ganhos de capital e venda de imóveis e tributos sobre a venda de bebidas e produtos de informática.
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF)
A recriação da CPMF, tributo extinto em 2007 e que poderá gerar para os cofres públicos uma arrecadação extra de 32 bilhões de reais, enfrenta ainda muitas resistências. O projeto terá que passar por uma comissão especial na Câmara, pela CCJ do Senado e por votações em dois turnos nos plenários tanto da Câmara quanto do Senado para sair do papel.
Desvinculação de Receitas da União (DRU)
A proposta de prorrogação da DRU, um mecanismo que permite ao governo ter mais flexibilidade na gestão do Orçamento, foi encaminhada ao Congresso em julho do ano passado e, até agora, só foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal.
A cronologia do processo de impeachment
Em dezembro de 2015, Eduardo Cunha dava início ao processo de impeachment da então presidente da República. De "carta-desabafo" à cassação de Dilma Rousseff, relembre os episódios que marcaram o julgamento.
Foto: Reuters/J. Marcelino
O aval
Em 2 de dezembro de 2015, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. A decisão foi tomada no mesmo dia em que a bancada do PT anunciou que votaria pela continuidade do processo de cassação de Cunha no Conselho de Ética, acirrando uma crise política já inflamada no Brasil.
Foto: Getty Images/AFP/Evaristo Sa
Motivo: "pedaladas fiscais"
No mesmo dia, em pronunciamento público, Dilma disse ter recebido "com indignação" a notícia. O pedido de impeachment – apresentado em outubro pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal – acusa a presidente de cometer crime de responsabilidade fiscal, com base na reprovação das contas de 2014 pelo Tribunal de Contas da União, incluindo as chamadas "pedaladas fiscais".
Foto: picture-alliance/dpa
O dia seguinte
Dilma foi notificada oficialmente da abertura do processo em 03/12, logo após Cunha (foto) ler a decisão em plenário. O presidente determinou ainda a criação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados para analisar o pedido de impeachment. Na mesma data, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou duas ações – uma do PT e outra do PCdoB – que tentavam barrar o processo de afastamento de Dilma.
Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
A carta de Temer
Em 07/12, o vice-presidente Michel Temer enviou uma "carta-desabafo" a Dilma, em que expressa mágoas por ter sido, desde o primeiro mandato, um mero "vice decorativo". Ele diz ainda ter "ciência da absoluta desconfiança" da presidente. Especialistas interpretaram o texto como um rompimento de Temer com Dilma – lembrando que é ele quem assume a presidência caso ela sofra o impeachment.
Foto: AFP/Getty Images/E. Sa
Próximo passo: a comissão
O trâmite do processo exige a formação de uma comissão especial, com 65 deputados titulares e igual número de suplentes, indicados por líderes partidários, em quantidade proporcional ao tamanho de cada bancada – é obrigatória a participação de todas as legendas da Casa. Essa comissão dará um parecer pela abertura ou não do processo, que depois irá a plenário.
Foto: Luis Macedo /ABr
Tumulto na Casa
Em 08/12, a Câmara dos Deputados se reuniu pela primeira vez para definir a comissão especial, em votação secreta marcada por tumulto e quebra-quebra. Concorriam duas chapas: uma formada por deputados simpáticos ao governo, e outra oposicionista, favorável à saída da presidente. Venceu a chapa da oposição, com 39 membros, e uma votação suplementar seria realizada para escolher os nomes restantes.
Foto: Antonio Augusto /ABr
Processo suspenso
Essa votação, porém, nunca foi realizada. Ainda na noite de 08/12, o STF suspendeu a tramitação do processo, impedindo temporariamente a instalação da comissão especial. O plenário da Corte decidiu julgar um pedido liminar do PCdoB sobre a constitucionalidade da lei que regulamenta as normas de julgamento de impeachment. O partido criticou, por exemplo, o voto secreto na escolha da comissão.
Foto: EVARISTO SA/AFP/Getty Images
Novo rito de impeachment
Quase dez dias depois, em 17/12, o plenário do STF determinou algumas mudanças no rito de impeachment, que em sua maioria favoreceram a presidente. Os ministros decidiram conceder maior poder ao Senado na análise do afastamento; determinaram que não cabe voto secreto, nem formação de uma chapa alternativa para compor a comissão; mas negaram o pedido do PCdoB de afastar Cunha do processo.
Foto: Roberto Stuckert Filho
Recesso parlamentar
Para angústia do governo – que chegou a sugerir o cancelamento da pausa parlamentar de janeiro –, a análise do processo de impeachment entrou em hiato no fim de dezembro e assim permaneceu até 2 de fevereiro, quando os parlamentares voltaram do recesso. Segundo Cunha, a expectativa era de votar a comissão especial e concluir o processo na Câmara até março, para seguir para julgamento no Senado.
Foto: picture-alliance/Lou Avers
STF analisa embargos
O teor do acórdão em que o STF considera inconstitucionais alguns aspectos do processo de eleição da comissão especial da Câmara foi publicado em 08/03. No mesmo dia, a Câmara reapresentou os questionamentos e pediu a revisão do rito de impeachment pelos ministros do Supremo. Em votação realizada em 16/03, porém, a Corte rejeitou os recursos de Cunha e decidiu manter o rito definido em dezembro.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Comissão está formada
A comissão especial, responsável por analisar o pedido de impeachment na Câmara, foi finalmente formada em 17/03, com deputados indicados pelos próprios líderes partidários. O relator da comissão é Jovair Arantes, líder do PTB na Casa e um dos principais aliados de Eduardo Cunha; e o presidente é Rogério Rosso, líder do PSD na Câmara.
Foto: G.Lima/Câmara dos Deputados
Trabalhos da comissão
Em 30/3, os membros da comissão ouviram dois autores do pedido de impeachment: os juristas Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal. No dia seguinte, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, foi ouvido como testemunha de defesa. No dia 4/4, o ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União, entregou a defesa escrita da presidente e fez a sustentação oral.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Comissão instaura processo
Parlamentares da comissão especial do impeachment votaram no dia 11/04 pela abertura do processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, em sessão marcada por troca de insultos. O placar sobre o parecer do relator Jovair Arantes (PTB-GO) foi de 38 votos a favor e 27 contra.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
A votação na Câmara
Com o parecer admitido pela comissão especial, o processo seguiu para votação no plenário da Câmara dos Deputados. No dia 17/04, em sessão tumultuada e acalorada, os parlamentares decidiram pela continuidade do processo de impeachment, com 367 votos a favor e 137 contra – eram necessários 342 votos favoráveis para a aprovação. A questão segue agora para análise no Senado.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Comissão especial de senadores
Dois dias após a apresentação do parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG, foto), favorável ao afastamento de Dilma, a comissão especial do Senado aprovou, em 06/05, a continuidade do processo de impeachment. Dos 21 senadores, 15 votaram pela aprovação, e apenas cinco votaram contra – três do PT, um do PCdoB e outro do PDT. O presidente da comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB), não votou.
Foto: Agência Brasil/F. Rodrigues Pozzebom
Anulação da votação
Em 09/05, o presidente interino da Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA) – que assumiu o comando da Casa após o afastamento de Eduardo Cunha –, anulou a votação do processo de impeachment realizada na Câmara semanas antes. Horas depois, no mesmo dia, Maranhão voltou atrás na decisão, provocando euforia entre os parlamentares governistas. Votação no Senado aconteceria em apenas dois dias.
Foto: Imago/Zumapress
Senado aprova afastamento da presidente
Em 12/05, após uma sessão de mais de 20 horas, o Senado aprovou por clara maioria a continuidade do processo de impeachment de Dilma. Foram 55 votos a favor do impedimento e 22 contrários. Após o aval dos senadores, a presidente fica afastada por 180 dias, enquanto é julgada, e o vice Michel Temer assume a presidência interinamente.
Foto: Getty Images/M.Tama
Relator defende julgamento final
Em seu relatório final sobre o processo de impeachment, apresentado em 02/08, o relator e senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) defendeu que Dilma vá a julgamento final pelo crime de responsabilidade fiscal. Anastasia argumentou que a presidente afastada abriu créditos suplementares sem autorização do Congresso Nacional e praticou as chamadas pedaladas fiscais.
Foto: Reuters/U.Marcelino
Comissão aprova relatório
Em 04/08, a Comissão Especial do Impeachment no Senado aprovou o relatório do senador Anastasia, favorável ao prosseguimento do processo de impeachment contra Dilma. Dos 21 senadores que compõem a comissão, 15 votaram a favor da continuação do processo, e cinco, contra. Com isso, a comissão encerrou os trabalhos. O relatório seguiu para votação por todos os 81 senadores.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Senado decide levar Dilma a julgamento
Em 10/08, os senadores decidiram, por 59 votos contra 21, levar Dilma a julgamento. A maioria dos senadores seguiu o parecer do relator Anastasia, cujo relatório havia sido aprovado pela comissão especial do impeachment. O resultado indica que Dilma terá dificuldade para reverter seu afastamento definitivo na votação final. Para a condenação são necessários 54 votos.
Foto: Reuters/A. Machado
Iniciada fase final do processo
O Senado deu início à fase final do processo de impeachment no dia 25/08, quase nove meses após sua abertura. O primeiro dia de audiência teve mais de 15 horas de duração e foi marcado por bate-boca entre petistas e senadores favoráveis à saída definitiva de Dilma. O julgamento, que começou com os depoimentos de testemunhas, é comandado pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Discurso de defesa de Dilma
Em 29 de agosto, a presidente afastada Dilma Rousseff apresentou sua defesa da acusação de crime de responsabilidade no Senado. Em sua fala, a petista garantiu que sempre seguiu a Constituição, lembrou os tempos da ditadura militar, usou repetidas vezes o termo golpe e reiterou sua luta pela democracia. "Jamais haverá justiça na minha condenação", afirmou.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Dilma é cassada pelo Senado
Na votação final do processo de impeachment, o Senado decidiu, em 31/08, afastar em definitivo Dilma da Presidência da República. Foram 61 votos favoráveis ao impeachment e 20 contrários – eram necessários 54 para a cassação. Todos os 81 senadores participaram da sessão. Em segunda votação, porém, os parlamentares decidiram por manter o direito de Dilma de exercer cargos públicos.