O que se sabe sobre a queda do avião que matou Zavascki
Nathalia Tavolieri
20 de janeiro de 2017
Relator da Lava Jato no Supremo morreu nesta quinta-feira quando sobrevoava o litoral sul do Rio de Janeiro. Confira o que já foi esclarecido sobre a queda do avião e como está o andamento das investigações.
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O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, morreu nesta quinta-feira (19/01), aos 68 anos, em um acidente aéreo, em Paraty, no litoral sul do Rio de Janeiro. Confira o que se sabe até o momento sobre a queda do avião.
Como ocorreu o acidente?
O ministro Teori Zavascki viajava em um avião de pequeno porte de São Paulo com destino a Paraty. A aeronave decolou às 13h01 do Campo de Marte,na capital paulista, e partiu para a Costa Verde do Rio de Janeiro. Menos de 45 minutos após a decolagem, a aeronave caiu nas proximidades da Ilha Rasa, a apenas dois quilômetros da pista de Paraty.
A infraestrutura do aeroporto de Paraty é simples. Não há torre de comando nem controladores de voo, e cabe ao piloto avaliar visualmente as condições para pouso e decolagem. Entre 13h e 14h, o horário da queda, chovia forte na região e, segundo relato de testemunhas, a visibilidade era baixíssima. Um barco de pesca teria avistado o bico da avião já para fora da água e informou a Marinha por volta das 13h45.
No final da tarde, Francisco Zavascki, filho de Teori, confirmou a morte do pai pelas redes sociais. "Caros amigos, acabamos de receber a confirmação de que o pai faleceu! Muito obrigado a todos pela força!"
Qual era o tipo do avião?
O ministro viajava em um bimotor de pequeno porte, de prefixo PR-SOM, modelo Hawker Beechcraft King Air C90. O avião tinha capacidade máxima para oito passageiros. Cinco estavam a bordo. De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a documentação da aeronave estava regular, com validade até abril de 2022, e a inspeção da manutenção era válida até abril de 2017. O avião pertencia ao grupo Emiliano, dono do Hotel Emiliano, um dos mais luxuosos do país, com unidades em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Quem estava a bordo?
A aeronave transportava cinco pessoas. Além do ministro Teori Zavascki, estavam a bordo o piloto, Osmar Rodrigues, de 56 anos; o fundador do grupo Emiliano, Carlos Alberto Fernandes Filgueiras, de 69 anos (amigo próximo do ministro); e duas mulheres, que só foram identificadas na tarde desta sexta-feira (20/01) pela direção do hotel. As duas passageiras eram Maira Lidiane Panas Helatczuk, de 23 anos, e sua mãe, Maria Ilda Panas, de 55.
Segundo reportagem da coluna Expresso, da revista Época, Maira era estudante de fisioterapia da Unip, de São Paulo, e fazia estágio no Hotel Emiliano. Ela trabalhava como massoterapeuta de Carlos Alberto Fernandes Filgueiras, o dono do hotel, que passava por tratamento no ciático. A mãe da estudante estava em São Paulo desde a semana passada, para comemorar o aniversário da filha. Segundo comunicado oficial do hotel, a mãe viajou a convite do empresário para acompanhar a filha. Ainda de acordo com a revista Época, em decorrência das constantes dores nas costas, Filgueiras levava com frequência uma massagista em suas viagens.
De acordo com reportagem do jornal Folha de S. Paulo, um dos mergulhadores que trabalhava nas buscas afirmou que a massagista foi encontrada ainda com vida. O mergulhador teria quebrado o vidro do avião para tentar salvá-la e tentou colocar uma mangueira de oxigênio em sua boca para que ela voltasse a respirar, mas a garota não resistiu. Em vídeo, a mãe de um dos moradores que ajudou no trabalho de resgate às vítimas disse à coluna Expresso que a jovem estava "muito desesperada" e dizia aos mergulhadores: "Me ajudem, pelo amo de Deus".
O piloto Osmar Rodrigues, conhecido entre os colegas como "Mazinho", era considerado um piloto "muito cuidadoso" e experiente. Segundo o jornal Bom Dia Brasil, ele fazia o percurso São Paulo-Paraty há 20 anos e chegou a conceder palestra com orientações de como voar o trecho com segurança.
Nesta sexta-feira, os corpos do ministro, do empresário, das duas mulheres e, por último, do piloto, foram encaminhados ao Instituto Médico Legal.
Como está o andamento das buscas?
As buscas tiveram início na tarde de quinta-feira por homens do Grupamento de Busca e Salvamento do Rio de Janeiro, do Quartel dos Bombeiros de Paraty e da Capitania dos Portos. A operação, que havia sido encerrada por volta das 2h desta sexta-feira, foi retomada no início da manhã. Após a retirada de todos os corpos de dentro da água, os trabalhos no local se concentram agora no içamento da aeronave e na procura por pistas que possam esclarecer o que provocou o desastre aéreo.
Como estão as investigações?
A Polícia Federal (PF), o Ministério Público, (MPF) e a Aeronáutica apuram as causas da queda da aeronave. PF e MPF já abriram inquéritos para investigar o que derrubou o avião. Desde a noite de quinta-feira, uma equipe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão ligado à Aeronáutica, está no local do acidente para análise de destroços, busca de indícios de falhas e levantamento de hipóteses sobre as condições da aeronave nos momentos finais de voo. A investigação também vai avaliar aspectos humanos (médicos e psicológicos) e operacionais (rota, meteorologia) que podem ter contribuído para a queda do avião. O prazo para conclusão das investigações vai variar de acordo com a complexidade do caso.
Em seu perfil no Facebook, Francisco Zavascki, um dos filhos de Teori, demonstrou apoio às investigações. "Quero justiça!!!", afirmou. "Não deixarei essa injustiça cair no esquecimento humano."
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.