Grupo palestino que teve papel central nos ataques terroristas de 7 de outubro em Israel atua desde os anos 1990 e conta com o apoio do Irã e do Hisbolá. Fundadas em 1992, elas possuem entre 20 mil e 25 mil membros.
Anúncio
O vice-líder do braço político do Hamas, Saleh al-Arouri, descreveu os ataques terroristas de 7 de outubro em Israel em termos que contradizem os relatos das testemunhas.
"O plano militar das Brigadas Al-Qassam era atingir a divisão para Gaza do Exército de ocupação [israelense] e lutar somente contra os soldados da ocupação; tínhamos informações de que a [força de] ocupação planejava lançar um ataque contra nós no feriado hebreu", disse Al-Arouri à emissora Al-Jazeera.
As Brigadas Al-Qassam são o braço militar do Hamas, organização considerada como terrorista pelos Estados Unidos e a Europa.
Al-Arouri conta que, em 7 de outubro, em torno de 1,2 mil membros das Brigadas Al-Qassam irromperam as fronteiras da Faixa de Gaza e entraram em Israel, onde tomaram parte nos ataques terroristas. Ele, porém, nega que os civis tenham sido alvos propositais dos terroristas, dizendo que outras pessoas de Gaza – também civis – teriam posteriormente cometido algumas das piores atrocidades contra os israelenses.
Al-Arouri tampouco explicou por que havia tão poucos soldados israelenses do outro lado da fronteira, se Israel tivesse de fato planejado uma ataque a Gaza naquela data.
Anúncio
Liderança "obscura"
Al-Arouri, um dos fundadores das Brigadas Al-Qassam, vive há mais de dez anos no exílio. O líder atual, Mohammed Deif, é com frequência descrito como um líder "obscuro" que vive escondido há duas décadas, uma vez que seu nome está no topo da lista dos mais procurados por Israel.
Acredita-se que Deif, que lidera as brigadas Al-Qassam desde 2002, estaria por trás dos principais ataques terroristas em solo israelense. Também é especulado que ele esteja bastante debilitado fisicamente depois de ter sido alvo de várias tentativas de assassinato por parte do Exército de Israel.
As Brigadas Al-Qassam foram fundadas em 1992. Segundo registros da CIA, elas possuem entre 20 mil e 25 mil membros, embora esses dados sejam impossíveis de serem verificados de maneira independente. O grupo tem atualmente sob seu poder mais de 200 reféns em Gaza.
O nome remete ao clérigo Izz ad-Din al-Qassam, nascido na Síria em 1882. Ele era um reformista social que se convenceu de que a única maneira de expulsar os colonizadores europeus do Oriente Médio seria através da violência. Ele foi morto pela polícia britânica em 1935.
As Brigadas também estão envolvidas na construção da extensa rede de túneis sob Gaza que, no passado, foi utilizada para realizar ataques em Israel. Em 2006, terroristas do Hamas usaram os túneis para sequestrar o soldado israelense Gilad Shalit próximo à fronteira.
O grupo também já conseguiu atacar Israel por mar. Em 2014, durante uma operação de sete semanas realizada pelo Exército israelense, quatro membros do Hamas nadaram até a costa e atacaram um tanque israelense, sendo mortos em combate com soldados locais.
Laços com Irã e Hisbolá
Por serem parte do Hamas, as Brigadas Al-Qassam também recebem apoio financeiro e estratégico do Irã.
"A República Islâmica do Irã [...] contribuiu muito, por um lado, ao transferir conhecimento e expertise e, por outro, ao transportar foguetes, ajudando o Hamas a depender de suas capacidades locais para produzir essas tecnologias avançadas", afirmou Khaled Qaddoumi, considerados um elemento de ligação entre o Hamas e o governo iraniano, à revista AI Monitor em 2021.
Esse apoio do Irã aumentou nas últimas décadas, afirma Michael Milshtein, ex-integrante da inteligência militar de Israel e atual pesquisador do Centro Moshe Dayan para Estudos do Oriente Médio e Africanos da Universidade de Tel Aviv.
À DW, Milshtein afirmou que o Irã ajuda a treinar os membros das Brigadas Al-Qassam: "atiradores, armadilhas e paraquedistas e tudo o que enfrentamos em 7 de outubro".
É difícil saber exatamente como as Brigadas são financiadas. Milshtein, no entanto, avalia que o governo iraniano teria influência nisso. "Estamos falando de enormes somas de dinheiro que o Irã entrega ao Hamas, principalmente ao seu braço militar", disse o israelense. Ele acredita que somente nos últimos dois ou três anos, esse total chegaria a 100 milhões de dólares.
É possível que as criptomoedas também tenham ajudado a financiar as Brigadas Al-Qassam. Já em 2019, o grupo pedia a seus apoiadores através do Telegram o envio de doações utilizando bitcoins.
Após os ataques de 7 de outubro, as autoridades israelenses anunciaram o congelamento de várias contas em criptomoedas associadas ao Hamas com a justificativa de que o grupo havia feito pedidos de doações através das redes sociais.
Em 2019, o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos publicou nomes de pessoas do Líbano e de Gaza que eram consideradas "facilitadores financeiros" e "intermediários críticos" que trabalhariam para conectar o Irã e as Brigadas Al-Qassam. Segundo Washington, o grupo islamista Hisbolá, com sede no Líbano, também teria desempenhado um papel nesse processo.
O braço militar do Hisbolá também é considerado uma organização terrorista pela União Europeia (UE).
De onde vêm os armamentos
A quantidade e variedade de armas utilizadas nos ataques de 7 de outubro – foguetes, drones e armamentos de pequeno porte – assim como o lançamento de morteiros contra o território israelense, são indicativos de que as Brigadas ainda possuem estoques de munição. O número exato de projéteis, no entanto, é desconhecido.
Muitas dessas armas são contrabandeadas para a Faixa de Gaza, muitas vezes com a ajuda do Hizbolá ou através da Síria, afirma Milshtein.
O Instituto Jerusalém de estratégia e Segurança (JISS) menciona uma entrevista dada por Ziad al-Nakhalah, secretário-geral do grupo palestino Jihad Islâmica – organização também considerada como terrorista pelos EUA e pela UE.
Em conversa com o veículo de mídia Al Mayadeen, sediado no Líbano e simpático ao Irã, Al-Nakhalah confrmou que as armas convencionais chegam ao grupo principalmente através do Hizbolá e da Síria, e que todos os membros do chamado "eixo da resistência" teriam participação nisso – em referência à rede de grupos que o Irã apoia no Oriente Médio de modo a avançar seus objetivos, que incluem políticas anti-Israel e anti-EUA.
O contrabando pode ocorrer por terra, por mar ou de modo subterrâneo.
Os pesquisadores do JISS também notaram que Al-Nakhalah mencionou especificamente os campos de treinamento na Síria, onde os combatentes do Hamas aprendem a construir foguetes.
Segundo o Centro Begin-Sadat de Estudos Estratégicos em Israel, as Brigadas Qassam usam civis como escudos humanos para proteger seu arsenal e seus combatentes. Esta, segundo os pesquisadores, seria uma estratégia sugerida pelo Irã adotada de maneira proposital.
Os analistas dizem que o objetivo seria transmitir uma imagem negativa de Israel, como se as forças israelenses estivessem agindo de modo proposital e desproporcional ao fazer vítimas civis.
A longa história do processo de paz no Oriente Médio
Por mais de meio século, disputas entre israelenses e palestinos envolvendo terras, refugiados e locais sagrados permanecem sem solução. Veja um breve histórico sobre o conflito.
Foto: PATRICK BAZ/AFP/Getty Images
1967: Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU
A Resolução 242 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, aprovada em 22 de novembro de 1967, sugeria a troca de terras pela paz. Desde então, muitas das tentativas de estabelecer a paz na região referiram-se a ela. A determinação foi escrita de acordo com o Capítulo 6 da Carta da ONU, segundo o qual as resoluções são apenas recomendações e não ordens.
Foto: Getty Images/Keystone
1978: Acordos de Camp David
Em 1973, uma coalizão de Estados árabes liderada pelo Egito e pela Síria lutou contra Israel no Yom Kippur ou Guerra de Outubro. O conflito levou a negociações de paz secretas que renderam dois acordos 12 dias depois. Esta foto de 1979 mostra o então presidente egípcio Anwar Sadat, seu homólogo americano Jimmy Carter e o premiê israelense Menachem Begin após assinarem os acordos em Washington.
Foto: picture-alliance/AP Photo/B. Daugherty
1991: Conferência de Madri
Os EUA e a ex-União Soviética organizaram uma conferência na capital espanhola. As discussões envolveram Israel, Jordânia, Líbano, Síria e os palestinos – mas não da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) –, que se reuniam com negociadores israelenses pela primeira vez. Embora a conferência tenha alcançado pouco, ela criou a estrutura para negociações futuras mais produtivas.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Hollander
1993: Primeiro Acordo de Oslo
Negociações na Noruega entre Israel e a OLP, o primeiro encontro direto entre as duas partes, resultaram no Acordo de Oslo. Assinado nos EUA em setembro de 1993, ele exigia que as tropas israelenses se retirassem da Cisjordânia e da Faixa de Gaza e que uma autoridade palestina autônoma e interina fosse estabelecida por um período de transição de cinco anos. Um segundo acordo foi firmado em 1995.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Sachs
2000: Cúpula de Camp David
Com o objetivo de discutir fronteiras, segurança, assentamentos, refugiados e Jerusalém, o então presidente dos EUA, Bill Clinton, convidou o premiê israelense Ehud Barak e o presidente da OLP Yasser Arafat para a base militar americana em julho de 2000. No entanto, o fracasso em chegar a um consenso em Camp David foi seguido por um novo levante palestino, a Segunda Intifada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/R. Edmonds
2002: Iniciativa de Paz Árabe
Após Camp David, seguiram-se encontros em Washington e depois no Cairo e Taba, no Egito – todos sem resultados. Mais tarde, em março de 2002, a Liga Árabe propôs a Iniciativa de Paz Árabe, convocando Israel a se retirar para as fronteiras anteriores a 1967 para que um Estado palestino fosse estabelecido na Cisjordânia e em Gaza. Em troca, os países árabes concordariam em reconhecer Israel.
Foto: Getty Images/C. Kealy
2003: Mapa da Paz
Com o objetivo de desenvolver um roteiro para a paz, EUA, UE, Rússia e ONU trabalharam juntos como o Quarteto do Oriente Médio. O então primeiro-ministro palestino Mahmoud Abbas aceitou o texto, mas seu homólogo israelense Ariel Sharon teve mais reservas. O cronograma previa um acordo final sobre uma solução de dois estados a ser alcançada em 2005. Infelizmente, ele nunca foi implementado.
Foto: Getty Iamges/AFP/J. Aruri
2007: Conferência de Annapolis
Em 2007, o então presidente dos EUA George W. Bush organizou uma conferência em Annapolis, Maryland, para relançar o processo de paz. O premiê israelense Ehud Olmert e o presidente da ANP Mahmoud Abbas participaram de conversas com autoridades do Quarteto e de outros Estados árabes. Ficou acordado que novas negociações seriam realizadas para se chegar a um acordo de paz até o final de 2008.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Thew
2010: Washington
Em 2010, o enviado dos EUA para o Oriente Médio, George Mitchell, convenceu o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, a implementar uma moratória de 10 meses para assentamentos em territórios disputados. Mais tarde, Netanyahu e Abbas concordaram em relançar as negociações diretas para resolver todas as questões. Iniciadas em setembro de 2010, as negociações chegaram a um impasse dentro de semanas.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Milner
Ciclo de violência e cessar-fogo
Uma nova rodada de violência estourou dentro e ao redor de Gaza no final de 2012. Um cessar-fogo foi alcançado entre Israel e os que dominavam a Faixa de Gaza, mas quebrado em junho de 2014, quando o sequestro e assassinato de três adolescentes em mais violência. O conflito terminou com um novo cessar-fogo em 26 de agosto de 2014.
Foto: picture-alliance/dpa
2017: Conferência de Paris
A fim de discutir o conflito entre israelenses e palestinos, enviados de mais de 70 países se reuniram em Paris. Netanyahu, porém, viu as negociações como uma armadilha contra seu país. Tampouco representantes israelenses ou palestinos compareceram à cúpula. "Uma solução de dois Estados é a única possível", disse o ministro francês das Relações Exteriores Jean-Marc Ayrault, na abertura do evento.
Foto: Reuters/T. Samson
2017: Deterioração das relações
Apesar de começar otimista, o ano de 2017 trouxe ainda mais estagnação no processo de paz. No verão do hemisfério norte, um ataque contra a polícia israelense no Monte do Templo, um local sagrado para judeus e muçulmanos, gerou confrontos mortais. Em seguida, o plano do então presidente dos EUA, Donald Trump, de transferir a embaixada americana para Jerusalém minou ainda mais os esforços de paz.
Foto: Reuters/A. Awad
2020: Tiro de Trump sai pela culatra
Trump apresentou um plano de paz que paralisava a construção de assentamentos israelenses, mas mantinha o controle de Israel sobre a maioria do que já havia construído ilegalmente. O plano dobrava o território controlado pelos palestinos, mas exigia a aceitação dos assentamentos construídos anteriormente na Cisjordânia como território israelense. Os palestinos rejeitaram a proposta.
Foto: Reuters/M. Salem
2021: Conflito eclode novamente
Planos de despejar quatro famílias palestinas e dar suas casas em Jerusalém Oriental a colonos judeus levaram a uma escalada da violência em maio de 2021. O Hamas disparou foguetes contra Israel, enquanto ataques aéreos militares israelenses destruíram prédios na Faixa de Gaza. A comunidade internacional pediu o fim da violência e que ambos os lados voltem à mesa de negociações.
Foto: Mahmud Hams/AFP
2023: Terrorismo do Hamas e retaliações de Israel
No início da manhã de 7 de outubro, terroristas do grupo radical islâmico Hamas romperam barreiras em alguns pontos da Faixa de Gaza, na fronteira com Israel, e, em território israelense, feriram e mataram centenas de pessoas, além de sequestrarem mais de uma centena. Devido a isso, Israel declarou "estado de guerra" e iniciou uma série de bombardeios, deixando partes da Cidade de Gaza em ruínas.