Líderes europeus deixam a situação na fronteira da Grécia com a Macedônia se agravar de propósito. Essa é uma política cínica, que deve acabar imediatamente, opina o correspondente em Bruxelas Bernd Riegert.
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A União Europeia (UE) sempre saiu fortalecida de crises. É só quando a pressão chega ao limite que se alcança um acordo de última hora. Essa lição sobre o funcionamento do bloco está sendo posta à prova de forma cínica nesses dias. Por meio da retenção de refugiados e migrantes na fronteira da Grécia com a Macedônia, a Áustria e os países dos Bálcãs elevam enormemente a pressão para que Atenas finalmente aja.
Ao mesmo tempo, as imagens chocantes de refugiados desesperados em meio à fumaça do gás lacrimogêneo devem convencer os chefes de Estado e de governo da UE a – seja lá como for – concordar com uma redistribuição de refugiados. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, continua exigindo essa "solução europeia". Até 7 de março, data da próxima cúpula da UE com a Turquia, a situação humanitária na Grécia deve ter se agravado a ponto de forçar uma solução.
Com as imagens chocantes, o governo austríaco espera assustar potenciais migrantes já na partida, em países como Síria, Iraque e Afeganistão. O que se esquece é que, nas fronteiras gregas, em Atenas, nas ilhas ou no porto de Pireu, há pessoas de verdade sofrendo, e elas estão sendo transformadas em peças no tabuleiro da União Europeia. Essa é uma política cínica, que deve acabar imediatamente.
Não se pode simplesmente descarregar o problema sobre a Grécia. Não se deve abandonar a Grécia, exigiu Merkel em entrevista televisiva no domingo. Mas é exatamente isso que acontece. A chanceler, isolada dentro da Europa, não apresentou uma alternativa. O ministro da Defesa da Áustria sugeriu a Merkel que a Alemanha transporte os refugiados diretamente da Grécia para Munique. Com isso, ele deixa claro que quer usar o destino de pessoas para chantageá-la. Isso é simplesmente revoltante.
O que esperam que aconteça na Grécia? Que o Estado imploda totalmente? O estopim já está queimando. O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, ameaça com o bloqueio de decisões da União Europeia, em vez de, depois de meses de choradeira, finalmente construir um número suficiente de abrigos emergenciais para refugiados e imigrantes. Dinheiro para isso foi liberado há seis meses pela UE. A Grécia só precisa usá-lo. Mesmo na atual situação emergencial, o Estado grego se destaca pela ineficiência e confia, do jeito que dá, em organizações privadas de assistência ou na ajuda espontânea dos cidadãos gregos.
Aliás, os países do centro da Europa não têm por que apontar o dedo para a Grécia. Há 15 anos que refugiados e imigrantes vivem em condições desumanas em Calais e agora também em Dunquerque, na França. Até hoje, a França e o Reino Unido (país de destino desses imigrantes) não encontraram nenhuma solução melhor do que erguer cercas e derrubar acampamentos de tempos em tempos.
Claro que Calais é, nas suas dimensões, bem menor do que o drama que se desenrola na Grécia. Ainda assim, continua sendo uma mácula e um símbolo de uma política para refugiados mal conduzida.
Não se pode esperar por mais cúpulas sem resultado de uma UE cada vez mais incapaz de agir. As pessoas necessitam de ajuda agora. É necessário que haja mortes? Ou até onde vai esse jogo cínico? No longo prazo não será possível encurralar os refugiados e migrantes dentro da Grécia com esse fechamento de fronteiras. Eles vão procurar novos caminhos: pela Bulgária, Albânia, Egito, Líbia, Itália.
É ilusória a esperança de que a Turquia resolva o caso e impeça as pessoas de seguir viagem para a Grécia. Sem uma oferta europeia para acolher refugiados que já estão na Turquia, o governo em Ancara não tem nenhum estímulo para bancar o protetor de fronteiras da União Europeia.
Esse jogo político às custas dos refugiados e imigrantes, seja na Grécia, na França, na Macedônia ou em qualquer lugar na Europa, tem que acabar. O alto comissário das Nações Unidas para refugiados acusa a União Europeia de provocar uma catástrofe humanitária na Grécia e de ser em grande parte responsável por isso. Ele disse tudo.
2015, o ano dos refugiados
Nunca tantas pessoas estiveram em fuga como em 2015. Muitos delas seguiram para a Europa, com o objetivo de chegar à Alemanha ou à Suécia. Confira uma restrospectiva fotográfica do "ano dos refugiados".
Foto: Reuters/O. Teofilovski
Chegada à União Europeia
Esses jovens sírios superaram uma etapa perigosa da sua viagem: eles conseguiram chegar à Grécia e, assim, à União Europeia. O objetivo final, porém, ainda não foi alcançado: eles querem continuar a jornada para o norte, em direção a outros países-membros do bloco. Em 2015, a maioria dos refugiados seguiu para a Alemanha e para a Suécia.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Perigosa travessia do Mediterrâneo
O caminho que eles deixam para trás é extremamente perigoso. Vários barcos com refugiados, nem sempre aptos à navegação, já viraram durante a travessia do Mar Mediterrâneo. Estas crianças sírias e seu pai tiveram sorte: eles foram resgatados por pescadores gregos na costa da ilha de Lesbos, na Grécia.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
A imagem que comoveu o mundo
Aylan Kurdi, de 3 anos, não sobreviveu à fuga. No início de setembro, ele se afogou no Mar Egeu, juntamente com o irmão e a mãe, ao tentar chegar à ilha grega de Kos. A foto do menino sírio, morto na praia de Bodrum, espalhou-se rapidamente pela mídia e chocou pessoas de todo o mundo.
Foto: Reuters/Stringer
Onde as diferenças são visíveis
A ilha grega de Kos, a menos de 5 quilômetros de distância da Turquia continental, é o destino de muitos refugiados. As praias geralmente cheias de turistas servem de ponto de desembarque, como no caso deste grupo de refugiados paquistaneses que chegou à costa da Grécia com um bote de borracha.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Em meio ao caos
Porém, muitos refugiados não conseguem simplesmente seguir viagem quando chegam a Kos. Eles somente podem seguir para o continente após serem registrados. Durante o verão europeu, a situação se agravou quando as autoridades fizeram com que os refugiados esperassem pelo registro num estádio, sob o sol escaldante e sem água.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Um navio para refugiados
Por causa da condições precárias, tumultos eram frequentes na ilha de Kos. Para acalmar a situação, o governo grego fretou um navio, que permaneceu ancorado e foi transformado em alojamento temporário para até 2.500 pessoas e em centro de registro de migrantes.
Foto: Reuters/A. Konstantinidis
"Dilema europeu"
Mais ao norte, na fronteira da Grécia com a Macedônia, policiais não permitiam mais a passagem de pessoas, entre elas crianças aos prantos, separadas de seus pais. Esta foto tirada pelo fotógrafo Georgi Licovski no local, e que mostra o desespero de duas crianças, foi premiada pelo Unicef como a imagem do ano, já que mostra "o dilema e a responsabilidade da Europa".
Foto: picture-alliance/dpa/G. Licovski
Sem conexões para refugiados
No final do verão europeu, Budapeste se transformou em símbolo do fracasso das autoridades e da xenofobia. Milhares de refugiados estavam acampados nas proximidades de uma estação de trem da capital húngara, pois o governo do país os proibira de seguir viagem. Muitos decidiram seguir a pé em direção à Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Roessler
Fronteiras abertas
Uma decisão na noite de 5 de setembro abriu caminho para os refugiados: a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o chanceler austríaco, Werner Faymann, decidiram simplesmente liberar a continuação da viagem por parte dos migrantes. Como consequência, vários trens especiais e ônibus seguiram para Viena e Munique.
Foto: picture alliance/landov/A. Zavallis
Boas vindas em Munique
No primeiro final de semana de setembro, cerca de 20 mil refugiados chegaram a Munique. Na estação central de trem da capital da Baviera, inúmeros voluntários se reuniram para receber os refugiados com aplausos e lhes fornecer comida e roupas.
Foto: Getty Images/AFP/P. Stollarz
Selfie com a chanceler
Enquanto a chanceler federal Angela Merkel era aplaudida por refugiados e defensores de sua política de asilo, muitos alemães se voltavam contra a política migratória. "Se tivermos de pedir desculpas por mostrar uma face acolhedora em situações de emergência, então este não é mais o meu país", respondeu a chanceler. A frase "Nós vamos conseguir" se tornou o mantra de Merkel.
Foto: Reuters/F. Bensch
Histórias na bagagem
No final de setembro, a polícia federal alemã divulgou uma imagem comovente: o presente que uma menina refugiada deu a um policial da cidade alemã de Passau. O desenho mostra o horror que vários migrantes vivenciaram e o quão felizes eles estavam por, finalmente, estarem em um local seguro.
Foto: picture-alliance/dpa/Bundespolizei
O drama continua
Até o final de outubro, mais de 750 mil refugiados haviam chegado à Alemanha. Mas o fluxo não parava. Sobrecarregados, os países da chamada Rota dos Bálcãs decidiram fechar suas fronteiras. Apenas sírios, afegãos e iraquianos estavam autorizados a passar. Em protesto, migrantes de outros países chegaram a costurar seus lábios.
Foto: picture-alliance/dpa/G. Licovski
Sem fim à vista
"Ajude-nos, Alemanha" está escrito em cartazes de manifestantes na fronteira com a Macedônia. Na Europa, o inverno se aproxima, e milhares de pessoas, entre elas crianças, estão presas nas fronteiras. Enquanto isso, até mesmo a Suécia retomou o controle temporário de fronteiras. Em 2016, o fluxo de refugiados deverá continuar.