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O que separa o Brasil de uma crise cambial?

12 de junho de 2018

Cotação do dólar, que quase cruzou marca dos 4 reais, alimentou temor de que país possa estar passando por cenário argentino ou turco. Mas, apesar do nervosismo observado no mercado, a realidade brasileira é diferente.

Brasilianischer Real-Währung
Foto: picture-alliance/dpa/L. Schulze

As recentes altas do dólar frente ao real levantaram o temor de que o Brasil possa estar prestes a viver uma crise cambial como a da Argentina. Somente neste ano, a desvalorização acumulada do real já alcança 20%.

A disparada da moeda americana e o exemplo do vizinho argentino – e também de países como a Turquia – levaram o presidente Michel Temer no dia 7 de junho a assegurar que "não há risco de crise cambial" no Brasil.

No dia anterior, o economista e guru de mercados internacionais Mohamed A. el-Erian havia alertado sobre a possibilidade de o Brasil ser o próximo país emergente a entrar em crise financeira.

"Depois de Argentina e Turquia, o Brasil será o próximo a enfrentar um distúrbio no mercado de câmbio?”, publicou ele no Twitter.

Na última quinta-feira (08/06), o dólar chegou a atingir a máxima de 3,9674 reais. Após atuação do Banco Central para segurar a moeda por meio de leilões de swap cambial – equivalentes à venda futura de dólares – a cotação fechou em cerca de 3,90 reais.

Nesta segunda-feira (11/06), a moeda fechou em 3,72 reais após forte atuação do BC, que ofertou 2,5 bilhões em swaps cambiais. A expectativa é que entre os dias 8 e 15 de junho as ofertas de swap alcancem mais de 24 bilhões de reais.

Na Argentina, a desvalorização do peso levou o país a recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para pedir um empréstimo de 50 bilhões de dólares. Tanto a Argentina como a Turquia – que passa por uma turbulência similar – vêm sendo afetadas especialmente pelo aumento da taxa de juros nos EUA, que levou investidores a retirar valores de países emergentes em busca dos rendimentos mais seguros na economia americana. É comum que o dólar ganhe força quando o Fed (o banco central americano) aumenta os juros.

Em 2001, os dois países já haviam passado por graves crises financeiras, que derreteram suas moedas. A Argentina chegou a declarar a maior moratória da história.

Apesar das altas do dólar e do nervosismo observado no mercado na semana passada, o cenário brasileiro é diferente da Argentina e da Turquia.

"Não há nenhum sentido em comparar o Brasil a esses países. O que ocorreu foi um momento de pânico disfuncional", garante Lívio Ribeiro, pesquisador da Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-IBRE).

Ribeiro lembra que a Argentina e a Turquia são países com déficit em conta corrente elevado e têm uma parcelada considerável da dívida em dólar e euro - no caso da Argentina, o percentual passa de 50%.

A situação do Brasil é diferente. A parcela em dólar da dívida é extremamente baixa, não chega a 3% – o país é até mesmo credor líquido em dólar, ou seja, quando a moeda americana sobe, a dívida do país cai. Além disso, o déficit em transações – as trocas com outros países –do Brasil é baixo.

"A situação brasileira tem uma dualidade relevante neste momento. O país não tem risco de crise cambial, já que tem mecanismos para gerar liquidez na busca de proteção e no mercado a vista, face a expressividade de suas reservas cambiais, mas ao mesmo tempo tem um contexto econômico e político amplamente deteriorado que faz com que ocorra forte aversão ao seu risco, o que desvaloriza de forma consistente sua moeda", afirmou Sidnei Moura Nehme, economista e diretor-executivo da corretora NGO.

O país ainda possui reservas cambiais que chegam a 380 bilhões de dólares. Até o momento, nem recorreu a elas. Apenas as operações anunciadas de swap já alcançam metade do valor envolvido no acordo da Argentina e o FMI, o que dá uma dimensão da diferença das ferramentas à disposição de cada país. Antes do acordo com o FMI, os argentinos viram suas reservas caírem para menos de 50 bilhões de dólares.  

"A mera ameaça do Banco Central em agir já levou a moeda a cair", explicou Ribeiro, citando os leilões de swap cambial realizados pelo BC na semana passada, que provocaram queda de 20 centavos no dólar em apenas um dia, a maior queda em um período tão curto desde 2008.

Segundo Ribeiro, é possível que o Brasil experimente mais altas da moeda até o fim do ano por causa de "eventos disfuncionais", ou pânicos que podem ter como gatilho o cenário eleitoral ou novos episódios da crise política.

Ainda assim, nenhum desses episódios deve resultar em uma crise cambial como as que ocorreram no Brasil em 1999 e 2002. "O cenário hoje é totalmente diferente. O país conta com amplas reservas internacionais e não tem déficit elevado em transações. Não se pode comparar os fundamentos brasileiros com os da Argentina e da Turquia", diz.

Ainda segundo Ribeiro, apesar de cenário tranquilizador no curto prazo, o país continua com problemas estruturais que podem favorecer cenários adversos no futuro. "A questão fiscal e a necessidade de reformas são um consenso entre economistas, mas não entre a sociedade. E também persiste a incapacidade crescimento sustentável da economia", concluiu. 

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