Destinos como Veneza, Florença e ilhas espanholas são sufocados pelo turismo no verão. Mas por que ir para onde todo mundo vai, em vez de buscar seu próprio caminho, questiona a escritora Carmen-Francesa Banciu.
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Durante as férias de verão, os locais mais visitados da Europa são tomados pelo turismo em massa. Cidades como Veneza, Florença e ilhas como Mallorca e Ibiza sufocam sob o peso da superpopulação sazonal. Turistas barulhentos gastam a água e entopem os esgotos, deixando para trás um rastro de nuvens densas de fumaça e uma montanha de lixo. A falta de limites, a arrogância e o desrespeito demonstrado por alguns turistas deixam esses lugares parecendo terra arrasada.
Mas por que as pessoas continuam querendo ir para onde todo mundo vai? Por que elas não tentam novos caminhos por conta própria? Por que não buscam suas próprias descobertas? Eu adoro por o pé na estrada. O trajeto é uma viagem por si só. Quase toda a Europa pode ser visitada de trem, ônibus ou barco – e por preços razoáveis.
A ilha de Seydisfjordur, no leste da Islândia, por exemplo, pode ser alcançada em apenas 57 horas a partir de Hamburgo, numa viagem usando esses três meios de transporte. No caminho, será necessário passar pelo menos uma noite no norte da Dinamarca. Mas isso pode se tornar, por si só, uma experiência especial. Imagine as aventuras que se pode viver na cidade de Hirtshals apenas perdendo a balsa semanal para as Ilhas Faroé?
Você teria que abordar locais e pedir por ajuda e abrigo. Aprenderia sobre a vida deles – eles poderiam aprender sobre você. Afinal, a busca por aventura no mundo é, muitas vezes, descobrir mais sobre você, aprendendo sobre outras pessoas.
Fazer perguntas durante a viagem – mesmo quando você já sabe a reposta – ajuda a iniciar conversas, seja em alemão, dialeto, inglês ou qualquer outra língua, com a ajuda de desenhos, das mãos, linguagem corporal e dos olhos: gestos podem ser às vezes confusos, mas a expressão facial é inequívoca, compreensível para qualquer um.
Um sentimento abrangente de querer ficar pode tocar você. Uma conexão profunda pode surgir do que nos une: humanidade. Isso pode criar um senso de mútua apreciação e responsabilidade, perante o outro e o nosso planeta.
Um voo de Berlim para a ilha de Rodes, na Grécia, leva três horas. Mas o que se vivencia nessas três horas, fora o check-in e a busca pelas bagagens? Segundo o Google, são necessárias 36 horas para fazer o mesmo trajeto de carro. A jornada de 2.618 quilômetros a pé, através de República Tcheca, Hungria, Romênia, Bulgária e Turquia, com uma travessia de barco no final, leva 519 horas e poderia ser fácil com todo o apoio técnico e informações atualmente disponíveis.
Em 1933, o jovem escritor e soldado britânico Patrick Leigh Fermor pegou a mochila, alguns mapas, o passaporte, dicionários, memorabília, poesia inglesa e um volume de versos de Horácio e pôs o pé na estrada para Constantinopla. Ele viajou por quase um ano.
Segundo o Google, ele poderia ter feito isso em 529 horas – menos de um mês. Mas, na estrada, Fermor se apaixonou por uma princesa romena e aproveitou a vida por um tempo ao lado dela. Às vezes, eles estavam em Bucareste, outras em Epidauro ou no castelo da família em Valáquia. Se a Segunda Guerra não tivesse interrompido seu idílio, Fermor, que morreu em 2011, talvez nunca tivesse ido embora.
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A teuto-romena Carmen-Francesa Banciu é escritora e vive em Berlim desde 1990. Entre seus livros, Berlin ist mein Paris (Berlim é minha Paris, de 2002) e Ein Land voller Helden (Um país cheio de heróis, de 2000).
Tensão contra turistas cresce na Europa
Críticas aos impactos do turismo em massa têm ganhado as ruas, culminando em protestos em cidades europeias. Diversas prefeituras sofrem pressão popular e tomaram medidas para controlar o comportamento dos visitantes.
Foto: picture-alliance/CHROMORANGE/M.Wirth
Barcelona, Espanha
Na capital catalã, membros do partido independentista CUP danificaram pneus de um ônibus e de bicicletas usadas por turistas. Moradores também têm acusado visitantes de tratar uma praia como resort após beber em excesso. Em protesto recente, locais fizeram corrente humana bloqueando o acesso ao mar. Outra reclamação é que o aluguel de casas por visitantes está elevando o preço para os catalães.
Foto: Imago/Agencia EFE/Q. Garcia
Veneza, Itália
Manifestantes protestaram no início de julho contra a inundação de Veneza por cerca de 20 milhões de turistas ao ano. A cidade histórica tem 55.000 habitantes e muitos se incomodam com o excesso de lixo e barulho. A manifestação também criticou o aumento dos aluguéis e o impacto de grandes cruzeiros. Autoridades locais prometeram proibir que novas acomodações para turistas sejam abertas no centro.
Foto: Reuters/M. Silvestri
San Sebastián, Espanha
Um grupo de manifestantes com cartazes antituristas parou um trem com famílias que visitavam a cidade. Os cartazes promoviam uma marcha contra o turismo que coincide com a "Semana Grande", festival da cultura basca. A contribuição total do setor de viagens e turismo para a economia da Espanha foi de 158,9 bilhões de euros em 2016, 14,2% do PIB, segundo o Conselho Mundial de Viagens e Turismo.
Foto: picture alliance/dpa/epa/J. Etxezarreta
Dubrovnik, Croácia
Moradores da cidade com vista para o mar Adriático têm alertado que o número excessivo de visitantes está destruindo Dubrovnik. Protegida por muros medievais e torres do século 15, a cidade recebeu o status de patrimônio mundial da Unesco, mas a organização alertou no ano passado que o título estava em risco. Em resposta, a prefeitura prometeu reduzir o limite às visitas diárias de cruzeiros.
Foto: DW/M. Ercegović
Palma de Maiorca, Espanha
Membros do movimento "cidade para quem a habita" bloquearam o prédio do Ministério do Turismo, dizendo-se cansados de visitantes embriagados e pedindo formas mais sustentáveis de turismo. Os manifestantes também colaram cartazes com a inscrição "fechado" no prédio do ministério.
Foto: picture-alliance/Ciutat per qui l'habita
Roma, Itália
Embora não tenha recebido protestos recentemente como Veneza, Roma também tem tomado medidas para controlar o turismo em massa. Uma delas foi proibir o consumo de comidas e bebidas ao redor de suas famosas fontes, como a Fontana di Trevi. Entrar, sentar, dar de beber aos cachorros e jogar objetos (exceto moedas) na água também é proibido. Quebrar as regras pode resultar em multa de até 240 euros.
Foto: picture-alliance/dpa/D. Hahn
Berlim, Alemanha
Pular sobre os blocos de concreto, tirar selfies sorrindo e correr pelo Memorial dos Judeus Mortos da Europa são algumas das atitudes que geram debates acalorados sobre como a memória do Holocausto é encarada por turistas. Em 2016, o memorial pediu que visitantes parassem de jogar Pokémon Go no local. Em Berlim, o aluguel de apartamentos inteiros por turistas pelo Airbnb é proibido.
Foto: picture-alliance/Ulrich Baumgarten
Valência, Espanha
Hoteleiros de Valência pressionam o governo a endurecer os controles sobre plataformas online de aluguel de apartamentos para turistas, como o Airbnb. O governo tem participado do debate, mas se concentrado em combater grandes sites que comercializam apartamentos irregulares.
Foto: picture alliance/dpa/epa/M. Bruque
Milão, Itália
Milão proibiu o uso de "paus de selfie" na área portuária do bairro de Darsena durante o verão, assim como a venda de bebidas em garrafas de vidro e food trucks. O objetivo foi reduzir o lixo e comportamentos "antissociais".