O sonho americano de Merkel se o Muro ainda existisse
6 de novembro de 2019
Se ainda vivesse na Alemanha Oriental, a líder alemã poderia estar hoje realizando o antigo sonho de viajar pelos EUA ouvindo Bruce Springsteen. Em entrevista, ela diz que ainda é preciso aproximar leste e oeste do país.
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Em um universo paralelo, no qual o Muro de Berlim não tivesse caído, Angela Merkel poderia estar atualmente viajando pelos EUA num Trabant, em vez de estar vivenciando o crepúsculo de sua chancelaria, disse a própria chefe de governo da Alemanha em entrevista à revista alemã Der Spiegel nesta terça-feira (05/11).
Quando questionada sobre o que teria sido dela se a Alemanha tivesse permanecido dividida, a chanceler federal alemã respondeu com humor: "Certamente não teríamos nos conhecido, isso é certo."
Questionada sobre o que estaria fazendo hoje em dia, Merkel disse que poderia ter realizado seu sonho: "Eu queria que minha primeira longa viagem fosse para os Estados Unidos. Devido ao seu tamanho, sua diversidade e cultura. Ver as Montanhas Rochosas, dirigir por aí e ouvir Bruce Springsteen – esse era o meu sonho", contou, referindo-se ao cantor americano conhecido por sucessos como Born in the USA.
Depois de reiterar que ela também gostaria de ter explorado a Alemanha, a chanceler federal alemã, de 65 anos e que cresceu na Alemanha Oriental, apontou que estaria aposentada a esta altura e, portanto, teria permissão para deixar a antiga República Democrática Alemã (RDA).
30 anos da queda do Muro de Berlim
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"Na RDA, as mulheres se aposentavam aos 60 anos, assim eu poderia ter pegado meu passaporte cinco anos atrás e viajado para os EUA. Os aposentados tinham a liberdade de viajar na RDA – qualquer pessoa que não fosse mais necessária como trabalhadora socialista podia sair", disse Merkel à revista Der Spiegel.
Quando os repórteres questionaram se ela teria pegado um carro americano, ela negou. "Não. Eu simpatizo com carros menores. Mas o que poderia ter sido melhor do que um Trabant?"
A entrevista à revista Der Spiegel foi concedida num momento em que a Alemanha reflete sobre os 30 anos da queda do Muro de Berlim, celebrados em 9 de novembro.
Depois de crescer no empobrecido e menos desenvolvido Leste Alemão, Merkel entrou na política apenas com trinta e poucos anos de idade, quando o comunismo desmoronou.
Descontentamento não justifica o ódio
Na entrevista, a chanceler federal alemã alertou que desilusão e descontentamento com o governo alemão não dão às pessoas um "direito ao ódio" – uma referência indireta a recentes sucessos eleitorais da legenda populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD).
"Eu sei que para alemães orientais de uma certa geração a vida se tornou livre após a revolução pacífica, mas nem sempre mais simples", afirmou Merkel. "Mesmo assim, 30 anos depois, é preciso deixar claro: mesmo se você não estiver satisfeito com o transporte público, a assistência médica, o modo de agir do Estado em geral ou a sua própria vida, isso não lhe dá o direito ao ódio e ao desprezo pelos outros ou mesmo à violência."
A AfD recebeu mais de 20% dos votos e terminou como segundo partido mais votado nas recentes eleições estaduais de Saxônia, Brandemburgo e Turíngia, regiões nas quais as pessoas continuam se sentindo em desvantagem mesmo 30 anos após a Reunificação alemã.
Os protestos que levaram à queda do Muro de Berlim
03:18
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A desilusão nos últimos anos com a chanceler federal alemã e seu governo, alimentada principalmente pelo grande afluxo de migrantes em 2015, foi sentida com mais intensidade no Leste Alemão.
Merkel contou à revista Der Spiegel que, como chanceler federal, ela é responsável por todos os alemães. "Portanto, a suposição de que eu deveria cuidar primariamente dos interesses dos alemães orientais é errada, mas, se ela fosse seguida, isso evidentemente levaria a desapontamentos".
A chanceler federal alemã também enfatizou a necessidade de um melhor "diálogo interno alemão", entre as antigas Alemanha Oriental e Ocidental.
Os Estados Unidos, o destino sonhado por Merkel, tradicionalmente visto como sinônimo de liberdade e oportunidade, também sofreu uma guinada política para a direita nos últimos anos.
Desde que assumiu o cargo em 2016, o presidente americano Donald Trump defendeu repetidamente a construção de um muro ao longo da fronteira dos EUA com o México, além de impulsionar políticas que visam conter a imigração legal e ilegal.
De jovem cientista da Alemanha Oriental à primeira mulher a liderar uma das maiores potências do mundo: em 17 de julho, a chanceler federal completa 65 anos.
Foto: imago
Futuro brilhante
Quem diria que Angela Dorothea Kasner seria um dia a mulher mais poderosa do mundo? Dedicação, objetividade, discrição, pés no chão: são as qualidades que lhe transmitiu o lar protestante em Templin, no estado de Brandemburgo, na antiga Alemanha Oriental, embora ela tenha nascido em Hamburgo. O pai era pastor luterano, e a mãe ficava em casa, cuidando de "Angie" e de seus dois irmãos mais novos.
Foto: imago
Raízes polonesas
Os avós Greta e Ludwig Kazmierczak com o filho Horst, pai de Merkel. A família de origem polonesa mudou-se de Poznań (Posen, em alemão) para Berlim e, em 1930, trocou seu nome para Kasner. As raízes não alemãs da chanceler federal só foram divulgadas em 2013, causando um alvoroço temporário, sobretudo na Polônia. O sobrenome Merkel veio do primeiro marido, Ulrich Merkel, com quem se casou em 1977.
Foto: picture-alliance/dpa
Aluna aplicada
Esta foto foi tirada em 1973, num acampamento em Himmelfort, após Merkel concluir o curso secundário com uma média de 1,0 – nota máxima no sistema escolar alemão. Seus fortes eram russo e matemática. Durante a escola, foi filiada à associação juvenil socialista Juventude Alemã Livre (FDJ). Ela é a primeira chefe de governo da Alemanha crescida no regime comunista da Alemanha Oriental.
Foto: picture-alliance/dpa
Ciência em vez de rock 'n' roll
Na década de 70, Merkel estuda Física em Leipzig. Depois, trabalha no Instituto de Química da Academia de Ciências da República Democrática Alemã (RDA). Sua tese de doutorado é sobre reações de desintegração. Nesse período, conhece o primeiro marido. "Angela me chamou a atenção por ser amigável, aberta e natural", lembra Ulrich Merkel. Um dos prazeres dela é viajar – como nesta foto, em Praga.
Foto: picture-alliance/dpa
Apoio de Kohl
"Um dia, ela pegou suas coisas e se foi do quartinho em que vivíamos", conta o ex-marido. O banheiro era compartilhado com outros estudantes. "Ela levou a máquina de lavar, e eu fiquei com os móveis." Merkel passa a ser politicamente ativa, primeiro no movimento oposicionista Despertar Democrático, depois na União Democrata Cristã (CDU). Lá, conquista a confiança do chefe do partido, Helmut Kohl.
Foto: Reuters
Apesar dos ventos contrários
Merkel esforça-se para subir e, em 1990, torna-se deputada federal no Bundestag. O então premiê, Helmut Kohl, a nomeia ministra para Assuntos Femininos e Juvenis, embora a alemã-oriental não disponha de bons contatos na CDU e tenha pouca experiência. Quatro anos mais tarde, ela se torna ministra do Meio Ambiente, além de ser responsável pela segurança das usinas nucleares.
Foto: Reuters
Sem dó nem piedade
Em 1998, Merkel é nomeada secretária-geral da CDU, e, quatro anos depois, torna-se presidente do partido. No meio tempo, renegara publicamente seu padrinho político, Kohl, retirando-lhe todo apoio no contexto de um escândalo de doações partidárias. Em 2005, por fim, se elege chanceler federal, vencendo o social-democrata Gerhard Schröder. Sob a nova chefe, a CDU se torna um partido mais de centro.
Foto: Reuters
Motivos para rir
Merkel move-se sem problemas no mundo masculino da política. Encabeçando a locomotiva econômica europeia, ela dita o tom durante a crise financeira mundial e defende os interesses alemães. Críticos no país a acusam de excesso de manobras e estratégias e também carência de palavras claras – sobretudo quando o assunto é o escândalo de espionagem da NSA na Alemanha.
Foto: Reuters
Relação com Putin
Mesmo antes da crise da Crimeia, a relação entre Merkel e o presidente da Rússia, Vladimir Putin, não era tão amigável como a deste com o antigo chanceler federal Gerhard Schröder. Porém, Putin diz ter grande respeito por Merkel, e ambos conversam fluentemente tanto em alemão como em russo.
Foto: picture-alliance/AA/M. Gambarini
"Primeira dama"
Com a política mundial nas mãos de sua esposa, Joachim Sauer pode cumprir sem preocupações o papel de "primeira dama" da Alemanha. Merkel casou-se com seu segundo marido em 1989. Com fama de ser avesso às atenções públicas, Sauer é professor de Química e tem dois filhos do primeiro casamento.
Foto: Reuters/A. Gebert
Como a Casa Branca para os americanos...
... ou o Palácio do Eliseu para os franceses, assim está a residência no bairro berlinense de Mitte para o casal Merkel-Sauer. A chanceler federal não necessita de muita pompa. Os vizinhos a encontram regularmente no supermercado, pois ela não abre mão de fazer as compras, nem de cozinhar de vez em quando para o marido.
Foto: picture-alliance/dpa
Música erudita e futebol
Assim como na política, também no lazer ela parece atender a uma ampla gama de gostos, mostrando ser tanto amante da música erudita (sempre presente no Festival Wagner de Bayreuth), como do futebol. Na foto, Merkel com a seleção de Joachim Löw, campeã da Copa do Mundo de 2014.
Foto: Reuters
Crise dos refugiados
A abertura das fronteiras aos refugiados em 2015 foi uma medida que a chanceler federal alemã, Angela Merkel, bancou sozinha, politicamente. Não houve decisão da União Europeia, o Parlamento alemão não foi consultado, e muito menos a população do país.Isso lhe trouxe muitas críticas dentro do próprio partido e arranhou sua imagem junto à população.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Hoppe
Quebrando clichês
Uma mulher que cresceu na Alemanha Oriental, sem padrinhos políticos, que primeiro ascendeu à chefia do partido conservador e, depois, se tornou chanceler federal. E, desde então, já foi reeleita três vezes. Assim chega Merkel aos 65 anos. E a líder alemã já teve até uma peça de teatro dedicada a ela: "Mutti" (Mãezinha, como é apelidada no país), da autora Juli Zeh.
Foto: Reuters
Crises de tremor
Uma série de crises de tremedeira em público nas semanas anteriores fez com que Angela Merkel se decidisse a receber a premiê da Dinamarca sentada em 11 de julho último. Embora Merkel repetidamente tenha assegurado que goza da saúde necessária para continuar no cargo, desenvolveu-se na Alemanha um debate sobre a saúde da chefe de governo.