Enquanto projeto para regulamentar o mercado de créditos de carbono recebe aval do Congresso, Amazônia é palco de disputas judiciais envolvendo projetos estaduais em andamento e questionamentos sobre eficácia.
Nos últimos meses, o Ministério Público Federal (MPF) cobrou maior transparência em iniciativas e até pediu a suspensão de um projeto no Amazonas. Em todas as situações, o temor é o de que os direitos de povos indígenas possam ser violados durante as vendas dos créditos.
O movimento ocorre em um contexto de ceticismo com as iniciativas ao redor do mundo, com sua efetividade questionada e acusações de "greenwashing" – estratégia utilizada para que uma empresa ou serviço venda sua imagem como sendo melhor para o meio ambiente do que realmente é.
Durante a 29ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29), a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, celebrou a aprovação no Senado do mercado regulado de crédito de carbono, e disse que "o contexto não poderia ser melhor".
No entanto, na mesma época, o MPF ajuizou uma ação civil pública para que a Justiça Federal suspendesse o projeto de crédito de carbono/REDD+ – Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal –, lançado pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Amazonas (Sema) para as unidades de conservação estaduais, onde habitam povos indígenas e tradicionais.
À DW, o MPF do Amazonas afirmou que há várias irregularidades e riscos identificados. "No projeto da Sema, comunitários e lideranças tradicionais relataram em reuniões que não foram sequer ouvidos. Também informaram que nada conhecem do tema crédito carbono", indicou.
No Pará, neste mesmo mês, o MPF e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) requisitaram que a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) cumprisse medidas urgentes para que as leis não sejam violadas em uma eventual concretização da venda anunciada pelo governo do Pará de quase R$ 1 bilhão em créditos de carbono.
Neste caso, além da falta de contato com as comunidades, existem dúvidas sobre a legalidade do projeto, já que parte dos créditos seria decorrente de imóveis rurais que não compõem o patrimônio fundiário do Estado do Pará, como terras indígenas.
Os questionamentos não são uma exceção brasileira. Inigo Wyburd, especialista em políticas de mercados globais de carbono do Carbon Market Watch, afirma que a ausência de um diálogo efetivo com as comunidades locais e indígenas é um problema comum em projetos de REDD+. “As salvaguardas se destinam a proteger estas comunidades e o ambiente, mas a sua implementação muitas vezes é insuficiente”, aponta.
"Cenário de violações"
Segundo o MPF-AM, é possível constatar que há um "cenário de violações" em diversos projetos e territórios. "Muitos dos contratos de créditos de carbono estão sendo trabalhados e construídos em sigilo, sem qualquer interferência ou participação dos órgãos de controle, nem mesmo Funai", afirma.
Segundo o órgão, há a constatação de que não está havendo boa fé e nem informação adequada nas pretensas consultas em andamento, além de violações às consultas já demonstradas. São registrados ainda atritos em vários projetos, entre os comunitários, em face do assédio de empresas e instituições, aponta.
Neste ano, a Agência Pública, apresentou o caso da Guiana, país pioneiro nos mercados voluntários de carbono, com um modelo similar ao adotado no Pará. Em certa região, a falta de planejamento para o destino dos recursos gerados pelos projetos levou ao caso da construção de um shopping praticamente inutilizado em uma aldeia. Em outras partes do país, as promessas das verbas beneficiando as comunidades locais também foram pouco cumpridas.
"As salvaguardas para proteger as comunidades são fracas e mal aplicadas, e os benefícios muitas vezes não se materializam ou são distribuídos de forma desigual", afirma Wyburd.
Além das violações dos direitos das comunidades locais, neste ano, três projetos de créditos de carbono foram suspensos na Amazônia depois que a Operação Greenwashing, da Polícia Federal, mostrou a ligação entre os líderes das iniciativas supostamente "verdes" e esquemas de grilagem de terras e extração ilegal de madeira.
A Verra, certificadora do projeto – uma das maiores do mundo no mercado voluntário de carbono – anunciou a decisão em 10 de junho. "A suspensão de uma conta é uma ação extraordinária que significa que nenhuma transação pode ser feita na conta, incluindo os créditos mantidos na conta, até que todos os problemas ou incertezas identificadas tenham sido resolvidos", declarou.
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Preocupação global com eficácia
Estudos realizados pela sociedade civil revelaram que muitos projetos de REDD+ superestimam significativamente o seu impacto, levantando sérias preocupações sobre a sua credibilidade, afirma Wyburd. Um relatório do Carbon Market Watch chegou à conclusão de que apenas uma a cada 13 iniciativas REDD+ representou uma queda real no desmatamento, o que fica em linha com outros estudos divulgados pelo mundo.
Uma publicação do Projeto de Comércio de Carbono da Universidade de Berkeley concluiu que o excesso de crédito é "significativo e generalizado" em projetos REDD+. A divulgação cita um estudo publicado na revista Science, que avalia os efeitos de 26 projetos deste tipo em seis países de três continentes, descobrindo que a maioria não reduziu significativamente o desmatamento. Nos que o que o fizeram, as reduções foram substancialmente inferiores às reivindicadas.
"A questão central reside no fracasso das metodologias existentes em garantir a precisão. As linhas de base são frequentemente inflacionadas, as fugas são subestimadas e os estoques de carbono são exagerados, resultando na emissão de créditos de carbono de baixa qualidade", explica o especialista.
A publicação do Projeto de Comércio de Carbono afirma que as metodologias são comumente escritas pelos desenvolvedores dos projetos, enquanto os promotores se beneficiam da geração de mais créditos com menos investimento, e os compradores conseguem créditos de custo mais baixo.
Para Wyburd, nos projetos atuais, há ainda uma falta significativa de transparência financeira, particularmente no que diz respeito à divulgação pública de informações pelos principais intervenientes. Com base em um estudo do seu observatório, ele lembra que a maioria dos promotores de projetos está baseada no Norte Global, enquanto os próprios projetos estão em grande parte no Sul, levantando questões críticas sobre os fluxos financeiros.
"Após anos de crescente escrutínio por parte dos meios de comunicação social e da sociedade civil, a procura de créditos REDD+ estagnou significativamente", aponta. O especialista cita a relutância das empresas em adquirir créditos sobrestimados, já que se corre o risco de acusações de greenwashing, o que já levou várias empresas a enfrentar desafios legais.
Por sua vez, Wyburd cita alguns desenvolvimentos positivos. "Iniciativas como o Conselho de Integridade para os Mercados Voluntários de Carbono (ICVCM) estão trabalhando para estabelecer padrões de referência de maior qualidade para créditos de carbono, enfatizando a transparência, a precisão e a inclusão das partes interessadas", explica.
O mês de dezembro em imagens
Reveja alguns dos principais acontecimentos do mês
Foto: Anas Alkharboutli/dpa/picture alliance
"O ódio não pode ter a palavra final", diz presidente alemão em discurso de Natal
Em seu tradicional discurso de Natal à nação, o presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, abordou o ataque a um mercado de Natal em Magdeburg na semana passada, que deixou cinco mortos. Pedindo união e coesão ao país, Steinmeier se solidarizou com as famílias das vítimas e os feridos e afirmou que "ódio e a violência não podem ter a palavra final". (24/12)
Equipes buscam desaparecidos após colapso de ponte sobre o Rio Tocantins
Equipes de resgate buscam 14 desaparecidos após a Ponte Juscelino Kubitschek, que liga os estados do Tocantins e do Maranhão, colapsar no último domingo, provocando a queda de 10 veículos. Ao menos três mortes foram confirmadas até o momento. Devido ao derramamento de produtos tóxicos no acidente, autoridades proibiram o uso da água do Rio Tocantins em 19 municípios. (23/12)
Foto: Bombeiro Militar/Governo do Tocantins
Queda de avião em Gramado mata empresário e 9 familiares
Um avião de pequeno porte caiu no município de Gramado, no Rio Grande do Sul. A aeronave atingiu uma loja de móveis, uma pousada e residências perto do centro da cidade. Os dez ocupantes da aeronave morreram. Todos eram da mesma família. Outras 17 pessoas que estavam no solo foram encaminhadas a um hospital, duas delas em estado grave. (22/12)
Foto: Defesa Civil do Rio Grande do Sul/Divulgação
Magdeburg tem dia de homenagens e protestos após ataque
Centenas de pessoas homenagearam as vítimas de um atentado que deixou 5 mortos e 200 feridos em Magdeburg. O suspeito do crime é um médico saudita de 50 anos, que se dizia ex-muçulmano, alegava ser perseguido por radicais religiosos e simpatizava com a ultradireitista AfD. Em resposta, manifestantes ocuparam as ruas da cidade com slogans anti-imigração. (21/12)
Foto: Michael Probst/AP/picture alliance
Motorista invade mercado de Natal na Alemanha e atropela dezenas
Um motorista avançou em alta velocidade contra um mercado de Natal na cidade alemã de Magdeburgo, no estado da Saxônia-Anhalt, leste da Alemanha, atropelando dezenas de pessoas e deixando mortos e feridos. O suspeito, um médico psiquiatra saudita de 50 anos, foi preso. Aparentemente, ele tinha perfil crítico ao islã. (20/12)
Foto: Heiko Rebsch/dpa/picture alliance
Ex-marido de Gisèle Pelicot é condenado a 20 anos de prisão
Dominique Pelicot, que passou uma década dopando sua então esposa, Gisèle, e convidando outros homens a estuprá-la, foi condenado a 20 anos pela Justiça francesa. Ele foi considerado culpado por estupro com agravantes e por gravar e distribuir imagens dos atos. Gisèle tornou-se um ícone feminista global ao decidir tornar público o julgamento e assistir às sessões com o rosto descoberto. (19/12)
Foto: Laurent Coust/ABACA/picture alliance
Macron e Zelenski discutem envio de tropas europeias à Ucrânia
Presidentes da Franca, Emmanuel Macron, e da Ucrânia, Volodimir Zelenski, voltaram a discutir possibilidade de a Europa enviar tropas para a Ucrânia no intuito de ajudar a alcançar uma paz estável. "Garantias confiáveis são essenciais para que a paz possa realmente ser alcançada”, disse Zelenski, que também se reuniu com chefe da Otan, Mark Rutte, em Bruxelas. (18/12)
Foto: Nicolas Tucat, Pool Photo via AP/picture alliance
General russo morre em explosão em Moscou
O general Igor Kirillov, chefe da defesa radiológica, química e biológica da Rússia, foi morto num ataque a bomba em Moscou. A bomba foi acionada quando Kirillov, de 54 anos, estava saindo de uma casa com seu assessor, que também foi morto no atentado. Investigadores citados pelo jornal Kommersant apontaram os serviços secretos ucranianos como os possíveis autores do ataque. (17/12)
Foto: ASSOCIATED PRESS/picture alliance
Olaf Scholz perde moção de confiança
O chanceler alemão Olaf Scholz perde voto de confiança no Bundestag (parlamento alemão) depois de não conseguir obter a maioria no Legislativo após o colapso de seu governo de coalizão. O resultado abre caminho para a dissolução da atual legislatura e a convocação de eleições federais antecipadas, que devem ocorrer em 23 de fevereiro, marcand o fim da era Scholz. (16/12)
Foto: Lisi Niesner/REUTERS
Escolas reabrem na Síria após queda do regime de Assad
Dezenas de crianças e adolescentes voltaram às escolas em Damasco neste domingo, uma semana após a queda do ditador Bashar al-Assad. A rotina também está lentamente voltando ao normal em universidades e nos centros comerciais, depois de um período de comemorações e incertezas sobre o futuro da Síria. (15/12)
Foto: Ammar Awad/REUTERS
PF prende general Braga Netto no inquérito do golpe
Ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes mandou prender preventinamente o ex-ministro da Defesa de Jair Bolsonaro, Walter Braga Netto, acusado de tentar obstruir as investigações. Ele é tomado pela Polícia Federal como um dos coordenadores do plano para matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e aplicar um golpe de Estado. (14/12)
Foto: SERGIO LIMA/AFP
Multidão toma as ruas de Damasco para celebrar queda de Assad
Milhares de pessoas se reuniram em cidades sírias para celebrar o fim do regime de Bashar al-Assad após as primeiras orações de sexta-feira desde que os rebeldes assumiram o poder. Em Damasco, uma multidão se reuniu na praça Umayyad, no centro da capital. O local é simbólico por ter também recebido os protestos massivos de 2011, que deram início à guerra civil no país. (13/12)
Foto: Ghaith Alsayed/AP/dpa/picture alliance
Trump é a Pessoa do Ano de 2024 da revista "Time"
Publicação cita "volta por cima de proporções históricas" ao justificar escolha e diz que republicano é beneficiário e agente da perda de confiança nos valores liberais. (12/12)
Foto: Heather Khalifa/AP Photo/picture alliance
Assembleia Geral da ONU pede cessar-fogo imediato, incondicional e permanente em Gaza
Por 158 votos favoráveis, órgão que reúne 193 países pediu o fim do conflito entre Israel e o Hamas no território palestino e a libertação imediata de todos os reféns sequestrados por islamistas. Mas diferentemente das votações no Conselho de Segurança, decisão não é juridicamente vinculativa. Conflito em Gaza já dura 14 meses, sem fim à vista. (11/12)
Foto: Mohammed M Skaik/Avalon/picture alliance
Rebeldes sírios anunciam novo governo de transição
Mohammad al-Bashir, que liderava o governo no reduto rebelde de Idlib, vai assumir gestão interina do país até 1º de março, mudando a liderança do país após 24 anos de regime de Bashar al-Assad. Novo primeiro-ministro é ligado ao grupo radical islâmico HTS. (10/12)
Foto: Omar Haj Kadour/AFP/Getty Images
STF obriga PM de São Paulo a manter uso de câmeras corporais
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, determinou a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais pelos policiais militares do estado de São Paulo. A determinação é uma derrota para o governador Tarcísio de Freitas, que desde a campanha eleitoral se posicionou contra o uso dos equipamentos e vinha tentando propor modelos alternativos. (09/12)
Foto: FotoRua/NurPhoto/IMAGO
Rebeldes derrubam regime na Síria, e Assad foge para a Rússia
Após uma ofensiva que durou menos de duas semanas, insurgentes sírios liderados pelo grupo islamista Organização para a Libertação do Levante (HTS) chegaram à capital da Síria, Damasco, e a declararam "livre" do regime do presidente Bashar al-Assad. Citando fontes do Kremlin, veículos russos afirmam que o ditador e sua família estão asilados em Moscou. (08/12)
Foto: Louai Beshara/AFP
Restaurada, Catedral de Notre-Dame é reaberta cinco anos após incêndio devastador
Bancada por doações, reconstrução de monumento arquitetônico parisiense custou cerca de 700 milhões de euros e demandou o trabalho de cerca de 2 mil especialistas. Construída entre os séculos 12 e 14, catedral quase foi destruída em incêndio de causas desconhecidas. Solenidade foi prestigiada por chefes de governo e de Estado do mundo inteiro. (07/12)
Foto: Stevens Tomas/ABACA/IMAGO
Mercosul e União Europeia anunciam acordo de livre comércio
Após 25 anos de negociações, blocos concluíram texto final do acordo que prevê a redução ou eliminação de tarifas e barreiras comerciais, facilitando a exportação de produtos de ambos os lados. A líder da UE, Ursula von der Leyen (centro), disse que o pacto é uma "vitória para Europa". Ratificação deve, porém, esbarrar em resistência de países como a França. (06/12)
Foto: EITAN ABRAMOVICH/AFP/Getty Images
Após tomar Aleppo, Rebeldes avançam pela Síria e anunciam conquista de Hama
Islamistas apoiados pela Turquia fizeram seu mais rápido avanço em 13 anos de guerra civil no país. A captura de Hama vem após o enfraquecimento do Hezbollah, tradicional aliado do ditador sírio Bashar al-Assad, ao lado de Rússia e Irã. (05/12)
Governo da França é derrubado após moção de censura
Deputados de esquerda e da ultradireita se uniram para derrubar o governo do premiê francês, Michel Barnier, que assumiu o cargo há menos de 100 dias. Barnier enfrentava duas moções de censura, após usar um controverso mecanismo para forçar a aprovação do Orçamento. A primeira moção acabou sendo aprovada com 331 votos, selando o fim do governo do aliado do presidente Emmanuel Macron. (04/12)
Foto: Sarah Meyssonnier/REUTERS
Presidente sul-coreano impõe e depois desiste de lei marcial
O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, surpreendeu o país e o mundo ao decretar lei marcial em pronunciamento transmitido pela TV. Ele justificou a militarização do país como forma de conter uma "ameaça comunista". Horas depois, após protestos e uma votação unânime do Parlamento para derrubar medida, ele recuou e suspendeu lei. (03/12)
Foto: JUNG YEON-JE/AFP/Getty Images
Trabalhadores da Volkswagen entram em greve em toda a Alemanha
Milhares de trabalhadores da Volkswagen na Alemanha entraram em greve, depois que a empresa anunciou planos de fechar três fábricas e cortar aposentadorias. "Se necessário, esta será a disputa salarial mais dura que a Volkswagen já viu", disse Thorsten Gröger, que está liderando as negociações sindicais com a gigante automobilística alemã. (02/12)
Foto: Jens Schlueter/AFP via Getty Images
Regime sírio perde controle de Aleppo
O regime do ditador sírio Bashar al-Assad perdeu completamente o controle de Aleppo, a segunda cidade do país, informou uma ONG. Segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH), o grupo Hayat Tahrir al Sham, antigo ramo sírio da rede terrorista Al Qaeda, e outras facções rebeldes aliadas "controlam a cidade de Aleppo, com exceção dos bairros controlados pelas forças curdas". (01/12)