ONU denuncia repressão sistemática a rohingyas em Myanmar
11 de outubro de 2017
Nações Unidas afirmam que Exército conduziu ataques "bem organizados e coordenados" para expulsar minoria muçulmana. Aldeias foram queimadas, e mais de meio milhão de pessoas fugiram para Bangladesh.
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As forças de segurança de Myanmar realizaram ataques "bem organizados, coordenados e sistemáticos" contra os rohingyas, com o objetivo de expulsar a minoria muçulmana do estado de Rakhine, afirmaram as Nações Unidas nesta quarta-feira (11/10).
"Os ataques brutais contra os rohingyas no norte do estado de Rakhine foram bem organizados, coordenados e sistemáticos, com a intenção de não só expulsar a população de Myanmar, mas de impedir que eles retornem às suas casas", conclui uma investigação conduzida pela ONU.
Os resultados foram reunidos num primeiro relatório abrangente sobre a crise humanitária no estado de Rakhine, no oeste de Myanmar, elaborado após uma série de entrevistas com pessoas que buscaram refúgio em Bangladesh. Mais de meio milhão de pessoas fugiram para o país vizinho desde o fim de agosto, segundo dados da ONU.
A sondagem descobriu que a mais recente onda de "operações de limpeza étnica" conduzida por militares em Rakhine, de fato, começou antes de 25 de agosto – possivelmente no início do mês, contrariando as alegações do governo de Myanmar de que a repressão era uma resposta a ataques de militantes.
A investigação descreveu amplamente uma campanha liderada pelo Exército de Myanmar para acabar com a ligação da minoria muçulmana à sua terra natal. Os rohingyas são alvo de perseguição no país de maioria budista há décadas.
"Em alguns casos, antes e durante os ataques, megafones foram usados para anunciar: 'vocês não pertencem a este lugar, vão para Bangladesh. Se vocês não saírem, vamos queimar suas casa e matar vocês'", segundo o relatório.
"Foram feitos esforços para efetivamente apagar memórias e sinais de pontos de referências na geografia da área habitada pelos rohingyas, de tal maneira que um retorno a suas terras lhes daria nada além de um terreno desolado e irreconhecível", acrescentou a ONU.
As conclusões foram baseadas em entrevistas com refugiados da minoria muçulmana que chegaram a Bangladesh entre 14 e 24 de setembro. A equipe da ONU disse ter conversado com centenas de pessoas em 65 entrevistas, algumas com indivíduos e outros em grupos com até 40 pessoas. O relatório contém também informações providas por grupos de assistência médica e humanitária, além de evidências fotográficas e vídeos.
O relatório menciona que aldeias inteiras foram queimadas, e que pessoas foram executadas, estupradas e torturadas. O comissário das Nações Unidas para os direitos humanos, Zeid Ra'ad al-Hussein, descreveu anteriormente a repressão em Myanmar como "um exemplo clássico de limpeza étnica".
PV/dpa/afp
O drama dos rohingya de Myanmar
País majoritariamente budista rejeita a minoria muçulmana. Expulsões, assassinatos e estupros já forçaram mais de 400 mil a buscar refúgio em Bangladesh, mas também lá eles são indesejados.
Foto: picture-alliance/dpa/M.Alam
Ameaçados na terra natal
Em outubro de 2016, um grupo da etnia rohingya foi acusado de matar nove policiais em Myanmar. A partir daí, recrudesceu a histórica perseguição a essa minoria muçulmana no país maioritariamente budista. Nos meses seguintes, mais de 70 mil haviam procurado refúgio em Bangladesh. Um dos acampamentos onde foram acolhidos é Kutuupalang, no município de Cox's Bazar, no sul do país.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/T. Chowdhury
Êxodo em massa
Após novos episódios de violência em agosto 2017, o êxodo da minoria muçulmana de Myanmar se intensificou, sobretudo a partir do estado de Rakhine. Por terra ou por mar têm chegado diariamente a Bangladesh de 10 mil a 20 mil rohingya, entre os quais numerosas mulheres e crianças. Segundo a ONU, 400 mil vivem atualmente como refugiados no país vizinho.
Foto: DW/M.M. Rahman
Condições sub-humanas
Em alguns campos de refugiados, as condições de vida são as mais árduas: não há água corrente, medidas sanitárias ou qualquer outro tipo de infraestrutura. Com argila e outros materiais básicos, eles mesmos construíram cabanas improvisadas, a fim de ao menos ter um teto sobre a cabeça.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/T. Chowdhury
Apátridas
Myanmar se recusa a conceder a nacionalidade birmanesa a seus 1,1 milhão de rohingyas. Apesar de eles alegarem séculos de história, o governo os classifica como ilegais, imigrados de Bangladesh durante o domínio colonial britânico. Além disso, condena o emprego do termo "rohingya" nos documentos das Nações Unidas.
Foto: DW/M.M. Rahman
Crônica da rejeição
Apesar de apelos do secretário-geral da ONU, António Guterres, para que Bangladesh conceda abrigo à minoria perseguida, as autoridades em Dhaka enviaram guardas às fronteiras com o fim de impedir novas travessias. O sofrimento dos rohingya parece não ter fim: organizações de direitos humanos relatam como, em Rakhine, os militares birmaneses incendiaram suas casas, estupraram e assassinaram.
Foto: Reuters/M. Ponir Hossain
Povo mais perseguido
Segundo a ONU, os rohingya são a minoria mais perseguida do mundo. Em Bangladesh eles tampouco são bem-vindos: após a nova onda migratória, o governo anunciou o plano de realocá-los para uma ilha distante, geralmente inundada durante a estação das monções.
Foto: picture-alliance/dpa/M.Alam
Catástrofe humanitária
Originalmente um local turístico com 61 mil habitantes, a cidade litorânea de Cox's Bazaar, em Bangladesh, uma das primeiras a acomodar os refugiados muçulmanos, está com suas capacidades esgotadas. Segundo observadores, a perseguição aos rohingya em Myanmar é apenas em parte religiosa: certos setores da sociedade têm interesse em exterminá-los por motivos políticos e econômicos.
Foto: DW/M.M. Rahman
Apagados da história
A falta de pátria segura confronta os rohingya com um futuro incerto. Enquanto isso, Myanmar planeja obliterar também seu passado: o ministro da Cultura e Assuntos Religiosos anunciou o lançamento de um livro de história sem qualquer menção à minoria muçulmana. "A verdade é que a palavra rohingya nunca foi usada ou existiu como etnia ou raça na história birmanesa", declarou em dezembro de 2016.