O segundo lar de Thomas Mann no exílio
2 de setembro de 2012Como muitos opositores do regime nazista, o escritor alemão Thomas Mann não se sentia realmente seguro em nenhum lugar da Europa. Por isso a opção pelos EUA para viver, embora o país lhe fosse, de início, totalmente estranho.
Os norte-americanos o receberam de braços abertos. Pouco depois de sua chegada a Nova York, ele concedeu uma entrevista para a imprensa, no dia 21 de fevereiro de 1938, na qual declarou: "Onde estou, está a Alemanha. Carrego comigo a cultura alemã". Mann, então com 63 anos, não aceitava que sua identidade alemã fosse usurpada por Hitler.
Depois da ascensão dos nazistas ao poder, em 1933, Mann, que se encontrava numa viagem ao exterior para proferir palestras, não havia mais regressado à Alemanha. Em 1936, o regime nazista lhe tirou a cidadania alemã. Depois de várias estações provisórias, ele se mudou definitivamente, em fevereiro de 1938, para os EUA.
"Povo infantil"
Durante os anos 1920, Thomas Mann demonstrava pouco interesse pelos EUA e definia os norte-americanos como um "belo, enérgico e civilizado povo infantil". Ele se referia aos norte-americanos, como muitos alemães o faziam naquela época, num tom cordial, mas ao mesmo tempo paternalista.
Sua visão sobre os EUA viria a se alterar somente depois da mudança para o país. No fim, ele acabou por se adaptar pelo menos em parte ao american way of life: ele se interessava por baseball, degustava um bloody mary à noite e gostava dos filmes nacionais. Em 1944, recebeu a cidadania norte-americana.
Os conhecimentos de inglês de Thomas Mann eram, a princípio, parcos, mas foram melhorando no decorrer dos anos. Seus filhos, ao contrário, falavam muito bem o idioma. Quando tinha que falar em público em inglês, o escritor optava por ler o discurso. Os acontecimentos mundiais ele acompanhava pelos grandes jornais norte-americanos.
Encontro decisivo
Foi graças à jornalista Agnes E. Meyer que Thomas Mann teve uma vida relativamente confortável nos EUA. Ela o entrevistou no dia 22 de abril de 1937 para o jornal Washington Post, no Hotel Bedford, em Nova York, ainda antes da mudança do escritor para o país.
Mann encontrava-se em meio a uma viagem para proferir palestras. Meyer, descendente de alemães, tornou-se uma de suas maiores admiradoras. Ela era rica e influente. O marido era dono do Washington Post. Foi ela quem abriu para Thomas Mann as portas para os melhores círculos da sociedade, primeiro em Nova York, depois em Washington. Até mesmo o acesso ao então presidente do país, Franklin Delano Roosevelt, foi propiciado a Thomas Mann pela jornalista.
Meyer conseguiu que o escritor, depois de sua mudança para os EUA, tivesse um emprego na Universidade de Princeton, localizada a apenas uma hora de trem de Nova York. Ali ele tinha garantida uma boa renda e convivia com o físico Albert Einstein, também professor na instituição.
Ao mesmo tempo, Thomas Mann não tinha quaisquer obrigações na universidade que lhe tomassem muito tempo, podendo regressar quando queria a Nova York, onde se encontrava com seus editores e com outros imigrantes alemães.
Hotel Bedford
Em Nova York, Thomas Mann vivia no Hotel Bedford, no coração de Manhattan. O gerente do hotel, Anton Nagel, era um imigrante alemão, que o escritor já conhecia pessoalmente há anos. No Hotel Bedford, que ficava na 118 East 40th Street, estavam também seus filhos Klaus e Erika Mann. Ambos faziam, assim como o pai, diversas viagens pelos EUA a fim de proferir palestras, em sua maioria de alerta aos ouvintes norte-americanos contra o regime de Hitler.
Os meses que Klaus Mann viveu no Hotel Bedford estão entre os mais produtivos de sua vida. Ali ele escreveu o romance O Vulcão, que trata do destino dos emigrantes alemães depois da ascensão dos nazistas ao poder. Klaus Mann acreditava que este era seu romance mais importante. Depois da primeira publicação – o livro nunca se tornou um sucesso de público – seu pai também reconheceu o valor da obra.
Difícil relação entre pai e filho
A relação entre pai e filho era tensa. Thomas Mann rejeitava categoricamente a homossexualidade, que o filho não escondia. O escritor era, também para os demais membros da família, muitas vezes inacessível, refugiando-se com frequência para escrever. Os filhos o chamavam de "o mágico".
No Hotel Bedford, a família Mann encontrou também o médico e intelectual alemão Martin Gumpert, que vivia num quarto no oitavo andar e manteve um relacionamento com Erika Mann. Ele tratava de Klaus Mann, que sofria de depressão e era dependente de drogas. Uma das personagens de O Vulcão lembra Gumpert.
Thomas Mann e Richard Wagner
Thomas Mann costumava ouvir música clássica. Em Nova York, frequentava concertos sinfônicos. E mantinha uma relação complicada com a obra de Richard Wagner. Se por um lado ele adorava a música do compositor, especialmente a peça Lohengrin, por outro, a apropriação da obra de Wagner pelos nazistas era evidente.
Em 1941, a família Mann deixou New Princeton para se estabelecer ao norte de Los Angeles, na Califórnia. O Hotel Bedford, contudo, ficou na memória como um lugar onde os Mann se sentiam bem. Sempre que iam a Nova York, passavam com prazer por lá, pois o hotel havia se tornado, nos tempos difíceis, uma espécie de segundo lar para eles.
Autor: Miodrag Soric (sv)
Revisão: Alexandre Schossler