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OEA apura casos de violência policial contra jornalistas

27 de setembro de 2016

Comissão Interamericana de Direitos Humanos investiga denúncias de abusos e cerceamento da liberdade de imprensa por parte da polícia no Brasil. Desde 2013, mais de 200 jornalistas foram agredidos ao cobrir protestos.

Policial agride foto jornalista durante manifestação em São Paulo
Fotojornalista André Lucas Almeida foi agredido por policial enquanto cobria protesto em São PauloFoto: C.H.O.C Documental/L. Almeida

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos está produzindo um relatório sobre os casos de violência policial sofridos por jornalistas brasileiros durante a cobertura de protestos nos últimos três anos. Órgão independente da Organização dos Estados Americanos (OEA), a CIDH enviou ao país dois representantes para colher relatos, evidências e dados que possam comprovar as recorrentes denúncias de violência, intimidação e cerceamento da liberdade de expressão nos diferentes protestos de rua que eclodiram no país desde 2013.

"O que estamos ouvindo aqui me faz chegar à conclusão de que o Brasil não vive uma democracia. Em uma democracia a polícia serve e protege os cidadãos, não os ataca com balas de borracha e bombas", diz a jamaicana Margarette May Macaulay, integrante da CIDH e ex-juíza da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

O relator especial para Liberdade de Expressão da CIDH, o advogado e jornalista uruguaio Edison Lanza, afirmou que o relatório deve estar pronto no início de 2017, quando será apresentado ao Pleno da Comissão, que vai decidir se o aprova ou não. Se aprovar, a CIDH pode encaminhar uma ação para a Corte Interamericana de Direitos Humanos. A Lei Maria da Penha, por exemplo, é resultado de uma ação proposta pela comissão à corte, que pressionou o Brasil a reforçar a legislação na questão da violência contra a mulher.

"Nós decidimos vir ao Brasil para fazer um relatório específico sobre as violações à liberdade de expressão por conta do aumento contínuo de denúncias de ações das forças de segurança", diz ele, que, além de jornalistas, também se reuniu com movimentos sociais, estudantes secundaristas e integrantes da sociedade civil.

Violência como norma

A violência contra jornalistas têm sido fator recorrente na atuação das forças de segurança brasileira na repressão às manifestações que se tornaram frequentes no país nos últimos anos. De acordo com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), entre 2013 e 2016 foram registrados 208 casos de agressões, prisões indevidas, destruição de equipamentos e cerceamento do trabalho de profissionais de imprensa pelas polícias do país, em especial pela Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Nos últimos meses, os casos de violência policial contra jornalistas voltaram a crescer por conta dos protestos contra o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Neles, um fotógrafo teve seu equipamento destruído pela polícia, e uma manifestante perdeu a visão por ferimentos causados por estilhaços de bomba de efeito moral.

No encontro com jornalistas, os integrantes da CIDH ouviram depoimentos como o do fotojornalista André Lucas Almeida, do coletivo C.H.O.C Documental e autor da fotografia que abre esta reportagem. "Fui agredido com socos e chutes por apenas estar registrando uma ação da polícia e, ao chegar à delegacia para realizar um boletim de ocorrência contra a agressão, fui intimidado pelo delegado, que ameaçou me investigar. De vítima virei suspeito."

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo, estado onde ocorreram a maior parte das agressões, ingressou com uma ação judicial na tentativa de pressionar o governo a adotar protocolos mais rígidos na atuação dos policiais. "A polícia vê os manifestantes como inimigos, e o jornalista é visto como se estivesse no meio de tropas inimigas", diz Paulo Zocchi, presidente do sindicato. A Secretaria de Segurança Pública do Estado, responsável pelo aparato de segurança de São Paulo, afirma que a Polícia Militar age conforme a lei e que eventual desvios de conduta são investigados pela Corregedoria.

Processo por uso excessivo de força

O Ministério Público Estadual de São Paulo (MPSP) não está tão certo disso. Nesta quarta-feira, a Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos do MP realizará uma audiência pública para ouvir os jornalistas agredidos pela polícia. A ação não tem ligação com o relatório que está sendo realizado pela CIDH e servirá para embasar uma ação civil pública que o próprio MPSP pretende ingressar contra o Estado de São Paulo.

A principal crítica aos métodos policiais é o uso indiscriminado de munição menos letal, como bombas de efeito moral, tiros com bala de borracha a curta distância e aplicação excessiva da força física para conter os manifestantes. Por conta dessas ações, centenas de pessoas ficaram feridas pela ação da polícia nesses protestos.

Um dos casos mais dramáticos e emblemáticos da violência policial contra jornalistas na cobertura de protestos, o fotógrafo Sérgio Silva, de 34 anos, perdeu a visão do olho esquerdo ao ser atingido por uma bala de borracha disparada a queima-roupa. "Foi no dia 13 de junho de 2013. Eu estava sozinho fotografando a manifestação quando, de repente, a polícia começou a lançar bombas, houve um grande tumulto e fui atingido pelo tiro", conta ele. "Caí no chão sangrando, e um professor que estava na manifestação me socorreu. Caminhamos 40 minutos até chegar a um hospital, onde fui atendido".

Sergio Silva ingressou com uma ação de indenização contra o Estado pedindo reparações pelo dano sofrido. No entanto, a Justiça de São Paulo entendeu que o fotógrafo havia sido o "único e exclusivo" culpado pelo ferimento que sofreu, por ter se posicionado na linha de tiro entre policiais e manifestantes. "Mesmo que houvesse provas de que o ferimento experimentado pelo autor tenha sido provocado por bala de borracha disparada pela polícia, ainda assim não haveria de se cogitar da pretendida indenização", escreveu o juiz da 10ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, Olavo Zampol Júnior, na sentença do caso.

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