Na primeira aparição midiática após o caos das últimas semanas, a tranquilidade da chanceler federal alemã deixou muitos perplexos. Não seria de espantar se mais uma vez o "método Merkel" funcionar, opina Jens Thurau.
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Na noite deste domingo (11/02), a chanceler federal alemã, Angela Merkel, deu à emissora de TV de direito público ZDF a sua primeira entrevista depois das negociações de coalizão. Será o caso de louvar essa apresentação dela ou de ficar pasmo? Merkel vem de uma semana ímpar, tendo fechado com o Partido Social-Democrata (SPD) uma aliança em que sua União Democrata Cristã (CDU) abre mão de praticamente todos os postos relevantes no novo governo – fora a Chancelaria Federal, está claro.
Os ministérios do Exterior e das Finanças ficam para o SPD, embora os democratas-cristãos tenham sido os inegáveis vencedores das eleições legislativas de setembro último. Na verdade, foi um êxito espetacular para os social-democratas – o que, no entanto, não os impede de se digladiarem em público.
Tampouco a CDU está satisfeita. Chovem à condução das negociações por Merkel críticas de uma virulência rara, numa legenda para a qual lealdade a seus líderes e, mais ainda, para com sua chanceler federal faz parte do código genético.
E agora vem Merkel e diz algumas frases de admirável clareza: só à custa de algumas concessões muito dolorosas ao SPD ("também para mim") foi possível chegar a um consenso. "Por 12 horas só falamos da distribuição de pastas", conta, com certa indiscrição, e dando a impressão de ter acompanhado a coisa toda praticamente de fora.
Quase en passant, descarta todos os debates histéricos em seu partido, inclusive as especulações sobre o que virá depois dela: Merkel pretende permanecer na Chancelaria Federal por quatro anos completos, e não tem a menor intenção de entregar a presidência da CDU.
Pelo menos a líder tomou conhecimento de que em seu partido correm boatos. Portanto ela conhece os correligionários jovens, sobretudo conservadores, como Jens Spahn ou Julia Klöckner, que desde já reivindicam renovação e um perfil definido, depois de todos os torturantes anos em que Merkel, a rigor, praticou política social-democrata.
Falando por alto, a premiê se declara agora disposta a considerar os "jovens selvagens" na distribuição de postos no novo governo. Já era sabido que Klöckner tinha chances, por exemplo, no Ministério da Agricultura. Mas essa admissão da líder já bastou para provocar júbilo nas alas da Jovem União. Tão fácil assim é para Merkel trazer os seus para o seu lado. Ou, dito de outra maneira: o poder dela realmente ainda é tão grande assim.
Por mais sem graça que a atuação de Merkel possa parecer, ninguém de fora da Alemanha compreenderia se, mais uma vez, a chanceler federal não conseguisse constituir governo. E os mortalmente feridos social-democratas, quase enlouquecidos pela catástrofe eleitoral e as intrigas internas, precisavam mesmo tirar o máximo de vantagem, a fim de convencer os seus afiliados a sequer aceitarem a coalizão.
Portanto Merkel cede até o limite da dor, e mais além. Assim são as coisas, sinaliza sua estoica expressão facial. Essa mulher tem sangue frio! Tem mesmo, e já provou isso centenas de vezes.
Naturalmente há o perigo de que ela exagere com essa tranquilidade e frio realismo. Mas eu não me espantaria se, mais uma vez, o "método Merkel" funcionar: com grande sofrimento, o SPD diz "sim" para a "grande coalizão", os ânimos se acalmam, a premiê talvez passe a dialogar mais do que de costume com seus críticos, e, em troca, continua sendo o que é: chefe de partido e de governo por quatro anos.
Sinceramente: essa é a variante mais provável, ou não? Não é muito excitante, mas bem melhor do que o grande caos chamado "novas eleições".
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Sátira e deboche no Carnaval alemão
De Merkel a Trump e Kim Jong-un. Nos principais desfiles de Carnaval da Alemanha, em Colônia, Mainz e Düsseldorf, carros alegóricos miram política alemã e internacional com críticas afiadas.
Foto: picture-alliance/dpa/F. Gambarini
Viúva-negra
É claro que as sátiras do Carnaval alemão não poderiam poupar a chanceler federal Angela Merkel. No desfile de Düsseldorf, ela foi retratada como uma aranha viúva-negra junto aos crânios daqueles que alguns veem como suas vítimas políticas, entre eles o do presidente Frank-Walter Steinmeier e o do ministro do Exterior Sigmar Gabriel.
Foto: Retuers/T. Schmuelgen
A última de sua espécie
No Carnaval de Mainz, Merkel, conhecida como a "eterna chanceler", foi representada por uma tartaruga, com as patas fazendo o famoso gesto da líder. Muitos alemães deram sinal de enfado diante da demora de Merkel para formar um novo governo. Mais de quatro meses depois das eleições legislativas, conservadores e social-democratas estão finalmente perto de uma coalizão.
Foto: Reuters/R. Orlowski
Adeus, Schulz!
O social-democrata Martin Schulz apareceu em Mainz na ponta de um explosivo, segurando uma bandeira com os dizeres "chanceler 2017". Após ser eleito líder do SPD com 100% dos votos dos filiados há um ano, ele viu a legenda alcançar seu pior resultados desde o pós-guerra nas urnas e suas esperanças de ser chanceler se esvaírem. Em seu último ato, Schulz abriu mão da liderança social-democrata.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Arnold
No comando da UE
No Carnaval de Mainz, o presidente francês, Emmanuel Macron, indica a direção de dentro de um carro com a bandeira da União Europeia. Aos poucos, o líder da França vem assumindo um papel de liderança no bloco, também devido ao impasse político vivido pela Alemanha, que, mais de quatro meses após as últimas eleições, ainda não tem um governo.
Foto: Reuters/R. Orlowski
Dirty Dancing
No maior Carnaval de rua da Alemanha, em Colônia, um carro alegórico foi dedicado ao líder norte-coreano, Kim Jong-un. Ele aparece vestindo roupas semelhantes às que Patrick Swayze usou no clássico "Dirty Dancing". Só que sua parceira de dança é um míssil nuclear.
Foto: picture-alliance/dpa/R. Vennenbernd
Desconforto para Trump
Os carnavalescos de Düsseldorf não pegaram nada leve com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Um urso representando a suposta interferência da Rússia na campanha presidencial americana de 2016 monta sobre o presidente, transmitindo a mensagem de que o caso pode realmente fazer com que Trump tenha que se ajoelhar.
Foto: picture-alliance/dpa/F. Gambarini
Um bebê do Brexit
A primeira-ministra britânica, Theresa May, segura uma criatura desforme presa a um cordão umbilical com a palavra Brexit, em referência à saída do Reino Unido da União Europeia, alvo de longas negociações entre ambas as partes. Muitos na Alemanha desaprovam a decisão britânica de deixar o bloco.
Foto: Reuters/R. Schmuelgen
Amigos autocratas?
Jaroslaw Kaczynski, ex-primeiro-ministro da Polônia e presidente do partido Lei e Justiça (PiS), que segura uma foice com a palavra "ditaduras", é retratado em Düsseldorf ao lado do primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, com um martelo com as palavras "direitos". Com Polônia e Hungria à frente, países do Leste Europeu vêm fazendo contraponto aos valores liberais do lado ocidental da UE.
Foto: Reuters/T. Schmuelgen
Crítica à UE
A política migratória da União Europeia (UE) também foi alvo de críticas em Düsseldorf. O migrante negro aparece preso com correntes duas bolas de ferro, com as palavras: "Escravidão na Líbia; patrocinada pela UE."
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kusch
Escândalo de emissões
As manipulações de dados de emissões de veículos da Volkswagen também foram tema em Düsseldorf. O escândalo manchou a imagem da montadora, com a revelação de que a empresa teria burlado testes de emissão em 11 milhões de veículos mundo afora. Recentemente, veio a tona que a empresa esteve por trás de testes de emissões envolvendo macacos e humanos.