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Opinião: A dupla moral do caso Böhmermann

14 de abril de 2016

Por que jornalistas que se irritam com qualquer crítica aos turcos não acham nada demais quando o presidente da Turquia é insultado da forma mais vulgar, questiona Christoph Hasselbach, da redação alemã da DW.

Christoph Hasselbach é jornalista da redação alemã da DWFoto: DW/M.Müller

Até onde os humoristas estão dispostos a ir em nome da liberdade? Os versos de Jan Böhmermann sobre o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, são a coisa mais primitiva e vulgar que já foi ao ar numa emissora pública alemã. Aliás, os lares alemães são obrigados a pagar por esse "serviço básico".

Se o poema tivesse apenas malhado o governo do presidente turco, não haveria nada demais. Mas o que se pretende com essa sequência desconexa de insultos pessoais sem qualquer referência ou contexto (faz sexo com animais, fede, bate em meninas)? A transgressão por si só?

Não é grande atenuante o fato de Böhmermann, com sua crítica injuriosa, ter reagido a uma provocação de Erdogan, que havia se irritado com outra sátira, esta bem menos acentuada, proveniente da Alemanha. Também não muda nada o fato de Böhmermann ter anunciado, antes de ler o poema, que faria algo proibido.

Quer dizer então que, a partir de agora, quem fizer uma observação prévia pode, por exemplo, incitar o ódio contra estrangeiros porque essa incitação é posta num contexto satírico?

É estranho que muitos jornalistas, esses que vivem se irritando com qualquer crítica aos turcos na Alemanha, não achem nada demais quando um colega deles insulta pessoalmente e da pior forma possível um cidadão turco específico em Ancara, e ainda por cima fazendo uso de uma profusão de ressentimentos anti-islâmicos.

Como se pode reclamar de um endurecimento de tom no debate sobre a migração e, ao mesmo tempo, exultar nesse caso?

Isso tudo não tem nada que ver com coragem. Humoristas turcos iriam parar na cadeia com críticas bem menos ofensivas ao seu presidente. Já Böhmermann não precisa se preocupar, pois vive na Alemanha protegida, mesmo que, em tese, esteja ameaçado de uma pena de três anos de prisão por insultar um chefe de Estado estrangeiro. Mas certamente a situação não vai chegar a esse ponto.

Ao contrário, a mídia alemã está elevando Böhmermann à condição de quase mártir desde que Erdogan passou a exigir sanções penais e a colocar o governo alemão sob pressão, já que Berlim tem que autorizar um processo criminal.

Mesmo políticos alemães que se veem obrigados a lidar, no nível político-diplomático, com as consequências da perfomance de Böhmermann, evitam entrar em confronto com a mídia sobre os limites do humor satírico. Na esquerda do espectro político, há até mesmo um regozijo pelo dilema em que se encontra a chanceler federal Angela Merkel.

Por sorte, a questão sobre os limites da sátira não é razão de Estado na Alemanha. Portanto, a reserva dos políticos é um bom sinal. Por sorte, não é a política que decide onde estão os limites da sátira. E, por sorte, hoje os tribunais deliberam de forma mesurada quando um caso como esse chega até eles.

Mas os humoristas e os jornalistas deveriam se perguntar: quando quebrar tabus se torna uma obrigação, isso não é simples autopromoção pós-pubertária? E mesmo que os aplausos venham de forma quase automática, algo está errado. A sátira pode muito, mas não precisa fazer tudo.

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