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ONGs denunciam negligência de Bolsonaro na pandemia

2 de julho de 2021

Em audiência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, entidades criticam violações, negacionismo e desinformação durante a crise. Representantes do governo afirmam comprometimento com "missão de salvar vidas".

Jair Bolsonaro
Governo Bolsonaro foi acusado de participação na "supressão de dados, desinformação e intimidação de comunicadores"Foto: Adriano Machado/REUTERS

Numa audiência convocada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) nesta quinta-feira (01/07), organizações não governamentais denunciaram violações de direitos humanos, negligência, negacionismo e desinformação no Brasil durante a pandemia de covid-19. Representantes do governo do presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, usaram o encontro para exaltar medidas adotadas na crise.

A delegação brasileira de entidades da sociedade civil foi representada pelas ONGs Oxfam Brasil, Justiça Global, Coligação Negra por Direitos, Plataforma Dhesca, Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam) e Artigo 19.

Do lado do governo, participaram da audiência virtual representantes dos Ministérios da Saúde, da Cidadania e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, com contribuições dos Ministérios da Economia, da Justiça e das Relações Exteriores.

Num momento em que a CPI da Pandemia investiga ações e omissões do governo Jair Bolsonaro na gestão da pandemia e supostas irregularidades na negociação de vacinas, os representantes dos ministérios afirmaram que o governo adotou uma série de medidas desde o início da pandemia, com destaque para o auxílio emergencial.

Também foi mencionada a campanha de vacinação contra a covid-19. "O ministério desenvolveu um Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação e oferta gratuitamente a vacina contra a covid-19 para toda a população", afirmou Arnaldo Medeiros, secretário de vigilância do Ministério da Saúde, citado pela Folha de S. Paulo.

"Estamos mantendo nossa missão de salvar vidas", completou Medeiros, ignorando o fato de que Bolsonaro minimizou repetidamente a gravidade da covid-19, criticou o isolamento social, promoveu aglomerações, defendeu insistentemente o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença, negou a eficácia de vacinas e ignorou uma série de ofertas feitas pela Pfizer para a compra de seu imunizante.     

As ONGs participantes acusaram o governo de distorcer informações relativas ao auxílio emergencial, lembrando que "durante três meses deste ano, não houve auxílio algum".

Entre abril e dezembro do ano passado, foi concedido auxílio emergencial de R$ 600 por mês. Após uma pausa de três meses, o governo voltou a pagar a ajuda em abril deste ano, com as parcelas mensais entre R$ 150 e R$ 375 – a princípio, por quatro meses.

Jefferson Nascimento, da Oxfam Brasil, ressaltou que o governo não gastou R$ 28,9 bilhões que haviam sido aprovados no âmbito do orçamento autorizado para o auxílio emergencial, segundo levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

"São nítidas a desinformação, o negacionismo e a manipulação da realidade que caracterizam a fala do Estado brasileiro nessa audiência", afirmou a representante da Plataforma Dhesca Brasil, Denise Carreira.

Falta de atenção a grupos vulneráveis

Entre as críticas feitas pelas ONGs também esteve também a falta de atenção a grupos vulneráveis no plano de vacinação, como os sem-teto, os indígenas e os presos.

"Se pegarmos a população privada de liberdade, por exemplo, apenas 5% tomou a primeira dose da vacina. A mesma coisa tem acontecido com a população de rua. É urgente prestarmos atenção a isso", defendeu a coordenadora da ONG Justiça Global, Gláucia Marinho, que denunciou a "negligência" do Estado brasileiro nas ações de mitigação e combate à pandemia.

Ela também apontou que a priorização de indígenas na campanha de vacinação ocorreu somente após determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) e chamou atenção para invasões de áreas indígenas nos últimos meses. "Dados recentes da Comissão Pastoral da Terra mostram que pelo menos 97 áreas indígenas foram invadidas por entes privados em 2020.”

Sheila de Carvalho, da Coligação Negra por Direitos, chamou a atenção para o aumento significativo da população sem-abrigo no Brasil, apontando que mais de 100 mil pessoas ficaram nessa situação no contexto da crise sanitária.

Desinformação

A ONG Artigo 19 denunciou a restrição da liberdade de imprensa e do acesso à informação. "Autoridades do governo têm participação direta na supressão de dados, na propagação da desinformação e na intimidação de comunicadores", disse Ana Gabriela Ferreira, coordenadora de acesso à informação da Artigo 19, citada pela Folha.

O relator da CIDH para o Brasil, Joel Hernández, por sua vez, manifestou preocupação com a situação afirmou que os números de casos e mortes pela covid-19 no Brasil são "alarmantes" e que, enquanto em outros países foi observado um pico da pandemia, o gráfico brasileiro "nunca mostra quedas". Até esta quinta-feira, o Brasil contabilizou mais de 18,6 milhões de casos e mais de 520 mil óbitos em decorrência da doença.

A CIDH deve elaborar um relatório e instar o governo brasileiro a adotar medidas efetivas de combate à pandemia e respeitar direitos humanos, segundo afirmou à Folha Melisanda Trentin, coordenadora da Plataforma Dhesca.

Após a audiência, o Ministério das Relações Exteriores afirmou em nota que o "Brasil permanece ativamente comprometido com o sistema interamericano de direitos humanos".

lf (Lusa, ots)

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