O que Putin quer com "referendos" no leste da Ucrânia?
Roman Goncharenko
22 de setembro de 2022
Áreas ocupadas pela Rússia devem ser anexadas por meio de pseudorreferendos. Processo lembra o ocorrido na Crimeia em 2014, mas há diferenças.
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A intenção para isso já havia sido manifestada há alguns meses, mas agora a Rússia tem urgência em anexar as áreas ocupadas no sul e leste da Ucrânia. A votação sobre a anexação está programada para ocorrer simultaneamente nas regiões de Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporíjia, entre 23 e 27 de setembro. Em um pronunciamento nesta quarta-feira (21/09), o presidente russo, Vladimir Putin, deu a entender que Moscou reconheceria os resultados.
Assim como ocorreu em relação à anexação da Crimeia em 2014, a Rússia atribui grande importância a parecer imparcial. Foram os políticos ucranianos locais nomeados e apoiados militarmente por Moscou que anunciaram os chamados "referendos".
Assim como no caso da Crimeia, há oito anos, a votação foi antecipada. Antes se falava em 4 de novembro como data possível.
Referendos regionais são proibidos na Ucrânia. Não haverá monitoramento independente da votação – assim como não houve na Crimeia.
Votação com escolta policial
Apesar dos paralelos, as diferenças em relação à votação na Crimeira predominam. Donetsk e Lugansk são repúblicas separatistas que estão efetivamente sob controle russo desde 2014 e foram reconhecidas como Estados independentes por Putin pouco antes da invasão da Ucrânia em fevereiro. As regiões de Kherson e Zaporíjia, por outro lado, foram ocupadas quase total ou parcialmente pela Rússia somente após a invasão.
Os combates prosseguem em todas as quatro regiões até hoje. Um pseudorreferendo também foi planejado nas áreas a leste de Kharkiv que estavam ocupadas até alguns dias atrás. A bem-sucedida contraofensiva ucraniana foi aparentemente capaz de evitar isso.
Segundo a mídia russa, haverá diferenças regionais entre os "referendos". Em Donetsk e Lugansk, a cédula tem apenas uma pergunta: Ingresso na Federação Russa − "sim" ou "não". Em Kherson e Zaporíjia, são três perguntas que só podem ser respondidas em conjunto com "sim" ou "não": deixar a Ucrânia, fundar um Estado independente e ingressar na Rússia. A votação também está ocorrendo na própria Rússia, para onde centenas de milhares de ucranianosfugiram desde 2014. No entanto, a maioria, vários milhões, fugiu para as regiões da Ucrânia controladas por Kiev.
Não há previsão de votação eletrônica. Na região de Zaporíjia, por exemplo, equipes eleitorais móveis com escolta policial devem fazer visitas domiciliares, disse o chefe da administração Yevgeny Balizki, nomeado pela Rússia, em entrevista à emissora estatal russa Rossiya-24 na terça-feira.
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Objetivos da Rússia nos pseudorreferendos
Depois que a união tiver sido formalizada, os combatentes de Donetsk e Lugansk deverão ser incluídos no Exército russo. Mas para Kherson e Zaporíjia os planos de Moscou são diferentes: lá serão recrutados voluntários.
A anexação das novas áreas daria à Rússia a oportunidade de usar "todas as suas forças para autodefesa", escreveu o ex-presidente Dmitri Medvedev em seu canal no Telegram. Muitos observadores interpretaram isso como uma ameaça de emprego de armas nucleares. No entanto, um ataque ucraniano a um aeroporto militar russo na Crimeia há algumas semanas não resultou em uma reação imediata da Rússia.
O cientista político russo Dmitri Oreshkin disse à DW que o plano original da Rússia, de uma votação aparentemente ordenada, foi descartado. Esta votação "durante a guerra, quando quase metade da população fugiu", não deve ser levada a sério.
Enquete no Donbass em 2019
Não há informações confiáveis sobre o clima atual nas áreas ocupadas pelos russos na Ucrânia.
Em uma pesquisa encomendada pelo Centro Berlinense de Estudos Internacionais e do Leste Europeu (ZOiS) em 2019, menos da metade dos moradores das áreas separatistas de Donetsk e Lugansk se manifestaram a favor da anexação à Rússia – um total de cerca de 45%. Muitos dos defensores apoiam um status de autonomia − cerca de 27%. Na época, 54% das pessoas questionadas nessas duas regiões defendiam o retorno à Ucrânia.
Instantâneos de uma Ucrânia em guerra
Mostra "O novo anormal", no Museu Deichtorhallen de Hamburgo, registra horrores da guerra, mas também a resistência dos ucranianos, em trabalhos de 12 fotógrafos do país sob invasão russa.
Foto: Oksana Parafeniuk
Civis treinam com armas de madeira
Nesta imagem feita perto de Kiev em 6 de fevereiro de 2022, menos de duas semanas antes da invasão russa, a fotógrafa Oksana Parafeniuk capturou a determinação de seus compatriotas de resistir. Embora os países ocidentais não esperassem que a Rússia atacasse a capital a Ucrânia, os civis de lá já estavam treinando com armas de madeira, para caso de emergência.
Foto: Oksana Parafeniuk
Resistindo com o país
Em 24 de fevereiro, o fotógrafo Mykhaylo Palinchak acordou em Kiev com o som de sirenes, pouco depois ouviu uma explosão. "Desde então, estamos vivendo num novo mundo", afirma. Suas fotografias mostram granadas, casas destruídas e como seus compatriotas defendem a nação, mais do que nunca. A mulher da foto exibe o pulso esquerdo tatuado com o mapa da Ucrânia.
Foto: Mykhaylo Palinchak
Começou às 5 da manhã
"A guerra é a pior das opções da humanidade. Nenhum filme, nenhum livro, nenhuma foto pode transmitir este horror", diz a fotógrafa Lisa Bukreieva. "Com a invasão dos russos, meu sentido de tempo mudou. É apenas um horror de longa
duração." Esta fotografia capta o momento em que a guerra começou para ela.
Foto: Lisa Bukreieva
Cidadãos de Kiev - parte 1
Depois da invasão da Ucrânia pelo exército russo, Kiev se transformou em outra cidade, relata Alexander Chekmenev, de 52 anos. Muitos fugiram, ele próprio enviou a família para a segurança no exterior, mas ficou no país para documentar com sua Pentax a vida dos cidadãos de Kiev em tempos de guerra. Como esta ucraniana em uniforme de combate.
Foto: Alexander Chekmenev
Cidadãos de Kiev - parte 2
Abrigos antiaéreos e centros de primeiros-socorros espalharam-se pela capital ucraniana. Lá, Chekmenev fotografou gente comum, que nunca esteve sob os holofotes: "Eu queria mostrar a dignidade deles. Este país pertence ao seu povo, e eu quero mostrar o meu respeito por cada um deles", diz o fotógrafo de renome internacional.
Foto: Alexander Chekmenev
Traços do presente
Em sua série de fotografias, Pavlo Dorohoi capturou a vida em tempos de guerra em sua cidade natal, Kharkiv. Muitos cidadãos se esconderam em estações do metrô para escapar das bombas, transformando os locais em lares temporários, com "tapetes, cobertores e outros objetos pessoais", relata Dorohoi.
Foto: Pavlo Dorohoi
Bucha: o local do horror
O arquiteto e fotógrafo de Kiev Nazar Furyk fotografou lugares devastados pelas tropas russas, entres os quais a cidade de Bucha, que se tornou símbolo de muitas atrocidades. O fotógrafo se pergunta: como é possível continuar vivendo num lugar assim? Como se lida com essa experiência, gravada profundamente na memória coletiva da população ucraniana?
Foto: Nazar Furyk
Diário de Kiev - parte 1
A fotógrafa e videoartista Mila Teshaieva mantém um diário online desde o início da guerra, onde registrou tudo: desde os primeiros dias, antes dos mísseis, até os crimes contra a humanidade revelados desde então. Seus registros também incluem fotos, como esta.
Foto: Mila Teshaieva
Diário de Kiev - parte 2
Mila Teshaieva relata o desespero que a guerra provoca, mas também registra a união dos ucranianos e sua enorme vontade de resistir. Em sua cidade natal, Kiev, os moradores estão tentando proteger não só a si, mas também seus monumentos, símbolos da identidade nacional.
Foto: Mila Teshaieva
Documentação da guerra
Vladyslav Krasnoshchok é dentista, mas há anos se dedica à arte. Agora viaja por sua pátria devastada e fotografa carros queimados, pontes e tanques destruídos. "Eu tiro fotos, ouço tiros e corro de volta para o carro. Adrenalina pura!", escreve. Ele sempre revela os filmes imediatamente. Afinal, não se sabe se haverá oportunidade de tirar mais fotos.
Foto: Vladyslav Krasnoshchok
Mutilado
"Vivendo com o medo de ser ferido" é o nome da série de fotos do designer Sasha Kurmaz. A violência tem feito parte da história humana desde o início, afirma, e não está otimista se isso vá mudar em breve. Ainda assim, não desiste de sua luta pessoal por um mundo melhor.
Foto: Sasha Kurmaz
Porto seguro?
Uma cadeira, copos com bebidas: para Elena Subach esta foto tirada na cidade de Uzhgorod, no oeste da Ucrânia, simboliza a segurança de quem foge rumo a outros países. "Quase todo homem tirou uma foto da esposa e dos filhos antes de lhes dizer adeus. Eu nunca vi tanto amor e tanta dor ao mesmo tempo."