A volta do turismo, a pandemia e uma lição do Mágico de Oz
Kevin Cote
Opinião
7 de junho de 2020
Ilusão de que viagens exóticas trazem realização alimenta um setor trilionário. Mas prejuízos globais do coronavírus lembram que a felicidade pode estar bem mais perto – como no filme de 1939, opina Kevin Cote.
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À medida que o mundo lentamente reabre para as viagens, é um bom momento para lembrar que estamos emergindo de um período sem precedentes na história humana: nunca tanta gente esteve proibida de ir a tantos lugares, todos ao mesmo tempo.
Para o setor mundial de viagens e turismo, que movimenta 8,9 trilhões de dólares, os 330 milhões de empregos que ele cria, e o 1,4 bilhão de nós que participamos como viajantes em 2019, as grandes questões são: as coisas vão algum dia retornar ao normal? Como será esse "novo normal"?
A Organização Mundial de Turismo das Nações Unidas calcula que o número de viajantes internacionais poderá cair até 80%. Então, a outra grande questão é se ter uns 3 milhões de pessoas a menos trafegando pelo mundo, todo dia, é tão ruim assim, afinal de contas. Quem sabe, poderia ser até uma coisa boa?
Há muito o setor turístico tem sido atacado por seu impacto imensamente negativo sobre o meio ambiente, a forma como transforma a cultura em bem de consumo, expulsa os residentes de lugares onde têm vivido há gerações, e rouba as almas dos que permanecem.
Os defensores, contudo, sempre alegam que os benefícios econômicos superam as desvantagens, sendo as viagens e turismo atualmente responsáveis por quase 11% dos empregos de todo o mundo. O argumento comercial parece inatacável, tratando-se de um setor que contribuiu para quase 10% do PIB mundial em 2019.
Aí veio a covid-19. E súbito se constata que, afinal, essa atividade não é tão boa assim para os negócios: foi o turismo da China continental, onde os especialistas creem que o surto se originou, o responsável por a doença alcançar proporções de pandemia dentro de poucas semanas.
A Universidade de Cambridge calcula que, no pior dos casos, a economia global possa perder até 82 trilhões de dólares nos próximos cinco anos, devido aos danos da pandemia. Mesmo a "projeção consensual" do estudo, prevendo um prejuízo de 27 trilhões de dólares em cinco anos, continua sendo prova de que não há mais argumento comercial pelo turismo.
Visto por esse ângulo, o setor se revela como o maior conto do vigário da história da globalização. Ainda assim, uma maioria insiste em acreditar que ele é uma boa coisa, apesar de todas esmagadoras provas em contrário.
Como Dorothy no início do filme O Mágico de Oz, de 1939, continuamos acreditando que felicidade é viajar para distantes locais exóticos, "para além do arco-íris", onde os céus são azuis e os sonhos se tornam realidade. Acreditamos nisso, embora raramente seja o que vivenciamos.
Aí viajamos para novos lugares, procurando mais felicidade, maior realização. Essa é a dinâmica mortal que está propelindo o turismo em todo o mundo. A menos que escapemos dela, nunca estaremos seguros, sustentáveis ou econômicos.
Com a Europa reavivando sua indústria turística, muitos se preparam para encarar esperas mais longas nos aeroportos, preços mais altos de passagens e acomodação, serviços reduzidos e acesso restrito a resorts e atrações culturais. Já outros preferirão cortar seus planos de férias, em vez de participar da restauração de um turismo que tenta se reinventar como setor mais seguro, mais sustentável.
Isso quer dizer: passar mais tempo em casa e na própria localidade. E para quem vive em metrópoles, como eu, haverá mais de nossas cidades para aproveitar, sem os turistas.
Quando Dorothy finalmente acorda de seu sonho, lá no Kansas, ela revela uma lição aprendida em Oz que também poderia nos ajudar a formar expectativas mais realistas sobre o turismo, nesse momento em que se tenta reavivá-lo: "Não há lugar como nosso lar."
Kevin Cote é produtor de TV do Departamento de Economia da DW.
O silêncio ocupa os principais pontos turísticos das capitais europeias, devido às restrições de contato social por causa da pandemia do novo coronavírus. Veja como estão alguns lugares da Europa.
Desde domingo, quando a chanceler federal Angela Merkel anunciou mais restrições à circulação de pessoas na Alemanha, as ruas de Berlim e outras cidades alemãs estão mais vazias. O plano de nove pontos anunciado pelo governo proíbe encontros públicos de mais de duas pessoas, a não ser familiares. Todos devem manter uma distância de 1,5 metro dos outros e ir para a rua somente se necessário.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Zinken
Estrangeiros barrados, fronteiras fechadas
Além de limitar o movimento interno, a Alemanha reforçou as restrições à entrada de estrangeiros no país. Como resultado, o tráfego no aeroporto mais movimentado do país, em Frankfurt, teve uma queda significativa.
Foto: picture-alliance/nordphoto/Bratic
Os bávaros devem ficar em casa
Na Baviera, estado mais meridional da Alemanha, as pessoas estão proibidas de sair às ruas para evitar a propagação do novo coronavírus. Sob as medidas que estarão em vigor por pelo menos duas semanas, as pessoas não podem se reunir no exterior em grupos e os restaurantes foram fechados. As ruas de Munique ficaram vazias.
Foto: picture-alliance/Zuma/S. Babbar
Paris isolada
A atividade nas ruas normalmente movimentadas de Paris parou completamente depois que a França anunciou um bloqueio nacional na semana passada. As pessoas não podem sair de casa, a menos que seja para como comprar comida, visitar um médico ou ir ao trabalho. O prefeito de Paris, no entanto, pediu medidas de confinamento mais rigorosas à medida que o número de infecções aumenta em todo o mundo.
Foto: picture-alliance/AP Photo/T. Camus
Capital britânica ficou mais vazia
O Reino Unido fechou todos os bares, pubs e restaurantes para combater a ameaça do coronavírus. O primeiro-ministro, Boris Johnson, exortou todos os cidadãos a evitar qualquer viagem e contatos não essenciais com outras pessoas.
Foto: picture-alliance/R. Pinney
Milão, no coração da pandemia
No norte da Itália, só os pombos se atrevem a fazer aglomerações na rua. A catedral de Milão ergue-se solitária para o céu numa praça deserta. Na Itália, as pessoas só podem sair de suas casas para trabalhar ou fazer compras.
Foto: picture-alliance/dpa/AP/L. Bruno
Vaticano fechado ao público
Embora um número esmagador de casos de coronavírus tenha sido registrado na região da Lombardia, no norte da Itália, Roma e o Vaticano também foram forçadas a restringir severamente as reuniões públicas. Toda a Itália está sob quarentena. As lojas fecharam e os turistas deixaram o país. A Praça de São Pedro, no Vaticano, está bloqueada. Em Roma, museus e pontos turísticos estão fechados.
Foto: picture-alliance/dpa/Zuma/G. Galazka
Espanha, um país fortemente atingido pela crise
O governo espanhol prorrogou até 11 de abril o estado de emergência no país. A Espanha tem o segundo maior número de casos de doenças pelo novo coronavírus na Europa, atrás da Itália. Barcelona e Madri são particularmente atingidas.
Os cidadãos austríacos também já não podem circular livremente. Desde meados de março, todos os bares e restaurantes estão fechados. O marco de Viena - a Catedral de Santo Estêvão - está fechada aos turistas, os serviços na igreja são realizados sem fiéis e são transmitidos por rádio. Também a praça em frente à catedral, normalmente bastante movimentada, está deserta.
Foto: picture-alliance/dpa/W. Gredler-Oxenbauer
República Tcheca se fecha
A tradicional Ponte Carlos, em Praga, normalmente visitada por multidões de turistas, agora está em silêncio. A República Tcheca declarou estado de emergência por causa da pandemia do novo vírus e impôs uma extensa proibição de entrada e saída. Todas as ligações transfronteiriças de trens e ônibus também foram suspensas. A liberdade de circulação dos habitantes foi rigorosamente restringida.