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A Otan está em coma há muito tempo

Barbara Wesel Studio Brüssel
Barbara Wesel
5 de dezembro de 2019

Aos 70 anos de idade, a Aliança Atlântica não está morta, como disse Macron, mas em coma. Para sobreviver, a organização militar precisa finalmente se tornar política, opina Barbara Wesel.

Com sua franqueza não diplomática, Macron prestou um favor à Otan, diz Barbara WeselFoto: picture-alliance/dpa/AP/M. Dunham

O debate sobre o fim da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) é tão antigo quanto a própria aliança militar, e nos últimos 70 anos, não faltaram exageros nos relatos sobre seu iminente fim. Aparte isso, o presidente francês, Emmanuel Macron, está certo: a Otan é um caso de morte cerebral – e há muito tempo.

Mesmo que a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e outros se irritem com a afirmação de Macron, o presidente francês fala uma verdade. Politicamente, a Otan nunca esteve tão fraca quanto agora.

Uma das maiores fraquezas da aliança é o presidente dos EUA, Donald Trump. Como bem lhe convém, ele insulta seus parceiros, elogia autocratas como o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ou o ditador norte-coreano, Kim Jong-un, ou até questiona completamente a própria Otan.

Em Londres, no entanto, Trump reagiu alérgico às críticas de Macron, tornando-se, de repente, o maior defensor da Aliança Atlântica. Aparentemente, apenas o próprio Trump pode criticar a Otan. Isso é um espetáculo infantil.

Mesmo em suas decisões solitárias, o presidente dos EUA age de forma destrutiva. Ele retirou as tropas americanas da Síria sem consulta prévia e abriu as portas para a intervenção militar turca contra os curdos que lideraram a luta contra o "Estado Islâmico" para o Ocidente. Um exemplo fatal de traição de aliados com altos custos políticos e humanos.

E esse é apenas um exemplo da incapacidade de Trump de tomar decisões estratégicas em interesse comum. Na Otan, espera-se tacitamente que Trump não seja reeleito no próximo ano.

Na época da Guerra Fria, a vida era fácil para a Otan: ela era um contrapeso ao Pacto de Varsóvia. As tarefas eram claras, a doutrina da dissuasão mútua era um modelo estratégico simples. Trinta anos depois, no entanto, a aliança militar não encontrou novas respostas para um mundo completamente alterado. Passa-se de crise em crise e de uma cúpula a outra.

Na reunião de Londres, por exemplo, a China foi agora, pela primeira vez, discutida como um tema de futuros desafios. Mas isso não significa muito, porque não se pode falar de uma política comum em relação a Pequim – os interesses dos países-membros são muito diferentes.

De qualquer forma, o surgimento dessa nova grande potência agora é apontado como uma ameaça em potencial, dando permissão para se pensar nas consequências de políticas chinesas agressivas para a segurança conjunta.

É como observar um gigante velho e meio idiota elaborando pensamentos. Os tempos de reação parecem intermináveis. Por exemplo, diante dos novos riscos decorrentes das mudanças climáticas, abordados pela presidente da Noruega. Ou frente às ameaças da desestabilização regional por meio de grupos terroristas em transformação, nos quais a França quer prestar mais atenção.

E, às vezes, são os buracos-negros políticos, criados em parte pelos próprios membros da Otan, como na Líbia, que se tornam berços de terrorismo e tráfico humano, ameaçando a Europa.

Falta à Otan uma espécie de cabeça política, um órgão que possa simultaneamente elaborar análises e preparar decisões. O "conselho dos sábios", que deverá agora montar um cronograma para o futuro, é apenas um paliativo. E outra fraqueza da aliança é que, com cada vez mais países-membros com interesses cada vez mais divergentes, a pressão por um consenso se torna cada vez mais uma camisa de força.

Também faltam verdadeiros mecanismos de sanções para o case de os Estados-membros perseguirem implacavelmente interesses puramente nacionais, como a Turquia, com seu ataque contra os curdos e a compra de um sistema de mísseis russo.

Tais ações abrem uma lacuna na segurança conjunta, que não pode ser fechada por compromissos formulaicos, como na reunião em Londres. E elas levantam muitas dúvidas sobre os chamados "valores comuns".

Ao contrário do diagnóstico de Macron, a Otan está em coma, mas não está morta. Isso porque também as abordagens europeias de tornar a própria defesa um projeto comum transcorrem de forma difícil, e elas não serão capazes de substituir a aliança militar num futuro próximo.

No entanto, diante da crescente pressão externa e interna, há dúvidas sobre quanto a Otan é capaz de se reformar. Nesse contexto, muito depende da eleição presidencial nos EUA. Mas uma coisa é certa: por meio de sua franqueza não diplomática, o presidente francês fez um favor à Otan em seu aniversário de 70 anos.

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