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Crises

17 de outubro de 2008

Com base no pacote financeiro de ajuda aos bancos, a ONG Ação Agrária Alemã exige um pacote de emergência contra a fome. Ludger Schadomsky acha que as crises financeira e alimentar oferecem chances.

"Como pode ser que, em questão de alguns dias, as nações industrializadas consigam apresentar um pacote bilionário, mas esqueçam as promessas feitas aos países do Sul?" Os políticos do Hemisfério Sul lançaram esta pergunta com freqüência nas últimas semanas – por último na conferência do FMI e do Banco Mundial.

Ludger Schadomsky

Eles temem que as ricas nações do Norte, que já agora estão muito aquém de suas promessas no G8, com a crise possam ficar ainda mais parcimoniosas. Este temor é justificado, considerando-se o número de famintos no mundo, corrigido para um bilhão de pessoas.

Ao mesmo tempo, há motivos para esperança: mesmo que tenha subido para 33 o número absoluto de países onde há fome, já começaram a baixar os preços dos produtos agrícolas, que nos últimos três anos aumentaram em média 60% ou – no caso do trigo na Somália – mesmo 300%. Eles não deverão voltar a ficar tão baratos como há alguns anos, mas devem estabilizar-se.

Então, grandes projetos de infra-estrutura no sul continuam sendo financiados em grande parte pelo Banco Mundial e não individualmente por países doadores. O Banco Mundial salientou recentemente que pode duplicar sem problemas suas linhas de crédito.

Afinal, a ajuda ao desenvolvimento em tempos de Bob Geldof [músico pop que se engaja pela África] há muito tempo se tornou assunto de prestígio nacional. Um país como a Alemanha não pode permitir uma redução ainda maior que o compromisso assumido (em vez dos 0,7% do PIB, o páis destina atualmente escassos 0,28% à ajuda ao desenvolvimento).

Tudo isso sugere que a crise financeira vai atingir os países em desenvolvimento muito mais de forma indireta: remessas que deixarem de ser enviadas pelos EUA e pela Europa irão abalar as economias de alguns países do sul, da mesma forma como as reduções dos fluxos de investimentos e turísticos vindos dos países industrializados.

Em vista do pacote bilionário de ajuda aos bancos, pode parecer cinismo, mas a atual crise do sistema financeiro mundial, bem como a crise da segurança alimentar, podem significar uma série de oportunidades para o Sul: aumentos moderados de preços nos países em desenvolvimento ajudam a combater a pobreza onde ela é mais grave, ou seja, nas áreas rurais.

Agricultores que já hoje produzem excedentes, podem vender seus produtos a preços mais altos e reinvestir os lucros. Eles ganham também com a mudança na ajuda emergencial de alimentos. Até alguns anos atrás, os excedentes na produção eram vendidos em primeira linha pelo Norte. Agora, estes países doadores estão cada vez mais comprando os excedentes do Sul. Para isso, é condição que o preço do petróleo se estabilize numa média tolerável e os custos dos fertilizantes, combustíveis e do transporte permaneçam viáveis.

A segunda grande oportunidade

A segunda grande chance criada pelas crises é que o setor agrícola nos países do Hemisfério Sul passe por um renascimento. Ele foi negligenciado ao longo de décadas – também por pressão dos países doadores. Por causa disso, atualmente na África são cultivados apenas 14% da área agrícola – em Zâmbia, são apenas 10%, sendo que a produtividade é um terço menor do que na China.

É preciso finalmente acabar com a ilusão de que o Norte pode libertar o Sul da armadilha da fome. Pelo contrário, é preciso dar ao Sul condições de abastecer-se a si próprio. Isto exige tanto uma profunda reforma da política agrícola comum da União Européia (EU), bem como da uma política norte-americana de livre comércio menos agressiva.

Para que a crise se torne uma oportunidade, é preciso que os países atingidos cumpram sua responsabilidade: aplicar 10% de seu orçamento no fomento à agricultura – atualmente, está abaixo dos 4%. Aos agricultores não deve continuar fechado o acesso à terra, a microcréditos e aos mercados, como é o caso, por exemplo, da Etiópia, suposto país de fome.

A crise financeira mundial deslocou o equilíbrio entre as economias emergentes, como China, Rússia e Índia, por um lado, e Estados Unidos e Europa, por outro, a favor dos tigres em desenvolvimento – as reservas monetárias são apenas um indício.

No futuro, não apenas bancos islandeses irão solicitar créditos milionários aos russos. Não se sabe se isso será bom ou ruim. Fato é que já é tempo de equilibrar o jogo global de forças: sair da rota Norte-Sul para a Sul-Sul, em interesse do Norte e do Sul. (rw)

Ludger Schadomsky é editor da redação em amárico (idioma oficial da Etiópia) da DW-RADIO.

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