Ofensiva curda iraquiana rompe cerco do EI no norte do Iraque
19 de dezembro de 2014
No mais bem sucedido ataque contra jihadistas desde início da ofensiva, tropas peshmerga retomam Monte Sinjar e libertam centenas de yazidis. EUA anunciam morte de líderes extremistas e creem em enfraquecimento do EI.
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Esta é considerada, até então, a ofensiva mais bem sucedida contra o "Estado Islâmico" (EI). Combatentes curdos, apoiados pela força aérea da coligação internacional, romperam nesta quinta-feira (18/12) o cerco do Monte Sinjar, no norte do Iraque. O território era dominado há várias semanas pelo grupo extremista do EI.
"As forças peshmerga alcançaram o monte Sinjar, o local mais elevado da montanha. Uma vasta área foi liberada", declarou o presidente do Conselho de Segurança Nacional da região iraquiana curda, Masrour Barzani. Na área, centenas de pessoas da minoria religiosa yazidi estiveram encurraladas por meses.
A operação para recuperar a montanha levou dois dias. Desde o começo desta semana, foram efetuados cerca de 70 ataques aéreos no Iraque – um dos bombardeamentos mais pesados desde o início do apoio aéreo dos Estados Unidos, em agosto. Somente na região do Monte Sinjar, os militares americanos comunicaram "45 ataques em apoio aos peshmerga e às forças de segurança iraquiana que operam na região".
"Estado Islâmico": de militância sunita a califado
Origens do grupo jihadista remontam à invasão do Iraque, em 2003. Nascido como oposição ao domínio xiita e inicialmente um braço da Al Qaeda, EI passou por mudanças e virou uma ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com a derrubada do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo sunita surgiu a partir da união de diversas organizações extremistas, leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra a ascensão dos xiitas ao governo iraquiano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al Qaeda
A insurreição se tornou cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi, fundador da Al Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se voltaram contra eles e se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
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Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea e ele foi sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Omar al-Bagdadi. A AQI mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). No ano seguinte, Washington intensificou sua presença militar no país. Masri e Bagdadi foram mortos em 2010.
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Volta dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a se reagrupar, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
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Ruptura com Al Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o EIIL atravessou a fronteira para participar da luta contra o presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram se fundir com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EIIL e a central da Al Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
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Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do racha com a Al Qaeda, o EIIL fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando sua segunda maior cidade, Mossul, em 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já havia sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
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Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Ela é uma importante rota de exportação de petróleo e ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Mas a conquista da cidade é vista como apenas uma etapa para os extremistas, que pretenderiam avançar a partir dela.
Foto: Getty Images
Atual abrangência do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho, a organização declarou um "Estado Islâmico" que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e tem Abu Bakr al-Bagdadi como "califa".
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As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da charia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado" após serem colocados diante da opção: converter-se ao islã sunita, pagar um imposto ou serem executados. Os xiitas também eram alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o patrimônio histórico
O EI destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. Eles diziam que esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do Islã. Especialistas afirmam, porém, que o grupo faturou alto no mercado internacional com a venda ilegal de estátuas menores, enquanto as maiores eram destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Durante suas ofensivas armadas, o "Estado Islâmico" saqueou centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupou diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Seus militantes também se apossaram do armamento militar de fabricação americana das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
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"A operação foi um sucesso e agora podemos retirar as pessoas da montanha para lugar mais seguros, se elas assim desejarem. Vamos tentar limpar completamente toda a área", completou Barzani. "Nós damos esta notícia ao povo do Curdistão e ao mundo. Os inimigos do Curdistão, os inimigos da humanidade e da coexistência sofreram uma grande derrota."
Ainda durante esta semana, os peshmerga afirmaram que recapturaram seis regiões durante a fase inicial da ofensiva. A estimativa é de que 100 combatentes do EI tenham sido mortos. Os cerca de 8 mil soldados curdos peshmerga recapturaram aproximadamente 700 quilômetros quadrados de território. Nas redes sociais, combatentes curdos divulgaram diversas fotografias ao lado de corpos de jihadistas do EI.
EUA anunciam morte de líderes do EI
A quebra do cerco no Monte Sinjar é acompanhada de relatórios divulgando que os ataques aéreos no norte do Iraque mataram vários líderes do "Estado Islâmico" ao longo das últimas semanas.
"Posso confirmar que, desde meados de novembro, a coalizão realizou ataques aéreos que mataram vários líderes do alto e médio escalão", confirmou o porta-voz do Pentágono, o contra-almirante John Kirby, através de um comunicado.
"Acreditamos que a perda desses líderes-chave degrada a capacidade do EI de comandar e controlar operações contra as forças de segurança iraquianas, incluindo as forças locais curdas", disse Kirby.
Recentemente a administração do presidente Barack Obama decidiu enviar mais 1,5 mil soldados americanos ao Iraque para aconselhar e treinar os iraquianos. Nas próximas semanas, as primeiras tropas americanas chegarão ao Iraque para treinar forças iraquianas a recuperar áreas tomadas pelo EI, como a cidade de Mosul, no norte do país.
"Acho que o que devemos fazer, especialmente no interior do Iraque, é continuar o treinamento. Acho que estamos falando de um mínimo de três anos", disse o tenente-general do Exército dos EUA, James Terry. Mas ele preferiu não comentar quando uma potencial operação para retomar Mosul pode ser lançada.
PV/pa/afp/rtr/lusa/ap
Vida e tradições dos yazidis
Desde os ataques da organização terrorista “Estado Islâmico“, os yazidis entraram no foco da atenção pública mundial. Porém pouco se sabe sobre as origens, crenças e tradições dessa comunidade etnorreligiosa curda.
Foto: Yezidisches Forum e.V.
Pavão Anjo
A crença dos curdos yazidis é mais antiga do que o cristianismo e o islã. Em sua teologia, existe um Deus acima de tudo, mas não existe um diabo. Melek Taus, o "Pavão Anjo", tem significado central. Segundo a mitologia yazidi, ele honrou de maneira especial a onipotência de Deus, sendo, por isso, eleito chefe dos sete anjos.
Local sagrado
O santuário mais importante para os yazidis é o sítio de peregrinação Lalish. Lá se encontram duas fontes sagradas e o túmulo do xeique Adi ibn Musafir, o principal santo dos yazidis. A origem exata de Lalish ainda não foi pesquisada. Hoje, essa região isolada no norte do Iraque é estritamente vigiada por combatentes curdos peshmerga.
Foto: Yezidisches Forum e.V.
Origem no Iraque
A população total dos yazidis é estimada em 800 mil. A maioria vive no norte do Iraque e há pequenos grupos na Síria, Turquia, Armênia e Geórgia. A maior comunidade yazidi na Europa está na Alemanha. Calcula-se que residam no país cerca de 60 mil membros da comunidade, mas não há números exatos a respeito.
Foto: Yezidisches Forum e.V.
Opressão e expulsão
Os curdos yazidis do norte do Iraque já eram uma comunidade religiosa perseguida mesmo antes dos ataques do grupo terrorista "Estado islâmico". Durante o regime de Saddam Hussein (1979-2003) e até antes, eles estiveram expostos à hostilidade de outros grupos religiosos. Alguns muçulmanos consideram os yazidis uma seita rebelde.
Foto: Reuters
Protestos na Alemanha
No segundo semestre de 2014, yazidis protestaram em diversas cidades da Alemanha, pedindo proteção para seus familiares e amigos. Muitos exigiram da União Europeia ações mais decisivas. A maioria dos yazidis da Alemanha vive na Renânia do Norte-Vestfália e na Baixa Saxônia. Muitos imigraram já na década de 1980, como refugiados.
Foto: DW/M. Lütticke
Tradições mantidas
Também na Alemanha os yazidis dão continuidade a suas tradições, o que inclui vestir os trajes típicos nas festas tradicionais. Só se é yazidi de nascença: para eles, é impensável converter outras pessoas à sua religião. Por outro lado, não é fácil deixar a comunidade religiosa curda: os clãs familiares costumam impedir casamentos com não yazidis.
Foto: Yezidisches Forum e.V.
Cemitérios Yazidis
Em Hanover e outras cidades alemãs com grandes comunidades yazidis, desde algum tempo existe a possibilidade de funerais de acordo com as tradições religiosas da comunidade. Os cemitérios mantêm áreas reservadas, onde os mortos são lavados e velados segundo os ritos yazidis. Antes, era comum trasladar os mortos para seus países de origem.
Foto: Yezidisches Forum e.V.
Festa de peregrinos em Lalish
Todo ano, milhares de yazidis peregrinam até Lalisch. Lá veneram seus santos e os celebram com música tradicional religiosa. Para muitos, a peregrinação é um encontro "da grande família yazidi". A tradicional festa se realiza em outubro.